segunda-feira, 21 de setembro de 2015

O TDAH E O DILEMA MORAL





 
Entre a necessidade de dinheiro e a honestidade existe um longo caminho; um caminho em que podemos seguir para o nosso lado - o lado da necessidade - ou ser ético e honesto seguindo para o lado do outro.
Pois bem, vivemos esse dilema - eu e minha esposa também TDAH - recentemente.
Entregamos uma casa em que morávamos de aluguel e cuja garantia não foi fiança e sim uma caução em dinheiro no valor de R$ 1.500,00.
Na hora do acerto final, sugerimos ao dono da imobiliária que descontasse o último aluguel da caução que tínhamos feito. Assim acordados, esperamos que fizessem a vistoria do imóvel e nos chamassem para o acerto.
Depois de duas semanas de espera, fomos chamados para o tal acerto numa sexta-feira ao final da tarde. Diante da responsável pelo departamento financeiro começou nosso dilema: Por uma falha pessoal dela, a imobiliária não dispunha de dinheiro em espécie naquele momento e, do total que tínhamos direito - R$ 1.478,00 - eles dispunham apenas de R$ 500,00 em espécie.
Nos entreolhamos quando a moça nos disse o valor e calamos, deixando o acerto para a segunda-feira quando receberíamos o total em dinheiro.
Passamos o fim de semana discutindo o que fazer; a imobiliária não havia descontado o último aluguel conforme combinado. Mesmo com o rendimento de dois anos da poupança, imaginávamos receber no máximo R$ 1.000,00 e não o valor quase integral.
Íamos da desonestidade absoluta - ficar com o dinheiro todo e foda-se a imobiliária - à honestidade absoluta de chegar e falar: olha combinamos de descontar o aluguel e vocês não o fizeram...
A segunda-feira chegou e decidimos não fazer nada (nada mais TDAH), simplesmente aguardar o que a imobiliária tinha a dizer e mostrar.
Graças  a Deus fizemos a sábia opção pelo silêncio.
Chegamos ansiosos à imobiliária e a moça do financeiro nos aguardava com toda a papelada e o dinheiro já separado. Nos entregou o recibo de R$ 1.478,00 onde estavam discriminados os rendimentos e descontos feitos pela empresa. No alto, em negrito e letras garrafais o valor do depósito inicial: R$ 1.758,00;  depois disso vinham os dois anos de rendimento e lá estava ele; o desconto do aluguel vencido.
Começamos a sorrir aliviados e ao mesmo tempo constrangidos. Simplesmente não sabíamos quanto havíamos depositado. E pior, não tínhamos nenhum recibo, nenhum comprovante, nem mesmo o contrato de locação onde estava discriminado o valor da caução nós encontramos em nossa casa.
Embolsamos a graninha inesperada e saímos dali alegres, felizes e satisfeitos.
Ou não.
À parte a felicidade do dinheiro recebido sem culpa, a constatação de que o TDAH é maior e mais forte do que qualquer medicamento foi o resultado do episódio. A Ritalina, ou seus equivalentes e concorrentes, fazem um efeito parcial e momentâneo; não criam novos hábitos
Essa parte é nossa e é muito difícil de implementar. Em algum momento eu deixei pra Ana guardar e ela deixou pra mim. Ninguém sabe o que aconteceu.
Consigo me organizar em muitas coisas, criei bons hábitos no trabalho, mas no todo, em todas as áreas da vida não tem jeito.
O TDAH é de amplo espectro e eu só consigo atuar em alguns departamentos da vida.
Fiquei triste? Não. Já me acostumei a essas falhas tdahdianas.
Acostumar é diferente de acomodar. Não me puno ou me critico. Me alerto e me preparo para situações semelhantes que fatalmente surgirão. É tudo o que posso fazer.
Pelo menos o TDAH, ainda que por vias indiretas, me livrou do dilema de lesar ou não a imobiliária.
Confesso que eu não sei o que faria se eles estivessem errados.
Usei o dinheiro para pagar meu cartão de crédito por que, obviamente, o dinheiro que eu havia juntado para esse fim virou fumaça. Mas isso fica para um novo post...

