domingo, 28 de outubro de 2012

UM TDAH ENTRE O DESEJO E A NECESSIDADE






Pra quem não sabe, eu sou Técnico em Manutenção de Celulares. Adoro meu trabalho, adoro tecnologia, adoro celulares e como bom TDAH amo novidades. Imagine quando tudo isso se junta.
Na última sexta feira comprei para a loja um Nokia Lumia. Ele reúne todos os requisitos acima. Além de lindo, tem muita tecnologia e a novidade do Windows phone. Agora calcule o impacto que ele causou em mim. Estou sem telefone. Vendi o Atrix que eu amava. A proposta foi irrecusável e eu abri mão do meu Android personalizado. Desde então venho pulando de um modelo pro outro ao ponto de estar usando nessa semana um celularzinho de quinta categoria abandonado por uma cliente que o deixou pra trocar o LCD.
Meu aniversário chegando, o celular entrou por um preço excelente, eu estava louco para experimentar um Windows phone. Resolvido, vou ficar com o Lumia. Trouxe pra casa para o fim de semana. É espetacular e desafiante. Um novo sistema operacional, lindo e desconhecido, tudo o que eu sonhei.
Mas, existem também os pesadelos. Estou muito, muito, mas muito apertado financeiramente; este aparelho pode me dar um lucro muito legal. E aí?
Não quero vendê-lo, preciso de um celular e até andei pensando em capitalizar em cima do Lumia. Comprei esse aparelho de um um amigo que o presenteou ao filho de dezesseis anos. O garoto empacou no Windows e odiou o aparelho. Três dias após a compra ele me trouxe o aparelho para trocar num Android. O que imaginei foi criar um blog de apoio aos iniciantes do Windows phone e divulgar que sou um expert nesse sistema operacional e cobrar pela configuração inicial e consultoria de como usá-lo.
Mas a realidade martela minha cabeça. Despesas, despesas, despesas. Quanto tempo levarei para me tornar um expert em Windows phone? Como divulgarei minha expertise? Quanto tempo levará para que o blog seja conhecido e principalmente rentável? Quanto tempo isso irá consumir? Quanto custará a divulgação? Qual o universo de clientes vou atingir?
Não sei responder a nenhuma dessas perguntas, mas sei quanto devo e quanto tenho de pagar.
Aí lembrei-me das palavras de minha coach Luciana Fiel e minha médica Valéria Modesto sobre a dificuldade do portador de TDAH em decidir entre a necessidade e o desejo.
Estou nessa encruzilhada.
Somente um TDAH sabe o tamanho dessa decisão. Minha mente luta contra minha decisão racional de vender o aparelho. Crio uma série de argumentos a favor de mantê-lo, me dar o Lumia de presente. Mas não posso, e sei que não posso. Mas tento me enganar.
Se você não é portador de TDAH não imagina o tamanho dessa tortura, meu interior se revolta nessa luta entre o prazer e a necessidade de gerar receita com o Lumia. Poucas vezes na minha vida neguei-me um prazer em prol de uma necessidade.
Vou vendê-lo, mas sinto fisicamente (e isso é de verdade)  uma reação contrária.
Imaginei encerrar esse post com a seguinte frase: Vou colocá-lo à venda mas torcer pra que ninguém compre.
Pode parecer engraçado mas não posso me dar esse direito.
Vou colocá-lo à venda e trabalhar para vendê-lo rapidamente. Mais pra frente vou poder comprar um Lumia; não um 710 como esse, mas um Lumia 920, última geração. Até lá vou estudar o Windows phone de maneira teórica e me preparar para ser o expert em Lumia da cidade.
Mas agora, tenho que pagar minhas contas. E vou vender esse Lumia rápido.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A MEGA SENA E O TDAH



