sexta-feira, 30 de março de 2012

O TDAH E O MEDO DE DECEPCIONAR



Em seu comentário sobre meu post anterior, minha web amiga Regina, menciona que prefere se retrair pois sabe que, mais dia menos dia, irá decepcionar as pessoas que convivem com ela. E quanto maior a expectativa das pessoas em relação a ela, maior a decepção que, certamente, causará.
Bingo!
É exatamente isso, quando será; a decepção, de que forma se dará? Isso não sabemos, mas que ela virá, virá.
Creio que são tantas as quedas, tantas as frustrações acumuladas ao longo da vida que, internamente, temos a certeza de que não conseguiremos, em qualquer campo, em qualquer área, com qualquer pessoa. Não sei se isso é possível, mas imagino que temos tamanha certeza de que falharemos, que falhamos. E acabamos cumprindo a expectativa que tínhamos em relação a nós mesmos e muitas vezes cumprimos a expectativa das pessoas que nos cercam, aquelas próximas que nos conhecem bem o bastante pra dizer: eu sabia! Eu tinha certeza!
Insegurança, medo, inferioridade, auto sabotagem? Uma soma de tudo isso?
A sucessão de derrotas constroem o derrotado profissional.
Mesmo nos melhores momentos, naqueles em que beiramos o êxtase, sempre tem um certo frio na barriga, um certo receio de que vai dar errado.
Lembrei-me de um filme que adoro: Blade Runner. Nele, num futuro distante, uma mega empresa criava androides em tudo semelhante aos seres humanos,só que, ao nascer eles já sabiam a data de sua morte. Imagine se você soubesse que morreria aos quarenta anos. Qual o sentimento experimentado no aniversário de trinta e nove anos? Os últimos doze meses de vida...
A tônica do filme é a revolta de um grupo de androides contra a empresa, pelo fim daquela vida com data de validade.
Claro, são coisas incomparáveis, mas lembrei -me do filme ao recordar-me desse sentimento de que o desastre é inevitável e iminente e que não há nada que possa impedi-lo de acontecer.
Mas como no filme, também podemos nos revoltar, podemos não concordar com esse sentimento que teima em se concretizar em nossas vidas. Nossa revolta é o tratamento, nossa arma é auto conhecimento, o conhecimento do TDAH e a eterna vigilância. Muitas vezes não conseguiremos impedir o sentimento de que falharemos mais adiante, mas poderemos reconhecer nesse sentimento nosso auto sabotador, poderemos reconhecer que o caminho pelo qual optamos já nos levou à derrocada em momentos anteriores, e corrigir o rumo.
Sei que é muito fácil falar em corrigir o rumo. Sei tanto quanto todos os que me lêem, que não é nada simples corrigir o rumo da caminhada em direção ao fracasso. A tragédia exerce um fascínio sobre nossas personalidades. Antever o desfecho, ao contrário de frear nosso ímpeto pode resultar num efeito oposto, a aceleração da velocidade rumo ao desastre.
Em muitos momentos ficamos tal e qual o pequeno animal que se depara com a serpente gigante que o escolheu como refeição; absolutamente fascinados e paralisados diante do algoz.
Mas precisamos lutar, precisamos dizer não. Hoje temos a plena consciência de que o fascínio, a atração pela tragédia nada mais é do que uma das milhares de facetas do TDAH.
Esse transtorno tem livre trânsito em nossas mentes quando não os conhecemos, a partir do momento em que nos tratamos estamos esperando seus comportamentos sórdidos, esquivos e destrutivos.
E podermos agir em nosso benefício é ainda mais fascinante do que qualquer tragédia.

sábado, 24 de março de 2012

O TDAH E A FASCINANTE VIAGEM DA VIDA.



