quarta-feira, 23 de agosto de 2017

TDAH: DESATENÇÃO É MAIS QUE ESQUECIMENTO!




Desatenção é muito mais que esquecimento. Desatenção é olhar sem ver, escutar sem ouvir, ler sem entender...  
Escrevi um post semana passada sobre um novo sintoma que descobri sobre o TDAH. Até descobrir que foi desatenção minha, e não um novo sintoma.  
Eu tinha que entregar o celular de uma cliente e o coloquei na mala. Chegando ao destino não encontrei o celular entre as minhas coisas. Fiquei arrasado, na minha mente eu me via colocando o aparelho entre roupas macias para protegê-lo. Pensei, minha mente está criando situações. E escrevi sobre isso. Horas depois a namorada encontrou o celular dentro da mala, preso num canto. O nome disso? Desatenção!  
Certa vez, nos tempos de inflação alta, comprei um terreno; ao elaborar o contrato de compra e venda a vendedora alterou a cláusula de reajuste, eu li e não percebi. Devo ter lido pensando em outra coisa. Acabamos num desgaste danado, desisti do negócio até que ela voltasse atrás. E a alegação dela era de que eu havia lido o contrato.  
Quantas vezes ouvimos parcialmente, respondemos ao que ouvimos e o interlocutor entende a resposta ao todo que ele disse... E novo desgaste... Novas brigas... Novas discussões...  
Só me descobri TDAH aos cinquenta anos de idade, imaginem tudo o que passei por não saber o que tinha. Apenas era um sujeito absurdamente desatento, folcloricamente esquecido, irresponsavelmente impulsivo, incrivelmente egoísta, e outros desairosos adjetivos que prefiro omitir.  
Sempre digo que não se deve sair dizendo aos quatro cantos que é portador de TDAH. Principalmente no trabalho, afinal pode ser usado como arma contra a pessoa. Mas num relacionamento é fundamental a verdade. Eu falo na lata. Empolguei com a pessoa já aviso. Isso economiza bons desgastes. E ajuda a avaliar aonde estamos entrando. Se a reação da pessoa for negativa, pulo fora. TDAH não tem cura, conviver com quem não entende, ou não aceita é auto flagelação.  
Não se atentar aos detalhes é outra característica do TDAH. Pra mim faz parte, ou está intimamente ligada à desatenção. Falta paciência de ler aquilo tudo... Falta atenção para olhar em todos os desvãos... Falta ânimo para cobrar todos aqueles detalhes que ficaram para trás... Uma vida generalista, sem detalhes. A solução é se aliar a alguém oposto. Desde que este alguém goste de controlar e corrigir e aceite bem esse papel. Estando consciente de que a desatenção é fruto de um transtorno e não de negligência ou preguiça, é menos difícil de conviver.  
Estamos vivendo a época de respeito às diferenças. A mídia cobra novos comportamentos, mas venhamos e convenhamos, na maioria das vezes, é mais fácil conviver com o macro, do que com as micro diferenças do dia a dia.  
Desatenção, falta de memória, Impulsividade, fazem parte do nosso pacote de diferenças e devem ser reconhecidas e respeitadas. E devemos exigir isso. Como devemos fazer a nossa parte: o tratamento. TDAH não é muleta para continuarmos fazendo o que queremos. Não, é um transtorno tratável; e por amor e respeito a nós mesmos e aos que nos amam e convivem conosco, devemos tratá-lo.  
TDAH sem tratamento, em geral, quer salvo conduto para agir impunemente.  