14 comentários:

  1. Eu costumo dizer que tdah tem anjo da guarda mais forte, hehehe.

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    1. Concordo com você. Quando acho que estou caindo no abismo esse anjo surge e segura minha mão. rsrsrs

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    2. quem me conhece, diz que tenho sorte de ter anjo da guarda forte e sorte de conviver com pessoas santas... já me disseram que eu deveria conhecer alguém bem sangue-ruim pra eu aprender a ficar esperta. Pior que já conheci gente de sangue-ruim sim - gente vingativa que mata qualquer um de medo e gente que se aproveita da desatenção dos outros pra enganar... e nem assim tomei jeito.

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  2. Tomo ritalina há alguns anos...a velha historia, começava e parava faculdade a toda hora, porque tinha dificuldade de aprender, de acompanhar a turma...Ate que descobri que tinha um problema e não preguiça.

    O remédio foi bom, conseguia estudar, prestar atençao, aprender, mas o remedio não fez com que minhas notas subissem, claro que melhoraram, mas ainda continuei sendo um aluno ruim.

    O tempo passou, mesmo tomando o remédio, continuei reprovando, as dificuldades continuaram....comecei a ter sintomas de sindrome de panico, não cheguei a ir em medico, mas li e vi que me encaixava.

    SEmpre fui calmo, hoje qualquer coisa relacionada a estudo ou faculdade me deixa tão nervoso que chego a tremer e suar, as vezes vem aquela vontade de chorar, e eu tenho que controlar.
    Agora pouco acessei o sistema acadêmico da faculdade pra ver minhas notas, só de pensar em fazer isso comecei a ficar tenso, com a boca seca, meus musculos se enrigessem...falei pro neurologista da minha ansiedade e ele me receitou pristiq, ainda não tomei, mas vou tomar.

    Então escrevi pra saber se algum leitor aqui do blog ja passou por isso e se consegui resolver.
    Sinto que estou abalado psicologicamente, eu não era assim antes de começar a faculdade. Em vespera de prova, ou quando estou fazendo prova fico alterado, nem consigo escrever direito, tenho vontade de sumir.

    Não sei como lidar com isso, as vezes tenho vontade de largar tudo, isto esta me consumindo, mas tenho medo de me arrepender, já larguei tanta coisa na minha vida.
    Não sei o que fazer, não sei o que estou fazendo de errado, e não sei pra quem perguntar.

    Desculpe tantas lamentações.

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    1. Eu te entendo, cara! Muita coisa do seu relato bate com o que aconteceu comigo na época de faculdade. Estudava em outra cidade distante uns 60km da minha e em um determinado período comecei a ter muita ansiedade no deslocamento pra lá. Nesse período comecei a me sentir péssimo por conta do meu pífio desempenho acadêmico, fiquei deprimido e ansioso. Procurei um médico e comecei a tomar aqueles famosos remédios que todos nós conhecemos. Me sentia um pouco melhor ao longo do tratamento, mas não me ajudava a resolver minha situação na facul. Eu via meus colegas de turma avançando e eu na maioria das vezes ficando pra trás, isso me matava por dentro.

      Em determinados momentos tinha até um pouco de inveja, queria ser como eles, e por mais que eu tentasse não conseguia. Infelizmente descobri um pouco tarde meu TDAH, isso acabou comigo.Sofri e ainda sofro com isso. Foi muito doloroso ver meus amigos se formando e eu lá atrás, perdido, devendo disciplinas e depois tentando sem sucesso concluir o curso. Tudo em vão, só frustrações, tristeza, raiva e a perda da esperança de melhorar.

      Sentia e ainda sinto o peso de todos os anos que perdi, o sabor da derrota, o complexo de inferioridade gerado por uma baixa autoestima. É horrível sentir-se como um estúpido, como um ser que não consegue aprender, não conseguiu achar seu lugar no mundo, é muito ruim, cara! Pouco a pouco eu venho tentando melhorar, ainda resta uma centelha de esperança dentro de mim, tenho mudado certos hábitos, inclusive tenho feito atividade física, que, pelo menos tem me dado prazer e um pouco de saúde. Quem sabe com mais saúde física eu não consiga ir em busca de melhorar minha saúde mental, né?

