sexta-feira, 27 de maio de 2011

A FALTA QUE ELA ME FAZ.




Aos cinquenta anos me descobri portador de TDAH.
Seis meses após o diagnóstico, premido pela falta de dinheiro, resolvi mudar de vida; apostei tudo em uma nova profissão. Fui estudar e após muito esforço e dedicação habilitei-me em técnico em manutenção de celulares e câmeras digitais.
Segundo as palavras de meu pai, que transcrevo literalmente:
‘ Alexandre, eu jamais imaginei que um dia eu fosse  ver você fazendo um trabalho desses.’
Confesso que nem eu. Jamais em minha vida cogitei trabalhar em algo que exigisse tanta atenção, tanta paciência, tanta concentração.
Ontem foi um dia muito significativo. Graças a Deus, tenho tido muito serviço, mas muito mesmo, passo o dia inteiro no meu laboratório trabalhando. Ontem, depois do almoço, peguei um trabalho particularmente complexo, e o pior, o meu tempo para entregá-lo se esgotava em poucas horas. Apesar de me considerar um bom profissional, ainda sou lento; em virtude de minha menor experiência penso mais, consulto mais. Bem, mergulhei no Nokia N73. Desmontei-o completamente, troquei o que precisava e remontei-o. No finalzinho, até com alguma folga no tempo, eu notei que ‘sobravam’ algumas peças. Todos aqueles botõezinhos laterais de som, câmera, power, eu havia esquecido de colocar no lugar. Na hora me veio à cabeça os 3259 testes de TDAH a que me submeti nos últimos tempos: NÃO PRESTA ATENÇÃO AOS DETALHES. Uma raiva enorme tomou conta de mim. Levantei-me e notei algumas coisas bagunçadas no laboratório, a raiva aumentou ainda mais. Comecei a juntar as coisas, a limpar meu espaço e a jogar coisas fora (com irritação) ; igualzinho ao meu comportamento antigo.
Soou o alarme. Três horas da tarde sem a segunda dose da Rita. Um enorme alívio tomou conta de mim; tem solução. Atirei-me aos braços da Rita, tomei a segunda dose, saí para tomar uma água voltei. Desmontei o aparelho inteiro, repus os contatos, remontei-o e entreguei ao cliente na hora combinada.
Pode ser até uma dependência psicológica, mas se for, meu pai (que jamais tinha ouvido falar em TDAH ou ritalina) também é dependente dela. Meu comportamento mudou, minha vida mudou e eu sinto os efeitos dela claramente em meu dia a dia. A concentração, a atenção às minúcias do meu trabalho, coisas absolutamente novas estão acontecendo.
Sei que às vezes soa chato, mas quem foi diagnosticado, não pare o tratamento. É um saco? É. A ritalina é uma droga? É. Mas nossa convivência com o TDAH é a pior das drogas, seu resultado em nossas vidas é desastroso. Nada é perfeito. Eu mesmo ainda procrastino, ainda me irrito com algumas coisas específicas, ainda carrego vários sintomas do ‘maldito’. Mas estou conseguindo reescrever minha vida. E estou adorando essa experiência.
A ritalina não faz milagres, mas ajuda muito, muito mesmo; somada a uma grande médica e ao coaching, faz milagres sim.
Cinquenta anos, falido e atordoado pelas porradas da vida, somente um milagre para retomar de cabeça erguida e por novos rumos.
Nunca estamos sozinhos, devo muito à minha mulher, minhas filhas, meus pais e irmãs que estiveram do meu lado quando do diagnóstico e do tratamento. Mas, sem ele eu não sei se daria conta de uma mudança tão radical e consciente.
Coragem, o resultado do TDAH é pior do que o esforço do tratamento.

domingo, 22 de maio de 2011

A MONTANHA RUSSA DO TRATAMENTO DO TDAH.