Uma das características que mencionei no post: 25 coisas sobre mim.Com e sem TDAH é a infinita capacidade que tenho de sonhar durante o banho.
Talvez o sonho que mais tenho é: o que eu faria se ganhasse na Mega Sena.
Um sonho duplamente TDAH.
Mas não é aquela coisa genérica de se eu ganhar vou ajudar minha família, os amigos, umas instituições de caridade, essas coisas. Não!
Em primeiro lugar fico pensando em como seria minha reação ao saber que ganhei. Morro de medo de passar vergonha, portanto eu iria conferir umas 75 vezes, em sites diferentes até ter certeza de que ganhei mesmo. Outra coisa é que eu só penso em ganhar sozinho, jamais me imaginei dividindo o prêmio com alguém. Quero tudo! Uma questão que me intriga é se eu conseguiria comer ou dormir nesse período que vai da confirmação do prêmio (normalmente os sorteios são depois de fechados os bancos) até na hora em que a CAIXA abrisse e eu pudesse colocar a mão na grana. Fico imaginando minha ansiedade, meu nervosismo; tento imaginar se eu iria sair pela noite, andando de carro pela cidade até o amanhecer. Num dos meus últimos sonhos de  milionário tomei a sábia decisão de receber o prêmio no Rio de Janeiro. Assim eu passaria algumas horas dirigindo, consumindo meu tempo e tentando reduzir a ansiedade.
Passada essa primeira fase, a segunda seria de comunicar à minha família que estamos milionários. Claro,  enquanto não pusesse a mão na grana não não contaria a ninguém, vai que alguma coisa dá errado. Aí existe uma encruzilhada muito importante: volto para Juiz de Fora no meu velho carro imediatamente após me apossar da grana ou troco o carro primeiro ( o que atrasaria o comunicado à família em alguns dias). Após decidir essa questão crucial, imagino como seria comunicar essa notícia e a respectiva reação de cada um dos membros da família.
A troca do carro, a casa nova, as várias compras de eletro eletrônicos super hiper megas high tech, isso ocupa longos minutos do banho. Outra dúvida recorrente é se eu moraria em uma fazenda na região de Juiz de Fora ou  me mudaria para uma cidade praiana. Talvez o Rio de Janeiro, cidade que eu adoro.
Por fim onde e como investir o excedente? Se faria uma previdência privada para mim e meus familiares garantindo o futuro de todos, se imóvel seria ou não um bom investimento, enfim, vária questões essenciais para um novo milionário.
Mas o que mais me ocupa é tentar imaginar meus sentimentos. Os que mais me preocupam são: como eu reagiria ao saber que fui premiado e se eu me transformaria em um sujeito preponente, antipático, arrogante, ou se me manteria normal, humilde e tranquilo.
Mas pensando bem creio que quase todas as pessoas sonham com o prêmio da Mega Sena. Isso é bastante comum, normal mesmo. Nada demais!
Por que eu disse acima que é um sonho duplamente TDAH ?
Em primeiro lugar pelo sonho em si, por sua intensidade e riqueza de detalhes.
Em segundo lugar e principalmente: eu não jogo!

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

TDAH, UMA ARMA PODEROSÍSSIMA A NOSSO FAVOR








"Temos que aceitar que temos "armas poderosíssimas" que a maioria dos "atentos" não tem!! "
Essa frase acima é de uma leitora, que é médica, que em seu primeiro comentário afirmou ter dois anos e seis meses de vida. O tempo em que foi diagnosticada como TDAH.
Ao ler essa frase me de um estalo: uai, não é que ela tem razão!
E aí emendo com uma afirmativa recorrente de meu amigo 'Frank Slade': o TDAH que nos derruba é o mesmo que nos dá força para nos reerguer.
Pensem comigo, nossa vida é subir uma ribanceira empurrando uma enorme pedra, e conseguimos subir. Imagine se subirmos essa mesma ribanceira sem a pedra! E o que vai fazer a pedra sumir, ou ter seu peso reduzido é o tratamento.
Os 'atentos' não estão acostumados a enfrentar os sabotadores como nós, não sabem armar estratégias para burlar a desatenção, não tem a nossa capacidade de se encontrar em meio ao caos de nossa desorganização, os 'normais' não possuem nossas armas para conter a procrastinação.
Certa vez assisti a um filme chamado Perdas e Danos. No filme um político inglês de projeção, envolve-se com a noiva do próprio filho. A descoberta da infidelidade da noiva com seu pai acaba por provocar a morte acidental do rapaz. As consequências são as piores possíveis; a carreira de político acaba ali, o seu casamento também, o relacionamento com a noiva do filho também. Mas a certa altura, numa conversa com sua ex futura nora, ele ouve a seguinte frase: cuidado com as pessoas sofridas; elas sabem sobreviver.
Podemos adaptar essa frase para nossas vidas: abram alas para os portadores de TDAH, eles sabem sobreviver!
Aproveito a carona do comentário de MariJu para relembrar as palavras de minha coach Luciana Fiel em nossa última reunião do Mente Confiante: o que nós precisamos é dar ênfase ao reforço positivo. E foi isso que a MariJu falou, enfrentar o TDAH nos dá armas e forças muito além do normal. O exercíco do TDAH nos dá músculos aptos para a vida, para os desafios da vida atual.
Se conseguirmos reduzir o peso dessa pedra teremos músculos altamente qualificados para superarmos os 'atentos'.
Não que seja importante superar os 'normais', o mais importante é nos sabermos preparados para competir nessa vida louca que todos nós, TDAHs ou não, levamos hoje em dia.
Levantemos a cabeça e saibamos extrair o positivo daquilo que nos dificulta a vida.