sábado, 12 de agosto de 2017

O TDAH E A INSEGURANÇA MENTAL CRIATIVA



Oliviero Toscani, genial fotógrafo italiano revolucionou a publicidade mundial nas décadas de 1980/1990/2000, ao criar campanhas chocantes, instigantes e sensacionais. Toscani fotografou beijos entre negros e brancos, entre dois homens, duas mulheres, padre e freira; além de aidéticos terminais ao lado da família desesperada e vítimas das sangrentas guerras civis africanas. Se hoje muitas dessas fotos ainda provocam reações contrárias, que dirá há vinte e cinco anos. As campanhas de Toscani transformaram a marca de roupas Benetton em uma das cinco mais famosas do mundo, na época. Incansável, há cerca de sete anos criou uma campanha anti anorexia, em que fotos de mulheres anoréxicas nuas estavam em outdoors e revistas de toda a Itália,  e com isso,catapultou uma pequena empresa da região de Vêneto à fama mundial em poucos dias.
Mas isso é apenas uma introdução ao que ele disse; instigado pelo entrevistador, Toscani fala sobre criatividade e talento. Ao contrário do que se imagina, ele diz que talento nada tem a ver com ter ideias, o talento é intrínseco; a pessoa sente e faz. Não importa a crítica, a receptividade ou o sucesso; a manifestação é o mais importante.
Ainda segundo Toscani, a insegurança fomenta a criatividade; a segurança, o conforto, a estabilidade, ao contrário, é a geradora da mediocridade. E cita como exemplo as agências de publicidade, que segundo ele, são o paraíso da mediocridade e da falta de talento.
E daí? Daí tudo! Não seriamos criativos por que somos TDAH, mas por que o TDAH nos deixa mentalmente inseguros e instáveis, e nos propicia a incessante e quase inconsciente busca de novos caminhos, novas soluções, novas alternativas.
Seria o caos de nossas vidas o incubador de nossas mentes absurdamente irrequietas? Segundo esse gênio da fotografia sim. E faz sentido... No Brasil, nossa melhor música, nosso melhor teatro, nosso cinema mais revolucionário, surgiram no auge da ditadura. Tínhamos um monstro a combater, um medo a enfrentar, um futuro incerto a descortinar, um mundo desconhecido a desbravar...
E nós TDAHs? Temos a inquietude de uma mente que não para; temos a inconstância de sentimentos que nos assola; temos a impulsividade que nos impede de nos conformamos com nossos destinos...
A criatividade pode ser a válvula de escape dessa mente tortuosa, a fuga para mundos inexplorados, para soluções impensadas. Quem saberá?
Imagino nossa mente como um infindável redemoinho; pensamentos se misturam e se chocam, se sobrepõem e se complementam. Pulamos de um assunto a outro, de um tema a outro, sem nexo ou explicação. E de repente ela surge. Do meio daquele emaranhado de pensamentos surge uma ideia, uma inspiração... Mas, se não for anotada, esquematizada, salva de alguma maneira, instantaneamente, perder-se-á no redemoinho de pensamentos que não para de girar... E quantas vezes, inocentemente, não anotamos de imediato, confiantes de que nos lembraremos de algo tão impactante e genial? Qual nada, em poucas horas a ideia genial terá submergido no caótico redemoinho de pensamentos da mente TDAH.
Os não portadores imaginarão o desespero que ficaremos ao esquecermos de tão importante ideia. Claro, se nos lembrarmos do que pensamos podemos nos torturar, mas em geral ficamos com aquela sensação de havermos tido a grande sacada; mas uma névoa a encobriu e toldou; como um aroma que nos faz lembrar algo de que não sabemos ao certo do que se trata...
E o TDAH anestesia nossa culpa; afinal, essa ideia é apenas mais uma no armário repleto de esqueletos mentais que armazenamos em nossas existência.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

TDAH: ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA





Uma leitora me pediu algumas dicas de estratégias de boa convivência com o marido TDAH.
É algo tão simples que não deu para respondê-la nos comentários, tive que fazer um post inteiro.
A primeira estratégia, e a que reputo como a mais importante, é o conhecimento!