No princípio foi a perplexidade
Uma doença
Depois a revolta; por que tão tarde?
Por que não descobrir a tempo de mudar minha vida?
Depois a consciência de que ainda tenho muita vida a viver.
E a mudar.
E veio o tratamento.
E a esperança de que tudo mudaria como num passe de mágica.
E não mudou.
E veio a decepção, o desinteresse, a vontade de abandonar o tratamento.
A ritalina não resolve, não sinto seus efeitos.
Por fim, comecei a ter consciência de que a mudança é um processo.
Um passo após o outro.
O exercício da paciência.
O fino véu que me cobria a vida começa aos poucos a desaparecer.
Mudanças de perspectiva, de padrão mental.
Os frutos da persistência começam a ser colhidos.
Mas tenho a certeza de que a vigilância deve ser permanente.
Carrego dentro de mim o inimigo; ele hiberna, mas não está morto.
Apenas aguarda que eu baixe a guarda para atacar de novo.
( Por falar nisso, hora da ritalina.rs)
Paciência, motivação, vigilância.
Isso resulta em auto estima, amor próprio, vontade de viver melhor.
Como todo tratamento é chato, cansativo, enjoado, mas os efeitos do TDAH
são muito piores, são cruéis e dolorosos.
Eu não quero mais senti-los.
Eu quero viver.

terça-feira, 17 de maio de 2011

UM CASO VERÍDICO DE AUTO SABOTAGEM.


Com um mês de tratamento eu já estava decepcionado com os resultados e disposto a abandonar a ritalina. Nada mais TDAH. Ao longo da vida nos sabotamos inventando mil desculpas para deixar de fazer aquilo que nos beneficiará a longo prazo.Graças à Valéria e à Luciana ( minhas duas 'anjas') me mantive no tratamento e hoje colho os resultados.
Nos últimos dias tenho percebido uma mudança grande em meu comportamento mental, aos poucos os pensamentos derrotistas vão abandonando minha vida. A eterna sensação de que tudo vai dar errado, de que sou um completo incompetente, de que vai ser um fracasso como em todas as outras vezes, desmanchou-se aos poucos de maneira quase imperceptível.  Venho observando extasiado  essa mudança: acredito mais em mim, nas minhas possibilidades, nas minhas iniciativas.
Ontem, um fato me chamou a atenção e inspirou este post: uma pessoa querida abandonou o tratamento completamente. Vi em seu comportamento a atitude de auto sabotagem que tanto caracteriza nossas atitudes, um comportamento falsamente racional, inveridicamente lógico. Um autêntico lobo disfarçado de cordeiro. Uma pessoa inteligente, instruída, se enganar dessa forma; abandonou seu blog por completo chamando-o de chato e sem motivação para continuá-lo; abandonou a ritalina alegando insônia. Só toma o medicamento de vez em quando.
Honestamente, fiquei com pena, muita pena. Mas desde o princípio seu comportamento foi tipicamente TDAH. Quando foi diagnosticada ficou obcecada. Esse era seu único assunto. Sua vida passou a girar em torno disso. Depois cansou, abandonou tudo e, aos poucos, retoma os comportamentos anteriores, sem perceber, sem se dar conta de que está em pleno processo de auto sabotagem. E aí entram as diferenças de tratamento; não é possível, ou é muito difícil vencer o TDAH sozinho. Apenas a ritalina é insuficiente. O coach é fundamental, uma forma de suporte, de manter o paciente ancorado na realidade, uma maneira de desmascarar os comportamentos típicos do TDAH e que se escondem nos subterrâneos de nossa mente. Esses comportamentos se travestem de lógicos, racionais e equilibrados e seguem minando nossa vida de forma sistemática e implacável. Enfrentar um inimigo dissimulado, e no caso do adulto, fortemente arraigado em nossa alma exige um pequeno exército, uma tática apurada e muita obstinação, muita vontade de mudar de vida.
Ontem, depois de encontrá-la fiquei pensando em minha vida, em meu comportamento. Como mudei, como sou mais otimista, mais positivo, mais confiante. Tenho enfrentado novos desafios aos cinquenta anos com uma coragem que nem eu sabia que tinha. Outrora meus primeiros passos em qualquer área, eram precedidos pelo medo do fracasso, ou melhor, pela desconfiança de que o fracasso me pegaria logo adiante, afinal, comigo nada dava certo, tudo era mais difícil e complicado. Graças ao meu pequeno, bravo e eficiente exército formado por Jesus (o Cristo), minha Fiel e competentíssima coach Luciana, por minha Modesta, Leal e excelente médica Valéria, pela Rita ( a Lina) e por mim, vamos vencendo esse inimigo sorrateiro, dissimulado e incansável. Basta um cochilo para ele se reerguer e tornar a atacar.
Por isso, se a Rita(Lina) te der insônia, aproveite para ler um bom livro, escrever um blog, assistir a um bom filme. Os desatinos do TDAH causam muito mais estrago e insônia do que os efeitos colateirais da Rita.
Não se entregue, trate-se.

sábado, 14 de maio de 2011

LEMBRANÇAS HIPERATIVAS.