Viver, essa é a grande missão de nossas vidas.
Viver bem, esse o nosso grande sonho de vida.
Mas viver é muito mais do que isso.
Viver é sonho e realidade, luz e sombra, amor e ódio, vida e morte.
Onde entramos nisso?
Entramos no sonho, na sombra, no amor e na morte.
Sonhamos acordados, vagamos pelas sombras de nossas mentes, amamos com a força vulcânica de nossas almas e morremos diariamente diante de nossos fracassos em sermos 'normais'.
A vida é um caleidoscópio, cabe a nós encontrarmos nossa pequena faceta nesse universo de cores infinito que nos cerca.
Nos mortificamos diante da impossibilidade de sermos como nossos pais, amigos, professores. Mas estamos aí, ocupamos nossos espaços, temos uma mente fervilhante de ideias e sentimentos. Somos ímpares, únicos, desgarrados, isso tem o seu valor. Pare e pense: os medianos carregam o piano para que os diferenciados o toquem.
Paremos de tentar sermos iguais à manada e assumamos nossas diferenças.
Viver é fascinante e nós somos responsáveis pelos nossos passos, por sua intensidade e por sua direção.
Não tema ser diferente; opte por ser diferente, são coisas completamente diferentes. Mas só faça o que for capaz de arcar e conviver.
Quando criança quase todos sonhamos em sermos médicos. pouquíssimos conseguem. Hoje eu vejo que seria um péssimo médico. Um péssimo advogado. Um péssimo matemático. Mas creio que seria um brilhante professor de história; um excelente publicitário e um ótimo livreiro.
Só nós conhecemos nossas mentes, nossos turbilhões mentais, nossas efervescências emocionais, nossas instabilidades de humor. De nada nos vale pautarmos nossas vidas pela vida de nossos pais ou modelos. Precisamos de interesse pelo objeto, pessoa, profissão, matéria, instrumento, enfim, precisamos gostar, nos interessar por aquilo que fazemos. Precisamos experimentar a vida, as possibilidades da vida, a riqueza de opções da vida. Pais de TDAH uni-vos contra a estandardização da vida dos portadores.

                                                         
Não somos unos, somos plurais. Não somos retas, somos sinuosidades. Não somos mono, somos estéreos.
Não somos planos, somos 3D. Não somos as certezas, somos as possibilidades. Não somos o preto no branco, somos o amarelo no azul. Não somos pedra sobre pedra, somos conchas na areia. Não somos flores, somos os perfumes. Não somos a dureza do concreto, somos a curva do vento. Não somos os cinzentos edifícios erguidos pelos engenheiros, somos as esguias torres de Gaudí e as curvas sensuais de Niemeyer. Não somos a estrada, somos o prazer de percorrê-la.

 Em algum lugar nessa fascinante viagem  existe um espaço reservado para nós. Não podemos aceitar calados a imposição da camisa de força que os 'normais' querem nos impor.
Um dia, Galileu foi um louco, a TV um sonho desvairado, a internet algo inimaginável. Algum louco acreditou nas possibilidades e entregou-se apaixonadamente para que elas existissem.
TDAH, não se curve, não se intimide; no fundo de sua alma está seu caminho, sua felicidade.
Imagine um mundo feito apenas de médicos...