CONHECIMENTO:
Conheça a fundo a doença do seu/sua parceiro(a). Se você conhece os sintomas do transtorno, saberá reconhecê-los quando se deparar com eles. Reconhecerá a procrastinação, a impulsividade, a desatenção, a falta de foco, a eterna insatisfação, a insegurança, a baixa auto estima...
Muitas brigas serão evitadas se você, não TDAH, passar a reconhecer nas atitudes de seu parceiro as manifestações de uma doença e não de seu mau caráter ou má índole. E o contrário também é verdadeiro, poderá flagrá-lo escondendo-se atrás do TDAH.

PACIÊNCIA:
Se um dos parceiros não é TDAH, é comum que ele se irrite com os sintomas mais agudos da outra parte, aquela que tem o TDAH.
A desatenção! Eu sou extremamente desatento. Talvez minha principal característica ao lado da procrastinação. Para quem não é desatento, o esquecimento das menores coisas, daquelas mais corriqueiras é irritante, eu reconheço. Esqueço constantemente de tomar a Ritalina, o remédio da memória. Por precaução coloquei um alarme no celular, mas aí atua a procrastinação; se estou fazendo algo quando soa o alarme, vou adiando-o infinitas vezes. Tão infinitas, que em alguns dias desisto de tomar pois o dia está findando e eu ainda não tomei. E desatenção não é apenas esquecimento; paguei a conta de água de Junho sem perceber que não havia pago a de Maio. Por pouco não fiquei sem água.
Haja paciência para aturar um marido/esposa assim. O ideal é que o cônjuge não TDAH assuma o controle dessas coisas práticas; contas, organização, funções executivas de maneira geral.

SILENCIAR:
Calar-se nos momentos de crise é outra estratégia interessante. Preste bem atenção, nos momentos agudos! Não estou pregando submissão! Nada disso! Mas o TDAH quando começa a discutir, brigar, não tem freios ou limites. Podemos agredir verbalmente da forma mais cruel ou agressiva imaginável. No calor da raiva dizemos o que não queremos ou não sentimos, só pela necessidade de vencer aquela briga. A melhor estratégia é deixar a fervura baixar e depois, em outro momento, abordar o assunto de maneira diferente, com calma... Em geral aceitamos as ponderações posteriormente.

ESPERAR:
Somos impulsivos, empolgados, vulcânicos! É comum demais na empolgação do momento fazermos propostas, sugerirmos ações, nos oferecer para ajudar, assumir responsabilidades... Coisas que nos arrependeremos (ou esqueceremos) horas depois. Já aceitei ser subsíndico do meu condomínio e me arrependi em menos de 24 horas. Calcei a cara e pedi demissão. Portanto, espere! Não acredite ou empolgue-se junto com seu TDAH. Se nos dias seguintes a proposta ainda estiver de pé, acredite.

APOIAR:
Não importa se temos sucesso ou não na vida, temos um forte sentimento de inferioridade e uma insatisfação interna que jamais termina. Nem a Mega-Sena, o prêmio Nobel ou o Oscar aplacam esses sentimentos. Os TDAHs de sucesso costumam se auto intitular como FRAUDES. Não é com você ou com sua família, é interno. Essa insatisfação nos faz buscar novos empregos, novos cursos, novos caminhos, ainda que estejamos bem na posição atual. Somente o auto conhecimento e o tratamento, podem amenizar esses sentimentos.

AMOR:
Muito amor! Sem a interferência do TDAH relacionamentos afetivos já não são simples, imagina com ele.

AMOR PRÓPRIO:
Se seu cônjuge tem TDAH e não quer tratar-se, não quer conhecer-se ou vangloria-se de ter o transtorno, use seu amor próprio e ponha-o contra a parede. Sem tratamento, sem relacionamento!Simples assim. Ninguém é obrigado a saber que tem TDAH; sabendo, ninguém é obrigado a tratar-se; da mesma forma, ninguém é obrigado a conviver com um TDAH que se recusa a tratar-se.

Claro que essas são dicas superficiais e genéricas, mas funcionam. Experimente aplica-las e verá!