domingo, 21 de outubro de 2012

UM TDAH QUE NÃO DISCUTE COM NINGUÉM








Por que não enxergamos o óbvio?
Por que é tão simples e ao mesmo tempo tão difícil?
Ontem foi a reunião do grupo Mente Confiante, como sempre foi riquíssima, mas a de ontem foi especialmente especial. rsrs
Um garoto de 13 anos deu seu depoimento como portador de TDAH e deu um exemplo de maturidade, persistência e inteligência.
O depoimento iniciou-se com sua história de vida; ainda bebê enfrentou, e venceu, a morte, tendo inclusive ficado vários dias na UTI. Segundo ele, já passou por várias escolas sendo expulso de pelos menos duas. Impulsivo, irritadiço, atirado, esse garoto vivia às turras com colegas, professores e familiares. Mesmo quando estava com a razão, suas reações muitas vezes excessivas transformavam-no de vítima em algoz. Em inúmeras oportunidades ele foi suspenso nas escolas em que estudou.
Depois de tantos dissabores, de infinitas discussões familiares, esse sábio menino tomou uma decisão: NÃO VOU MAIS DISCUTIR COM NINGUÉM! E está cumprindo!
Imagine a maturidade desse garoto de 13 anos de enxergar que ao confrontar as pessoas ele atira gasolina na fogueira, perde a razão e apenas piora o ambiente em que vive.
E aí eu me perguntei: eu já tomei essa decisão?
Não me lembro de ter tomado uma decisão de não discutir, de não bater boca, já pensei nisso inúmeras vezes, mas não como uma decisão. E você, já decidiu parar de discutir? De colocar lenha na fogueira?
Em minha cidade existe um supermercado que no período de natal usou uma camiseta que estava escrito:
é superior quem toma a iniciativa da paz! Gostei dessa frase, em geral somos belicosos e acreditamos que não podemos PERDER aquela discussão. O que é ganhar uma discussão? Massacrar o 'oponente'? Impingir-lhe seu ponto de vista? Ou simplesmente calar-se e deixar que a discussão morra no nascedouro?
Sejamos honestos, não existe um vencedor em nenhum tipo de discussão. Existem dois ou mais perdedores, nunca um ganhador. Saem ambos machucados, ofendidos e raivosos. Ao calar-se, o que pode parecer uma derrota transforma-se numa enorme vitória. Ao abdicar do bate boca colaboramos para que a temperatura baixe, que o ambiente melhore, e cá entre nós, a verdadeira vitória é deixar o oponente no vácuo, com cara de babaca.
Claro, não vamos imaginar que nunca mais vai existir uma discussão em nossas vidas, ou que aceitaremos tudo de cabeça baixa e calados, não é isso; a sapiência dessa decisão esta em enxergar a inutilidade das discussões, dos confrontos, das brigas.  E ao decidir damos um enorme passo em direção a uma vida melhor. E é isso que buscamos.
Pense nisso também, vamos fazer uma campanha pelo fim dos bate bocas em nossas vidas.
Parabéns e obrigado, Artur, por compartilhar sua sábia decisão.

sábado, 20 de outubro de 2012

25 COISAS SOBRE MIM. COM E SEM TDAH








Por sugestão do amigo Peregrino DDA fiz uma lista com 25 características minhas. Não sei dizer direito onde está ou não o TDAH, mas eu não seria eu sem a presença dele. Portanto ele deve estar em todas as 25 características.

