quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
CASAMENTO TDAH
Ontem, assistindo ao excelente show de Caetano Veloso e Maria Gadu, me veio á mente (que novidade) que a letra da música O QUERERES, de Caetano é a personificação de um casamento entre dois portadores de TDAH. Um casamento entre dois camaleões, entre duas metamorfoses ambulantes, um relacionamento quase impossível - por isso mesmo tão desejado por ambas as partes - onde um nunca é o que o outro espera, ao mesmo tempo que busca no outro o que ele não pode dar.
Certa vez assisti a um Café Filosófico na Tv Cultura, em que o psicanalista Flavio Gikovate falava sobre amor positivo e amor negativo; sendo o primeiro a amizade e o segundo o amor entre casais. A certa altura ele afirmou que é muito comum as pessoas se relacionarem com seu oposto; com pessoas tão diferentes de si mesmas, que a batalha conjugal está garantida até o fim dos tempos.
Nada mais TDAH; uma vida de pura adrenalina, uma ferrenha disputa de poder e sedução dentro e fora do casamento.
A música do Caetano -creio que sem querer - retrata muito bem isso. Seres mutantes que jamais se encontram, nunca se acham, mas que vão se engalfinhando pela vida afora na esperança de domar a personalidade rebelde do outro, ou quem sabe sobrepujar o outro em inteligência, poder de sedução, força, etc, etc.
Leiam a letra com cuidado, é um belíssimo desencontro. Linhas paralelas que jamais se tocam, mas que não se abandonam.
O QUERERES:
Onde queres revólver, sou coqueiro
Onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alta, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão
Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês
Ah! bruta flor do querer
Ah! bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói
Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és
Ah! bruta flor do querer
Ah! bruta flor, bruta flor
Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock'n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
Onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus
O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim
Perfeito!
Uma ode ao amor TDAH.
Se não conhecerem a música, no vagalume.com.br tem o clipe. No youtube também, inclusive com a parceria com a Maria Gadú que ficou ainda mais bonita.
Ainda no programa Café Filosófico que citei acima, Flavio Gikovate afirma que devemos nos relacionar com quem temos amizade, com quem temos coisas em comum e não buscarmos o nosso oposto. Afinal, quando o tesão ou o vigor físico acabarem, o que vai restar é uma grande amizade, um grande prazer na companhia do outro, o que é impossível de obter de seu inimigo íntimo.
Pode parecer monótono, mas tudo o que um TDAH precisa é de paz, ainda que não saiba.
Paz!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Falou tudo quando disse que na verdade o que um tdah precisa e de paz...mas como ter paz nao sendo compreendido e nem se compreendendo.Voce acha que se assumindo um tdah e tratando com naturalidade melhora ou piora ainda mais...
ResponderExcluirA grande vantagem de se assumir TDAH é que você vai deixar de ser tratado como um irresponsável e inconsequente. Agora, se você assumir e não se tratar fatalmente será tratado como um irresponsável e inconsequente.
ResponderExcluirTratar-se faz toda a diferença.
Um abraço
E quando voce se trata e te tratam como um doente mental e riem da sua cara ...
ResponderExcluirPorque dizer que tem cancer e mais compreendido do que falar que tem tdah.
ResponderExcluirEm primeiro lugar, assumir-se TDAH não é sair gritando aos 4 cantos sua situação. Por estranho que pareça, mesmo com esse blog pouquíssimas pessoas de meu relacionamento diário sabem do meu TDAH. Se riem de sua situação, não merecem seu convívio. Quanto ao cancer, o que gera nas pessoas é um sentimento de pena e solidariedade, sabemos qual o destino de grande parte das pessoas que contraem essa maldita doença.
ResponderExcluirPodemos então através do tratamento e remédio e se auto conhecermos ter bons relacionamentos? ter casamento tranquilo eu acho que sim pois e tudo construção mostra ao outro suas verdade e limitação e vc Alexandre Schubert o que me diz disso vc que casado?
ResponderExcluirBoa noite!
ExcluirCasamento não é fácil pra ninguém pois depende da participação de ambas as partes. O tratamento facilita , e muito, nossas vidas e consequentemente o casamento. Claro que vai depender também de como a outra pessoa vai encarar e conviver com o seu TDAH. Tratar sempre vale a pena, pode ter certeza.
Um abraço
Alexandre