quinta-feira, 22 de março de 2012

O TDAH E A ESPERA





EU ODEIO ESPERAR!!!!!!!!!!!!
Qualquer coisa em qualquer lugar.
Estou sem carro e ainda ficarei por alguns dias. No primeiro dia a pé, fui pro ponto de ônibus e fiquei esperando tranquilamente o ônibus de número indicado para minha rota. Ainda não eram sete horas da manhã. Passou um, passou mais um e outro e ainda, mais outro...
Lá pelas tantas perdi a paciência e peguei o primeiro que descia rumo ao centro da cidade. Lotado! Lento e cheio de voltas, subia e descia serpenteando o bairro, na metade do caminho dei sinal e desci. Não aguentava aquele rame, rame sem fim. Foi minha estréia no coletivo  e péssima por sinal. Decidi assim radicalizar. Desço à pé. São cerca de cinco ou seis quilômetros que percorro em uma hora. Vou ouvindo música, cantarolando e devaneando pelas manhãs agradáveis dessa época do ano em Juiz de Fora.
A volta é bem mais complicada. Depois de doze horas de trabalho,esperar um ônibus por trinta ou quarenta minutos ninguém merece. Subir a pé? Difícil. O trecho é quase todo em subida e uma boa parte dele em uma área erma e escura. Portanto, ônibus ou táxi. Não consigo ficar esperando o ônibus. Me dá nos nervos. Pra economizar subo a pé a metade do caminho e, só então pego o táxi. Ontem foi engraçado. Eu precisava de comprar ração pra cadela e um remédio pra Marina. Fui pra um supermercado, lotado. Já tinha pego a ração quando me detive para repara as filas. Abandonei a ração e fui embora. Compro a ração em outro lugar, pensei. Fui direto pra farmácia, estava às moscas. Uma farmácia enorme com apenas umas cinco pessoas comprando. Só havia uma atendente, esperei - de verdade- pacientemente. Depois do senhor decidir qual remédio comprar, chegou minha vez. Fui rapidamente atendido e dirigi-me ao caixa. Aí a porca torceu o rabo. Tinham apenas duas pessoas na minha frente, dois homens, o primeiro já estava no caixa acompanhado da esposa e de um bebê pequeníssimo.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            A adorável senhora conversava com a criança em tati bitate ensinando-a a gastar todo o dinheiro do pai pra que não sobrasse nada que o pobre pudesse empregar em tomar cerveja.Sério mesmo, era exatamente isso que a mamãe ensinava à filhinha de um ou dois meses.
Aí a moçoila do caixa anunciou: Fulano, chama alguém pra vir aqui que o caixa travou. Minh'alma transbordou de alegria. As pessoas conversavam tranquilamente enquanto o fulano não surgia. Eu assoviava baixinho tentando afastar a irritação. Andava daqui pra li e voltava quando avistei a lata de lixo. Era cinza, de plástico, grande: pelo menos uns oitenta centímetros de altura. Uma enorme vontade de meter o bico naquela lixeira se apossou de mim. Não era uma explosão de raiva, não mesmo. Era uma forma de protesto; imaginei a lixeira rolando pela drogaria, papéis e embalagens espalhados pelo chão, as pessoas perplexas, estupefatas, boquiabertas alternavam o olhar entre a lixeira rolando e aquele sujeito insano que a chutara. A simples imaginação da cena fez-me rir e dissipou a irritação que nascia em mim.
Quase que concomitantemente um sujeito saiu lá do fundo da drogaria numa velocidade que me lembrou o andar de uma tartaruga manca. Tranquilo, sem pressa, sem a menor preocupação com as pessoas na fila. De longe, uns 3 ou quatro metros antes do caixa ele gritou: é 668? A moça do caixa respondeu: não, o cupom travou. Ele parou imediatamente, girou sobre os calcanhares e resmungou: então é com a mcdmfhc. O nome da pessoa que deveria solucionar o problema saiu mascado, comido e baixo. Para minha surpresa a pessoa de nome impronunciável era a farmacêutica da drogaria que estava por ali o tempo todo. Chamaram-na, em menos de um  minuto ela chegou, passou seu crachá e cancelou o cupom que foi prontamente refeito.
Quando eu vi que a solução estava zanzando por ali o tempo todo, imaginei que o chute na lixeira tinha um endereço: a cabeça da farmacêutica. Imaginei aquelas cenas de desenho animado, a farmacêutica com a lixeira na cabeça até a cintura, andando sem rumo , batendo nas prateleiras...
Chegou minha vez.
Saí da farmácia e fui pro supermercado, ali foi rápido, tranquilo, light.
Do supermercado pro ponto de ônibus, ali, nova tortura. Cinco, dez, quinze, vinte minutos e nada do ônibus.
Decidi atravessar a avenida e pegar um táxi, não ia ficar ali igual a um dois de paus esperando esses ônibus que não chegam nunca. Decidido e cumprido, desci a rua, atravessei a avenida, andei mais alguns metros e com quem cruzei? Claro, com o ônibus que eu esperava há vinte minutos. Olhei pra trás e concluí que não havia chance de voltar e alcançá-lo no ponto anterior.. Fiquei com uma cara de idiota olhando ele afastar-se enquanto só me restava gastar uns onze reais a mais e subir de táxi.
Já na subida comecei a imaginar esse post. É muita intolerância à espera. Detesto ficar parado esperando algo, me irrita, me deixa tenso e começo a imaginar formas de vingança contra o autor da espera.
Por isso decidi descer a pé. Uma hora de caminhada diária além de fazer bem à minha saúde, impede que eu me irrite desnecessariamente.

quarta-feira, 14 de março de 2012

TDAH- UMA ESPONJA EMOCIONAL

                   