1- Sou desatento. Não esqueço chaves, nunca perdi um celular; esqueço compromissos, consultas, lugares, pessoas...
2- Tomo banho longuíssimos, ali que eu sonho. Ali não sou eu - ou é o momento em que mais sou eu- não sou desse mundo, não existem dores, decepções e cobranças. Talvez por isso a conta de energia lá de casa seja tão alta.
3- Não posso ver uma loja vazia, para alugar, que logo imagino o que montarei ali. Mal consigo administrar minha micro loja e devaneio com mil outras empresas.
4- Não gosto de filmes, principalmente no cinema. Prefiro seriados, duram em média 40 minutos, portanto não me obrigam a ficar ali sentado por infindáveis 2 ou três horas.
5- Tenho alguns vícios: Café, Coca Cola, Sexo. Não necessariamente nessa ordem. Depende do dia, da hora e do lugar. E obviamente da companhia.
6- Sou extremamente democrático e liberal. Aceito quase tudo o que não prejudique ao outro.
7- Sou muito, muito, mas muito sarcástico.
8- Sou engraçado, divertido, simpático e alegre. E sou mesmo.
9- Sou um otimista inabalável. Mesmo quando estou pra baixo ainda acredito. Ou ingênuo, né! Prefiro otimista. rsrs
10- Sou de extremos: amo ou odeio. Mais odeio do que amo.
11- Tenho forte tendência a ser solitário, me enclausurar dentro de casa, ficar comigo mesmo.
12- Adoro livros, tanto em conteúdo como em forma. Meu sonho é ter uma livraria. Talvez eu fosse à falência pois não iria querer vender os livros que ainda não li.
13- Amo sorvete, chocolate, queijo, café e coca cola. Por isso estou bem acima do peso.
14- Adoro dirigir. Já pensei em ser motorista de ônibus rodoviário ou de carreta para viajar, viajar, viajar.
15- Sou um ex desorganizado em processo de organização. Já melhorei demais nesse quesito, quase não me reconheço.
16- Procrastino demais, mesmo com a Ritalina. Me cobro, me xingo, me policio; mas engano a mim mesmo e procrastino.
17- Sou um hedonista. Não consigo viver sem extrair prazer da vida por muito tempo. Uma vida continuadamente sem prazer acaba me levando a ações impensadas e, normalmente, catastróficas.
18- Odeio dormir! Mas odeio mesmo. Como dizia Machado de Assis: dormir é morrer provisoriamente.Durmo cerca de 5 ou 6 horas por dia e contrariado.
19-Não pretendo morrer. Mas também não faço exercícios, não caminho, não como verduras, nem me alimento de 3 em 3 horas e não vou ao médico fazer check up. Conto com a sorte e a benevolência Divina.
20-Acho que sou meio existencialista. A vida não traz surpresas, você colhe EXATAMENTE aquilo que plantou. E não interessa se você plantou TDAH, vai colher TDAHzinhos aos montes.
21-Adoro meu trabalho. Um trabalho que comecei aos 50 anos meio que sem querer e que hoje é o maior prazer que extraio da minha vida.
22- Amo água, principalmente do mar. Um dia ainda morarei á beira mar. Com certeza.
23- Minha infância foi muito parecida com a estória do livro " O menino maluquinho". Muito parecida mesmo. Inclusive eu era goleiro, atirava a mochila da escola pela janela, cantarolava e assobiava sem parar, e outras coisas que esqueci agora.
24-Sou altamente disciplinado para algumas coisas e completamente indisciplinado para outras. Mesmo meu sax, que eu amo, não consigo ser disciplinado. Quando toco sinto tanto prazer que juro a mim mesmo tocar diariamente, me aprimorar (aprender a tocar direito), uma hora por dia, no mínimo. Rá, quem dera.
25- Não sei se por causa do TDAH, sou um cara feliz. Acho que sonho tanto, viajo tanto, que não vejo que minha vida é ruim. As vezes nem é, né?
Obs.: Taí, Peregrino.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

TDAHs DO BRASIL, UNI-VOS!







Se por algum motivo você TDAH estará em Juiz de Fora, passará próximo, mora por perto ou tem possibilidade de vir a JF amanhã, sábado dia 20 de outubro às 17 horas, venha.
Amanhã é o dia do carinho ao portador de TDAH, amanhã é o dia da reunião do Grupo Mente Confiante, com a coordenação da Dra. Valéria Modesto e da coach Luciana Fiel. A reunião do Mente Confiante é um momento totalmente voltado para a discussão do TDAH, das nossas agruras e vitórias, de nossos problemas e das estratégias que temos para enfrentá-los. 
A reunião do Mente Confiante recarrega as nossas baterias, nos dá forças para as batalhas do dia a dia e nos dá a reconfortante certeza de que não estamos sós.
As reuniões mensais do Mente Confiante são abertas àqueles portadores interessados em conhecer melhor o transtorno, aos nossos familiares que queiram  aprender a conviver conosco e à todos que se interessam pelo TDAH e suas consequências em nossas vidas.
Venham conhecer o grupo Mente Confiante, você se sentirá renovado para enfrentar o TDAH.
Venha você será muito bem recebido.