Vi uma cena hoje que me levou de volta à minha doce infância.
Uma criança - que pela distância não consegui definir se era menino ou menina - se debatia e urrava no colo de uma pobre mãe desesperada. Próximas a mim duas senhoras estavam penalizadas com o choro da criança. Na mesma hora pensei na injustiça da cena; uma pobre mãe em luta com uma criança feroz e ainda por cima é criticada.
Lembrei-me de certa vez em que fui a um parque de diversões. Estamos falando da década de sessenta, um parque de diversão era uma raridade, um paraíso para um menino endiabrado. Eu entrei no carrinho de batidas e não queria sair, nem mesmo depois de parado; quando vi que não poderia continuar ali saí correndo em direção a outro brinquedo. Assim fiz algumas vezes, até que chegou a hora de ir embora. E não concordei com aquela decisão familiar. Me recusei terminantemente a sair; agarrei-me às grades de um brinquedo qualquer e fiz um escândalo digno de uma criança maltratada. Meus pais tiveram de me arrancar à força do parque, um segurava nos braços, o outro nas pernas. Eu me debatia e gritava meu protesto aos quatro cantos do universo.
Ao recordar-me dessa doce cena, recordo-me também das últimas palavras daquela música sobre as mães, aquela que cantávamos invariavelmente no dia das mães e que falava do seu avental todo sujo de ovo, terminava assim: se eu pudesse eu queria outra vez, mamãe, começar tudo, tudo de novo. Coitada da minha mãe! Eu jamais desejaria isso pra ela de novo. Essas cenas eram bastante comuns. Eu não aceitava ser contrariado, a brincadeira não podia ter fim. Sair da piscina ou do mar era uma luta, eu já estava com os lábios roxos, a pele enrugada, mas não saía. Meu pai conta um caso que eu, aos três anos, queria ficar passeando pelo corredor de um ônibus a caminho de Belo Horizonte. Claro que meus pais não deixaram, e eu fiz uma cena daquelas, chutava minha mãe, mordia... Por fim, meu pai perdeu a paciência e me deu uns catiripapos e eu, acalmei.
Imagine se quero isso para meus pais de novo. E, sinceramente, nem sei se pra mim era bom. Deveria ser um inferno interior a cada não que eu recebia, a cada contrariedade. Não me lembro, mas deveria ser uma tortura para mim não poder fazer o que eu queria.
Por isso hoje, fiquei com pena daquela mãe. Provavelmente ela não conhece a hiperatividade, nem os tratamentos possíveis. Talvez a escola nunca a tenha alertado, o governo não faz sua parte e ela e seu filho, provavelmente, carregarão esse fardo pelo resto de suas vidas.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

O TDAH E A DIVISÃO DO TEMPO.

             

Como dividir o dia?
Pelo menos doze horas dedicadas ao trabalho. Sim, essa é a realidade de um micro empresário brasileiro. Uma média de seis horas de sono. Me sobram outras seis horas para tocar meu sax, escrever meu blog, saber as últimas do Botafogo, assistir House, Law and Order e CSI e o principal: conviver com minha família e as pessoas que gosto. Ler? Minha grande paixão está quase paralisada.
Toco sax uma ou duas vezes por semana, há muito não aprendo uma nova música. Meus vizinhos já devem estar de saco cheio de ouvir sempre o mesmo repertório.
O blog vocês são testemunhas; nunca esteve tão abandonado. Jamais passei tanto tempo sem postar nada ou ler alguma coisa nos blogs que sigo.
Ainda não aprendi a dividir o tempo decentemente. Conheço pessoas que fazem mil coisas em um único dia. Fico imaginando se elas não tem contratempos, se nada surge em suas vidas que as obrigue a mudar de rumo...
Hoje por exemplo, depois de fechar a loja tive que ir buscar uma mercadoria em um fornecedor, só cheguei em casa quase às 21 hs. Não sobrou tempo para mais nada. Um lanche, o notebook, uma rápida passada d'olhos sobre as notícias de hoje ( principalmente sobre o Botafogo) e fiquei entre uma pesquisa sobre um problema surgido em um smart fone e escrever um post no meu blog. Depois de 12 horas de trabalho, optei pelo blog. Mas o sax, foi para o beleléu. Essa é antiga, hein!
Pois bem, se você é uma dessas pessoas que sabe dividir o dia com maestria, deixe aqui suas dicas. Não quero deixar o blog, o sax, os livros, minha TV, as pessoas de quem gosto e não posso deixar o trabalho. Aceito todas as contribuições.