      Grande abraço a todos!

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    2. Essa sensação de incapacidade me destrói, o pior é que eu não sei como resolver, não acho respostas.

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    3. TDAH é doença e pra doença não existem respostas. Mas vcs sabiam que podem pedir maior tempo de prova? No enem vocês podem pedir até um ledor. Uma pessoa que vai ler a prova pausadamente e em detalhes, coisa que não fazemos. Imagino que na faculdade valha da mesma forma. Tempo a mais pode fazer a diferença. Menos pressão melhores resultados.

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  3. Infelizmente a falta de atenção me faz ter atitudes que vão contra o que é correto e moral, tipo marcar compromissos e não dar conta, esquecer dos meus atos, não aprender com os erros, deixar escapar informações sigilosas ou calar na hora errada, etc. Até mesmo nos relacionamentos, deixo a pessoa em dúvida sobre a sinceridade da minha amizade, pois na hora de falar,falo bonito, mas na prática, não sou alguém com quem se pode contar e não sou nem um pouco cuidadosa. Minha falta de atenção, muitas vezes me faz passar uma imagem de espertalhona e mentirosa que se finge de boba pra se dar bem. Só pareço espertinha. Se a mesma pessoa me engana mil vezes, eu caio mil vezes.

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    1. Eu poderia fazer esse mesmo comentário, sou exatamente assim. Sou um péssimo amigo. Não procuro, não respondo, evito encontrar...
      Não é desgostar da pessoa, é... Sei lá, entende?
      Pois é.

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    2. tbm sou exatamente do mesmo jeito.

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  4. Incrível abrir o blog e encontrar um texto sobre dilema moral. É uma das coisas que perturba muito, que martela na cabeça. Recentemente meus sogros decidiram adotar uma criança. Meu tdah não permitiu que eu silenciasse. Metralhei com palavras os dois, que até agora não sei até onde pude prejudicar a criança (que ama demais os dois). Fiz tanta perguntas e emiti tantas opiniões, que estou a três dias com vergonha das minhas falas. Muito pq a "mãe" da criança é viva e recebe pensão e eu recém casei com o filho único deles. O motivo de adotarem me atordoou, me trouxeram questões jurídicas e tantas coisas... Acho que meu tda "surtou" diante da situação. A mãe da criança era uma ex moradora da casa de aluguel deles e a situação piorou tanto que eles tiveram que se mudar pra uma favela em campinas, meus sogros simplesmente "pegaram pra criar". Eles nunca saberão que minha preocupação era com eles, pois são idosos. Minha sogra saiu da nossa casa (moramos a 3.000 mil km de distancia deles), com sentimento de "devolver a criança" que a mãe biológica, serenamente "deu" pra eles criarem, devido o amor da criança por eles e a atual situação financeira dela (claro, além de ser uma vaca que "dá" o filho), dilema moral, é a minha questão! Mara

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    1. Oi Mara. Você disse tudo quando usou o termo metralhar com palavras. Não temos freio e muitas vezes perdemos a razão por falarmos demais e de forma agressiva demais. Peça desculpas mas seja breve e não entre novamente no cerne da questão, senão a metralhadora dispara novamente. Da próxima vez que quiser opinar sobre algo, cale-se e conte até cinco lentamente. Esse é o tempo que precisamos para filtrar nossos pensamentos.
      Abraço

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    2. Não entrei mais no cerne da questão, pois isso pode me perturbar em questão de "certou" ou "errado". E sim, tentarei contar até cinco, pois nunca pensei nessa alternativa. Muitas vezes ao falar, percebo minha alteração, como se me "assistisse" sabe. Obrigada por responder e pela compreensão. Abraço.

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    3. Eu te entendo bem rs.
      Eu quando fico nervoso ou quero export minha opinião e vou de 0 a 10 em menos de 1s. O que tenho tentado fazer é pensar: "calma isso é a merda do TDAH conta ate 10 respira e fica calmo vai passar".

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