Sábado dia 20/10/2012 - 17 horas - Victory Business Hotel - Av Itamar Franco.



terça-feira, 16 de outubro de 2012

O TDAH, O BLOG E O MURO DAS LAMENTAÇÕES






Num comentário por email que recebi antes de ontem, uma amiga virtual comentou que o blog se assemelhava a um muro das lamentações.
Confesso que minha primeira reação foi de irritação, depois percebi pelo teor completo do email de que não se tratava de uma crítica gratuita e sim de uma constatação, uma conclusão que ela chegou em função do teor da maioria dos posts.
E por que isso?
Esse blog é um retrato da minha vida, ou um retrato da minha alma, ele reflete exatamente pelo que eu estou passando, minhas conquistas e minhas derrotas, minhas alegrias e tristezas. Completo em novembro 52 anos, 50 dos quais sem nenhum tipo de tratamento do TDAH é normal que eu ainda sofra os efeitos da doença mesmo quase dois anos após iniciar meu tratamento. Mal comparando, fui fumante por 24 anos e há  14 anos abandonei o cigarro; ainda hoje levo a mão ao bolso da camisa pra pegar o maço de cigarros. O que imagino é que para meu cérebro o hábito do fumo ainda tem profundas raízes afinal, o tempo de fumante ainda é bastante superior ao de não fumante. Acredito que com o TDAH seja algo semelhante. Minha personalidade foi forjada com o TDAH acoplado a ela, meu cérebro está habituado a agir conforme as características do TDAH por isso é tão difícil vencê-lo. Por isso é tão necessário ao TDAH diagnosticado na idade adulta policiar-se, analisar se seus atos sãos seus ou frutos do TDAH. Por isso precisamos da Ritalina, do coaching, do apoio psicológico, do atendimento médico. 
Apesar de estar me tratando há dois anos, praticamente, minha vida ainda sofre fortes consequências do 50 anos de reinado absoluto do TDAH.
Esse blog não é um espaço literário ou de ficção, esse blog é um desabafo, um grito, um grito que encontrou eco em milhares de acessos vindos de diversos países do mundo. Esse espaço gerou cerca de mil comentários de homens e mulheres que sofrem os efeitos do TDAH.
Do fundo do coração, eu gostaria que esse blog fosse uma sucessão de vitórias, conquistas e sucessos. Mas aí seria mentira, não teria credibilidade; nenhuma vida é feita só disso. Com ou sem TDAH.
A vida é luta, e a vida de um portador de TDAH é luta acrescida da doença. O TDAH se soma aos problemas normais de todas as vidas, é um problema a mais. 
Ao escrever sobre o que enfrento, ganhando ou perdendo, ponho a nu as estratégias do TDAH, retrato não só a mim e os meus problemas, mas os problemas que milhões de pessoas enfrentam no Brasil e no mundo.
Confesso que cheguei a me preocupar se o blog não estaria ficando pesado ou pessimista demais; mas creio que não, o blog é realista. Às vezes um pouco amargo, noutras um tanto forte, mas a vida é assim, e reconstruí-la aos 50 anos dá um trabalho danado. Estou aprendendo a reconstruí-la, estou mudando hábitos arraigados há meio século, luto com um inimigo poderoso e sorrateiro. mas não luto sozinho. Tenho ao meu lado cada leitor desse blog, minha médica e minha coach ( tinha mais gente mas me deixou pelo meio do caminho) e tenho o próprio blog, meu muro das lamentações. Não, lamentações não, meu Muro das Emoções. 
Ficou melhor, né!

Obs.: O melhor do blog são os comentários. Aprendo com eles, geram posts e me fazem avaliar e reavaliar aquilo que escrevo e meu tratamento. Não deixem de comentar, é muito importante.