PS.: estou escrevendo este post diante da TV ligada no canal VIVA. Para quem não conhece é um canal que reproduz a programação antiga da Globo, antiga mesmo. Neste momento está passando CHICO & CAETANO, com as participações de Astor Piazzola e o mestre Tom Jobim. Um tempo em que no Brasil as duplas musicais tinham cérebro e não afrontavam nossa inteligência com letras medíocres e nossos ouvidos com aquele grasnado insuportável das duplas de hoje.
O programa é tão bom, mas tão bom, que o cansaço sumiu e me sinto capaz de passar a noite em claro assistindo esses gênios da MPB cantando.
Vaca Profana, Eu sei que vou te amar, Eu te amo, Anos Dourados,Sabiá, Coração Vagabundo, não há sono ou cansaço que resista.
Que Brasil era aquele em que a Globo exibia um programa desse porte...
Águas de Março...
Este é o dilema: 23 horas, preciso dormir mas tem tanta vida para ser vivida. Como deitar e dormir deixando tanta música, tanta literatura, tanto sentimento. É preciso dormir, recobrar as energias para o dia que se avizinha.
Mas e a vida?

segunda-feira, 9 de maio de 2011

ESTOU DE PÉ.



Estou de pé.
Quando todas as portas pareciam fechadas, uma se abriu.
Uma porta de aparência frágil, pequenina, mas por ela entrei com todas as minhas esperanças.
Atrás dela estava toda uma vida nova.
Uma nova profissão, um novo rumo, novas sensações.
De volta o frio na barriga, a ansiedade pela estréia, o prazer do primeiro cliente.
Na quinta feira, às 17 horas, nasceu a MAXXTEL.
Por inspiração, sugestão, visão e articulação da Jaque, começo uma vida completamente diferente.
Uma vida que jamais havia sonhado.
Pra ela tive de me preparar, fazer cursos, estudar, e assumir uma postura completamente diferente.
Aí entra o tratamento do TDAH. Fiz cursos e me preparei para técnico em celulares e câmeras digitais.
Jamais imaginei ter tamanha paciência. Fazer e refazer infinitas vezes o mesmo trabalho sem me irritar ou atirar longe o aparelho. Conviver com a frustração de não conseguir solucionar o problema e reiniciar quantas vezes forem necessárias até descobri-lo. Aprender a organizar meu espaço, meu trabalho, minha vida, sem todos aqueles funcionários que faziam isso por mim.
Claro, existem falhas, momentos de irritação, momentos de atropelos, mas existe hoje meu auto conhecimento, o conhecimento do TDAH e tudo o que o acompanha, por isso, quando o reconheço volto atrás e refaço de forma diferente.
Hoje, estou de pé.
Reergui-me exatamente um ano depois.
Uma caminhada a passos curtos, porém firmes, com sonhos modestos, porém concretizáveis.
Estou de pé, e não estou sozinho. Ao meu lado sei que caminham a Luciana Fiel e a Valéria Modesto. Ambas me dão as ferramentas para seguir em frente de uma forma diferente.
Estou de pé, e com uma companhia que há muito eu havia abandonado, mas que a maioria de nós procura nos momentos difíceis, e comigo não foi diferente: DEUS.
Estou de pé, e neste momento de recomeço ainda não caminho sem apoio e esse apoio nunca me faltou: a Jaqueline. Graças à sua visão, à sua sagacidade, à sua tenacidade, ao seu empenho hoje posso comemorar o princípio de nossa nova vida.
Estou de pé e graças a cada uma das pessoas que me abastecem de carinho, amor e forças, retomo minha vida. Minha família, meus amigos e minhas amigas, aos leitores deste blog, meu agradecimento. A esse blog que durante tanto tempo me serviu de estímulo e fonte de forças e coragem meu agradecimento.
Iniciarei uma nova fase desse blog, o testemunho de todo o meu empenho em meu tratamento de volta às pressões diárias de uma pequena empresa no Brasil.
Na última quinta feira, 05 de maio, nasceu a MAXXTEL Celulares. Obrigado a cada um de vocês que não me deixaram desanimar e me conformar com a queda.
Ao infinito, e além!!!!