segunda-feira, 26 de junho de 2023

RITALINA É VIDA(!?)

Como todo TDAH raiz, chega um dia que acho que não preciso mais da Ritalina. Já não percebo seus efeitos, consigo controlar o TDAH sozinho...
Assim como não percebia os efeitos positivos da Ritalina, não percebo os efeitos negativos de sua ausência. Aos poucos o desânimo começa a se instalar, a falta de foco aumenta, a desatenção ganha escala, a preguiça toma conta definitivamente. São necessários vários meses, anos até, para me conscientizar de que jamais poderia tê-la abandonado. Decido retomar seu uso. Essa retomada leva alguns meses. Tem que ter receita, tem que calçar a cara e voltar ao médico dizendo que, pela enésima vez, interrompi o tratamento e descobri que preciso retomá-lo. De posse da receita levo dias e dias pra lembrar de comprar e depois outros tantos para começar a tomar. 
E então acontece o milagre: tomo ciência repentinamente que aquela disposição, aquela produtividade, aquela eletricidade que eu não sentia há séculos me foi dada hoje pela Ritalina. Juro amor e fidelidade eterna à ela. Jamais interromperei novamente. Uma pela manhã, minutos antes de entrar na empresa e outra após o almoço. Produtividade garantida!
Ali pelo terceiro dia começo a perceber um comportamento inquieto, as mãos não param, fico esfregando os polegares um no outro. Os pés se movem sob a mesa quase que incessantemente. E um sentimento de alerta constante dentro do peito. Como se houvesse um inimigo à espreita, prestes a atacar. Claro que não existe o tal inimigo, apenas essa sensação de perigo iminente. Estamos nesse momento no início do inverno e quando tomo Ritalina sinto mais frio. Mas não é um frio normal, é um frio interno que me obriga a sair do lugar, a fazer alguma coisa, a falar mais... 
Fiquei pensando em quem já tem Transtorno de Ansiedade, sob o efeito da Ritalina deve ser quase insuportável. Imagino que o que sinto sob efeito do remédio a pessoa ansiosa já sente diariamente. Ao tomar a Ritalina isso deve aumentar exponencialmente. A sensação de alerta se transforma em pânico. A inquietude dos membros deve ser quase incontrolável. E o frio interior deve se transformar numa nevasca na alma. 
Mas nem tudo são dores. Há também flores. Com a Ritalina fico mais otimista, mais comunicativo, mais animado, mais confiante... 
Mas, concluo hoje, que a Ritalina não pode ser tomada por todos. Mesmo os TDAHs. Essa sensação que sinto no peito agora deve ser quase insuportável para boa parte das pessoas. Enquanto escrevo mexo os pés constantemente e a sensação de que preciso fazer algo com urgência não me abandona. Mesmo eu estando em hora de almoço, sem nada específico a cumprir nesse horário.
Ainda assim, se comparo meu desempenho com e sem a Ritalina, opto por mantê-la. Tenho contas a pagar e não posso me dar ao luxo de enrolar no trabalho ou ser dominado pela preguiça e pela paralisia mental que me apossa de quando em quando. Sigo com a Ritinha, mas até me entendo quando suspendo seu uso e, muito mais, quem não dá conta de tomar continuamente. Não é fácil. 
Como tudo na vida são escolhas, entre a sensação de perigo e a paúra de ficar sem emprego, melhor aquela. 
Quanto àquelas babaquices de Cocaína legalizada, droga da obediência, dependência... Nada disso existe, sou o exemplo vivo disso, já interrompi e retomei o uso diversas vezes e jamais tive síndrome de abstinência ou coisa parecida. Cocaína é uma droga proibida e potencialmente letal, ao contrário de todas as drogas a Ritalina não exige um aumento constante da dosagem - tomo a mesma dosagem há 12 anos - só tomo em dias de semana e as vezes me esqueço de tomar. E quanto à obediência, nada a ver, embora muitas vezes o que um TDAH mais precisa é seguir as regras da sociedade. Rebeldia é lindo, mas não paga as nossas contas. 
PS. : tenho tomado a genérica. Nenhuma diferença. 

segunda-feira, 8 de maio de 2023

TDAH NÃO É CERVEJA, MAS APRECIE COM MODERAÇÃO!


Vivemos o período das modinhas. E uma delas é o TDAH. Basta esquecer a chave e o fulano já corre para um grupo de TDAH para postar sua suspeita de ser portador. Existem situações realmente engraçadas e em muitas delas eu mesmo me divirto, mas a maioria baseia-se apenas em tentar fazer parte de uma turma da moda, uma turma de outsiders, um povo meio louco e descolado...
Não seria um problema se isso não fosse um combustível para que os anti TDAHs trabalhem para desacreditar ainda mais os diagnósticos e, principalmente, os medicamentos usados em nossos tratamentos. 
Os grupos que foram criados pra trocar experiências de quem TDAH, viraram espaços de tentativas de auto diagnósticos sem qualquer embasamento. Uma pena.
Confesso que quase não participo de grupos e até de falar sobre TDAH me cansou. Há cerca de seis meses não posto nada no blog, acho que por overdose. Não sei se ainda tenho algo de útil a dizer. 
Fui diagnosticado há cerca de doze anos e em muitos momentos acreditei haver superado o maldito TDAH. Bastava pensar assim uma única vez e pronto, o TDAH me derrubava feio. Tudo aquilo que havia conquistado voltava à estaca zero. E recomeçava a subir a montanha empurrando minha pedra. 
O TDAH é muito mais esperto e ladinho do que qualquer um de nós. Ele se faz de morto, ele se deixa passar despercebido, te faz crer que está domado definitivamente. E aí o portador relaxa, acredita que está tudo sob controle. E o TDAH dá o xeque-mate. Nos estatelamos no fundo do poço perplexos, incrédulos, atônitos.
Hora de lamber as feridas pela enésima vez. Hora de encarar todos os espectadores que acompanharam todas as nossas infindáveis derrocadas. Voltam as justificativas. Voltam os julgamentos. Voltam os silêncios. 
Olhando para trás descobrimos que cometemos os mesmos erros de todas as outras quedas. E não os reconhecemos. Trilhamos exatamente o mesmo caminho até à beira do precipício, e não o reconhecemos. Assim como não reconhecemos estar à beira do precipício e demos o derradeiro e fatal último passo. 
Estragamos tudo novamente. E a cada reconserto tudo é mais difícil e mais penoso. Mas não há outra alternativa, há que se levantar e tocar em frente. 
Realmente, o TDAH dos grupos de Face e Insta parecem muito mais divertidos do que na vida real. 
Assim como a cerveja dos comerciais de TV. Mas nunca se esqueça que depois da propaganda vem a advertência :
APRECIE COM MODERAÇÃO.