domingo, 14 de outubro de 2012

AS CERTEZAS INCERTAS DE UM TDAH






Assisti a uma entrevista da atriz Lília Cabral e uma frase sua chamou-me a atenção:  desde cedo, ainda adolescente, tinha absoluta certeza de que seria atriz.
Que inveja! Jamais tive certeza de nada a respeito da minha vida. E quando tive, estava absolutamente enganado.
Achei que seria um excelente advogado,  abandonei o curso; sonhei em ser filósofo, abandonei também; tive um sem número de amores infinitos e dezenas de empregos e empresas que julguei serem definitivos.
Que inveja, meu Deus!
Mas não invejo apenas aquelas pessoas que possuem certezas absolutas, invejo também àquelas que amam algo ou alguém de forma absoluta. Surpreendeu-me saber que algumas pessoas vieram de outros estados para dar o último adeus a Hebe Camargo. Quanto amor, meu Deus, e por uma pessoa que jamais soube da existência daquela tão devotada! Fico estupefato com essas pessoas; milhares, centenas de milhares de pessoas acompanharam a passagem do caixão de Ayrton Senna. Eu jamais sairia de casa para ver o caixão de qualquer celebridade; ou o casamento de uma princesa. Mais impressionado fico com aquelas pessoas que amam objetos e os colecionam, tornam-se experts em 'Gibis', armas antigas, trens de ferro, barbies, sei lá, uma infinidade de coisas que acabam se transformando em suas vidas.
Após mais de meio século de vida não encontrei nada que me arrebatasse de maneira absoluta.
Mas invejo as pessoas com essa capacidade de amor incondicional; à primeira vista pode parecer uma doença, uma obsessão, mas é capaz de oferecer um sentido a essas vidas, uma compensação de prazer ao dia a dia geralmente medíocre e massacrante que todos nós levamos.
O primeiro nome desse blog foi "A VIDA À DERIVA". Era assim que eu me sentia, e acho que todos nós, portadores de TDAH, nos sentimos assim em algum momento da vida. Ou em toda ela.
Tudo meu foi feito ao acaso, ao sabor do momento, num impulso de uma fração de segundo.
Decido as coisas de uma hora pra outra, sob o efeito de situações limite, em geral emocionais.
Jamais consegui traçar uma meta; se tracei, esqueci.
Admiro e invejo os metódicos, os organizados, os que possuem essa sagrada chama da certeza na vida. Sou o caos, sou do caos, sou fruto do caos. E isso cansa demais. Sonho com a estabilidade, sonho com a falta de surpresas, sonho com o cartesiano; mas acordo a cada dia de um jeito, precisando da ritalina para retomar o eixo, para refrear os impulsos irrefreáveis, para estabilizar o caos.
Hoje exerço uma profissão nova, que comecei aos 50 anos e que adoro, mas que me veio de uma forma imprevista e não programada. Sinceramente, entrei nela com uma sensação de provisoriedade, de que seria apenas momentâneo. Mas assim é minha vida, apaixonei-me ao ponto de sentir falta de meus aparelhos nos finais de semana, ainda hoje, domingão, pensei em dar um pulo na loja . Nunca imaginei isso em minha vida. Fruto da absoluta imprevisibilidade em que vivo.
Minhas atitudes imprevisíveis podem magoar, machucar aos outros e a mim; mas uma força maior do que eu  me impele a agir. Em alguns momentos sinto que está errado, mas faço, sigo em frente, não consigo parar.
Por isso me trato, tento estabilizar minha vida e por consequência a vida de quem me cerca. Ninguém pode viver à mercê da instabilidade alheia. Na verdade nem eu mesmo aguento mais tanta instabilidade e incerteza.
Parafraseando Sócrates, o filósofo: A única certeza que tenho, é que não tenho certeza nenhuma.
O que é uma pena...


