Ao longe um som de flauta embala meus pensamentos - Travessia. Sim, a flauta toca Travessia de Milton Nascimento.
A música icônica tão bem tocada me invade a alma e a tristeza de lembranças irremediavelmente perdidas me enche a mente.
Um desfile desconexo de pessoas e situações, sentimentos e decisões, escolhas e perdas. Principalmente as perdas dançam diante de mim. Quanta gente pelo caminho, quantas oportunidades negligenciadas, quantos momentos preciosos ignorados, quanta vida desperdiçada...
O que resta? Nada. Absolutamente nada. A música mudou, já não toca mais Travessia ao longe, com a nova música a nostalgia se apaga. O pálido baile do passado se desvanece diante da curiosidade de descobrir qual era a nova música que o flautista interpretava. Uma música rápida, muito rápida. Conheço, pensei... Conheço... Caetano! Claro que é Caetano... Pena de pavão de Krishna, maravilha, vixe, Maria... É isso!! Trilhos Urbanos em um ritmo mais forte. Caetano! Uma enorme satisfação tomou conta de mim. Adoro Caetano e essa música. Parei para prestar atenção. Toca pra caramba, pensei. Quem será? De repente, como começou, parou. Fiquei com uma sensação de incompletude... Corri pro YouTube e coloquei o próprio Caetano pra interpretar pra mim. Caetano é um gênio, um ícone. Estou aqui acompanhando suas músicas com extrema satisfação. Uma verdadeira playlist de Caetano desfila no YouTube para meu deleite: Trilhos Urbanos, Reconvexo, Vaca Profana... Do nada veio-me a lembrança de que há quinze ou vinte minutos um desfile macabro de dores pretéritas me tomou os pensamentos e jogou-me num poço de dor e culpa. Mudou a trilha sonora mudou o humor. Transtorno Bipolar? Transtorno de Humor? TDAH! Lembrei-me nitidamente de explicar aos meus funcionários - nos tempos idos de empresário - Preciso que me lembrem das coisas. Converso alguma coisa com você, o telefone toca, chega um cliente... Aquilo que conversamos apagou-se sob camadas de novas demandas. E é isso: ações, experiências, sentimentos, vão sendo soterrados por novas situações, novas experiências, novas demandas, novas atenções... E a vida passa... Aquilo que em determinado momento parecia importante ou significativo apaga-se. Simplesmente apaga-se. Chegaram a me taxar de superficial. Não, não é isso, é Déficit de Atenção. Uma atenção que flutua ao sabor de circunstâncias absolutamente aleatórias, mas que se transformam em prioridade numa fração de segundo que, claro, será substituída por outra prioridade, e por outra, e por outra...
Só quem não vive o TDAH pode taxar-nos de qualquer coisa. Aquele sentimento de meia hora atrás era verdadeiro, e ainda é, mas uma nova realidade se sobrepôs àquela anterior e a sobrepujou. Me lembrei das camadas geológicas da terra. Se eu as revolver devo encontrar situações e sentimentos completamente esquecidos e que podem me surpreender verdadeiramente.
Sigamos em frente: ao infinito e além!
Como dizia um velhíssimo samba: deixe que digam, que pensem, que falem...