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

O NAVIO FANTASMA DO TDAH






Em uma noite sem lua, sob intenso nevoeiro navegava a pequeníssima nau do comandante portador de TDAH. Se o mar não estava calmo tampouco estava revolto. Exigia atenção e cuidado  mas não medo. Então o portador segue sua rota, afasta-se da costa, venceu um dia nublado com perícia; ao fim da tarde uma chuva encorpada com raios e muitas nuvens negras ocultaram definitivamente a lua que havia surgido tímida no céu. Naquela hora, já em meio à madrugada o oceano se alisava, dois terços da viagem já tinham sido cobertos, uma relaxada já parecia possível. Mas, antes do relaxamento fazia-se necessária uma conferência geral: motores, equipamentos, meteorologia, conferir se mantinha-se na rota pré determinada...
O relax iniciou-se um pouco antes do que deveria; a viagem seguia tranquila naquele momento, quantas vezes já havia feito a mesma viagem, a mesma rota, o mesmo oceano. O ouvido experiente reconheceu facilmente a qualidade do ronronar dos motores; não era preciso checar visualmente. Uma leve consulta aos equipamentos, assim, de longe, enquanto caminhava para a cabine. Uma olhadela rápida à previsão do tempo mostrou pequena possibilidade de nova chuva ao amanhecer.
Mas, seria apenas um cochilo, sentado mesmo, poucos minutos.
Em sono profundo nosso portador de TDAH não ouviu o silenciar de um dos motores. Rateou, rateou, rateou, até silenciar-se por completo. Um vento forte começou a soprar e tirar o navio levemente da rota, nada disso foi percebido pelo navegante sonolento. Na verdade, somente os primeiros raios e trovões despertaram o comandante daquele navio já à deriva. Ao encaminhar-se para a cabine a primeira coisa que percebeu foi a falta de um dos motores. Correu à casa de máquinas e deparou-se com um motor absolutamente imóvel todo lambuzado de óleo. O combustível vazara por muito tempo antes de imobilizar aquele motor. Entorpecido pelo sono, surpreso e contrariado pelo motor danificado o comandante TDAH assume o leme do navio. Sabia que não podia forçar o único motor que ainda funcionava e reduziu ainda mais a velocidade; e então teve a segunda surpresa da madrugada: estava completamente fora da rota; sem um dos motores, os fortes ventos e a correntes marítimas aos poucos conduziram aquele navio sem timoneiro a caminhos jamais percorridos pelo comandante TDAH. A primeira e óbvia reação: retomar o rumo original mas isso tinha um custo, teria de enfrentar as fortes correntes do oceano tendo ainda como agravante a tempestade com rajadas de vento fortíssimas que vinha chegando. Naquele momento a melhor solução pareceu-lhe retroceder, voltar para a casa. Mas voltar cobraria um preço que ele não estava disposto a pagar: o julgamento de seus pares. Ainda que velado, ele sabia que seria julgado por sua incompetência, sua negligência. Expor-se a esse julgamento estava fora de cogitação. A opção seguida foi a de deixar que as correntes decidissem seu caminho; aos poucos, tentaria contornar a tempestade. Já havia enfrentado outras maiores e saíra-se muito bem. E assim foi. A madrugada avançava e o dia não aparecia. Estranhamente, quanto mais ele navegava mais densa ficava a noite. De repente, uma enorme massa surgiu no radar; as luzes do navio começaram a piscar e o segundo motor rateava perigosamente. Um enorme arrepio subiu-lhe pela coluna até a base da cabeça; diversas vezes já ouvira falar nesse conjunto de sinais, exatamente naquela ordem: aparece no radar, as luzes começam a falhar, o motor falha e então ele surge.
Estarrecido, imobilizado pela cena espetacularmente terrível, o comandante TDAH viu surgir das profundezas do oceano negro o enorme navio fantasma. O esqueleto esfarrapado e gigantesco que ele jamais havia acreditado existir estava agora diante dele e vinha em alta velocidade na sua direção. O choque destruidor era inevitável. A reação desesperada e visceral de acelerar ao máximo o combalido motor e, de praticamente golpear o leme numa direção oposta ao fantasmagórico oponente fez seu navio adernar de forma ameaçadora. O choque era inevitável mas foi muito menor do que se houvesse ficado imóvel. Com o casco danificado, vários equipamentos inoperantes e sem ter a menor ideia de onde estava ou para onde deveria ir, o comandante TDAH acelerou ao máximo o motor derradeiro. O navio fantasma descreveu uma enorme parábola e começou a retornar em sua perseguição. Mais um golpe daqueles e seria o fim.
Instintivamente sabia que a velocidade do navio fantasma era superior à sua e só um golpe de sorte o salvaria. E ele veio. Ao golpear o leme sem saber para qual direção, o comandante  TDAH retomou a rota correta e, um vez nela, colocou-se de frente para o nascer do sol. E ele nasceu, e ao nascer levou com ele o navio fantasma que necessitava da noite mais densa para agir. Ao ver os primeiros raios de sol o comandante sabia que estava salvo. Suas lágrimas misturavam-se ao seu sorriso e ele comemorava sua vitória, havia escapado do implacável inimigo.
O sol trouxe um mar liso, um dia claro sem nuvens. Esgotado o comandante TDAH foi avaliar os estragos. E eles eram muitos e graves. Mentalmente fez uma estimativa dos gastos e concluiu que a melhor solução seria vender aquele navio e adquirir um outro menor, mais barato, quem sabe até mais rápido.
E então ele chorou. Sozinho na ponte de comando ele reconheceu para si mesmo que, mais uma vez, ele fora o responsável pelo seu desastre. Negligenciou as conferências básicas, ignorou os avisos dos equipamentos e achou-se a cavaleiro da situação. Descobriu com um altíssimo custo que estava errado.
Mais uma vez teria de se desfazer de seus bens, de reduzir sua capacidade, para adequar-se a uma nova realidade imposta por ele mesmo.
Por entre as lágrimas ele divisou a silhueta de sua terra querida. Ali estava de volta, em segurança. Abatido, danificado, mas vivo.
Naquele momento ele entendeu que seu papel naquela sociedade poderia ser diferente, não exatamente como um navegador, mas como um farol! Um farol que clareasse a noite mais profunda e que mostrasse aos outros navegadores como evitar os perigos que aquela travessia poderia oferecer-lhes.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

O FESTIM DIABÓLICO DO TDAH




Logo ao primeiro olhar vê-se que comemoram uma vitória. Uma vitória há muito desejada, com o sabor dos velhos tempos, a comemoração da volta ao passado.
Do local onde se reúnem, os sabotadores apreciam a derrota das novas forças. Do alto de sua vitória organizam um banquete regado a bebida, comida e sangue. Sangue? Sim sangue. Não o sangue concreto dos mortais, mas o sangue derramado por aqueles que representavam a nova vida, uma vida de conquistas e novos caminhos. Ah, os sabotadores se cumprimentavam  uns aos outros recordando os tempos de glória, um tempo em que exerceram o império absoluto. um tempo em que derrotas como a de hoje eram constantes e os enchia de energia e orgulho.
O festim de hoje trazia um clima de euforia, quase histeria, há tanto tempo não se reuniam, não comemoravam uma grande vitória.
Recordavam os melhores momentos, os momentos em que me deixaram crer que caminhava no sentido correto. Sozinho, no silêncio da madrugada, julguei montar uma estratégia perfeita para enfrentar o embate que se avizinhava. Criei a maneira perfeita de induzir minha oponente ao erro, de desmascará-la deixando-a sem argumentos para sustentar sua tese alicerçada na mentira.
Cheguei cedo ao local, repassei cada detalhe sem perceber que naquele momento já se inciava em minha mente o Festim Diabólico do TDAH. Meu sabotadores já comemoravam minha derrotada iminente, àquela altura não tinha volta, meu exército já se encontrava no fundo do desfiladeiro cercado de índios por todos os lados (imagem típicas dos filmes de faroeste da minha infância). Mas, o tombo é muito maior quando cremos que estamos no pleno domínio da situação. Minha atuação era convincente e mantive-me bem próximo daquilo que havia planejado, mantive-me firme na minha posição, não transigi.
Então veio a queda, a decepção, a frustração, a raiva de mim mesmo, a enorme vontade de me auto punir.
Uma pergunta simples e óbvia: documentos que validam sua presença nesta audiência?
Um raio atingiu-me a alma. Não os trouxe, sequer lembrei de sua necessidade.
Neste momento fogos espoucaram encobrindo o som das garrafas de champanhe que eram abertas em meu Lobo Pré Frontal; a comemoração até então discreta era agora feérica, monumental. Os longos meses de hibernação acabaram, a miríade de sabotadores está de volta. Alguns deles pálidos esquálidos, mas com sua capacidade de agir sorrateiramente intacta. Os sabotadores dançam e cantam no meu Córtex Cerebral, alguns estão tão animados se sentindo-se tão fortalecidos que sonham com a volta do tempo em que dominavam quase todo o meu cérebro e se preparavam para tomar de assalto minha alma.




Saio do prédio às pressas, envergonhado, humilhado, entorpecido pela pancada.
Sou eu o único responsável. Ainda no carro procurei mentalmente alguém em quem lançar a culpa, mas não há. Eu fui displicente, tudo parecia tão fácil, tão óbvio, tão primário. O comportamento típico dos velhos tempos: altas elocubrações, estratégias mirabolantes para induzir o adversário ao erro e não levei um único documento que validasse minha presença naquele embate. Grosseiro, simplesmente grosseiro.
Senti-me, como outrora, um biltre. Um irresponsável incapaz de dirigir a própria vida.
Ao atravessar o rio em direção ao trabalho, deu-me uma imensa vontade de atirar-me da ponte com o carro e tudo.
Mas isso seria a coroação da derrota, a entrega final aos sabotadores; uma overdose de TDAH.
Cheguei na loja à beira do desespero; sentia-me a última criatura do reino animal. Estava eu assim, completamente absorto em meu auto flagelo quando chegou uma senhora humilde cujo filho havia quebrado o cartão de memória dentro de seu celular. Sei lá por quê, algo no seu jeito de falar me levou a pegar seu aparelho e resolver a questão na hora, coisa que raramente faço.
Entreguei-me àquele trabalho por uns quinze ou vinte minutos; ao final, ao devolver o celular a ela com o problema resolvido eu era uma outra pessoa. Alguns minutos de concentração em meu trabalho, coroado com uma das dezenas de pequenas vitórias que tenho ao longo dos meus dias trabalhados, me regeneraram. Eu sei o que estou fazendo e faço bem feito.
Ninguém é perfeito, com ou sem TDAH. Tomei uma cacetada violenta que quase me derrubou, mas hoje eu tenho meu trabalho de onde tiro uma série de compensações e prazeres diários e isso me faz feliz.
Aprendi mais uma hoje, aos quase 52 anos: não subestimar meus sabotadores. Eles não dormem, apenas cochilam esperando um vacilo, um momento de distração para tomar minha mente de assalto.
Cabeça erguida e pé na estrada. A ferida sangra, mas sua cicatriz tem de ser um marco nesse longo aprendizado de combate ao TDAH.
Os sabotadores comemoram em meu cérebro, mas no entorpecimento da festa eles não perceberam que cambaleei, mas não caí.