Daria um bom filme; claro que um filme de Godard, Bergman ou Woody Allen. Aqueles filmes meio 'noir', em tons de cinza com a atmosfera até meio depressiva.
Acompanhe o roteiro:
a personagem principal é uma pessoa que, por onde passa, tem o poder de absorver o clima dos ambientes que frequenta.
Altíssimo poder de absorção emocional.
Essa capacidade é mais aguçada na tristeza do que na alegria.
Nosso herói - ou heroína - se multiplica, se desdobra, renasce a cada mudança favorável de ambiente ou de companhia.
Imagine uma flor que murcha e viceja várias vezes por dia.
Eu sou assim e custei milênios para descobrir. Em geral o mau humor alheio afeta-me mais do que o bom humor.
Há muito pouco tempo descobri isso, quantas vezes me sinto melancólico, triste, sem lugar e um simples mudar de ambiente muda meu humor. Isso aconteceu há menos de duas semanas. A Jaque tava meio deprê, meio chateada, e eu entrei no clima. Após o almoço ela decidiu ir para casa e meu humor mudou completamente. O problema é que somente após a melhora do humor é que reconheci essa característica da minha personalidade. Precisei curtir toda a tristeza antes de abrir os olhos.
Um efeito sanfona emocional, apenas mais uma característica que contribui para que nosso dia a dia ser mais pesado e complexo.
Mais uma vez o auto conhecimento e o conhecimento do TDAH são fundamentais, manter-se vigilante evita que caiamos na armadilha do transtorno.
Esse post originou-se, mais uma vez, de um comentário anônimo.
Peço que comentem, comentem anonimamente, os comentários são um manancial de inspiração para novos posts.

domingo, 11 de março de 2012

O TDAH E A VERDADE.





O que é a verdade?
Sei lá.
De verdade?
Hoje existem fatos que não sei ao certo se existiram, se os vivi, ou se são apenas sonhos ou criações fantasiosas de uma usina infindável de sentimentos, sensações e memórias.
Repeti tantas vezes as mesmas histórias que hoje acredito nelas.
Mas elas aconteceram?
Claro.
Que sim, ou que não?
Bem, aí já não sei responder.
Mas afinal, pouco importa.
Se vivi ou não, é problema meu. Se sinto, vivi. E ponto final.
Mas terei vivido?
Por que duvido de mim mesmo, de meus sentimentos, da minha história de vida?
Sei lá, ás vezes me bate uma dúvida danada.
Fico a recordar de fatos  e sentimentos e me pergunto: fulana existiu? ciclano fez, realmente, parte da minha vida?
Amei tanto assim?
Sofri isso tudo mesmo?
Como posso estar aqui hoje, escrevendo um blog, andando, vivendo?
Onde estão os pedaços de mim que ficaram pelo caminho?
Como e onde estarão as pessoas que um dia foram fundamentais em minha vida?
Como pude prescindir de seu convívio?
Ficaram pelo caminho. Um pouco de mim ficou ali, na sua memória, na sua vida.
Talvez eu esteja inteiro por que trouxe um pouco dessas pessoas também.
Mas como sobrevivi a essas perdas?
Estranho, muito estranho.
Como acreditar em tudo se uma parte da minha vida foi forjada de turbilhões de pensamentos,
sentimentos e sensações que não vivi?
Mas se senti, se criei, se imaginei, em algum momento eles existiram.
O pensamento é uma forma de realidade?
Se penso, existe?
Assim como o louco de ciúmes cria em sua mente traições e comportamentos que não existiram e
age baseado nesses pensamentos, eu - ou nós- quando 'viajamos' criamos uma realidade?
Não é apenas um pensamento, é uma sensação.
Quando procrastino, imagino o que deveria fazer, o desconforto que aquele fazer  vai me gerar e
crio em cima desse desconforto um motivo para não fazê-lo.
A ira que me sobe repentinamente, mesmo que eu consiga me controlar, afeta-me fisicamente. Minhas têmporas latejam, o coração pulsa na garganta, a boca seca. Ainda que eu me controle e a domine, essa raiva existiu e se manifestou em sensações.
Quando 'viajo' em pensamento, ele me gera sensações, sentimentos, quase concretos, quase palpáveis.
Se sinto, é por que vivi. Se vivi é verdade. Se é verdade, mesmo que não tenha existido, vivi, senti.
Existiu!
E ainda tem gente(?) que diz que o TDAH é invenção!

quinta-feira, 8 de março de 2012

TDAH, UMA BATALHA ENTRE ANJOS E DEMÔNIOS





Mais um post surgido dos comentários dos leitores do blog.
Em dois comentários diferentes, dois leitores me levaram a pensar no mesmo tema: o auto conhecimento.
Afinal de contas, o que é isso?
Isso serve pra alguma coisa?
Sempre relacionei auto conhecimento com um chinês de longas barbas, túnica branca e morador de uma erma gruta no interior da China. E sinceramente, nunca achei que isso tivesse qualquer utilidade prática.
Mas aí veio o diagnóstico de TDAH e eu descobri um sujeito que é meu xará, tem a minha cara e por enorme coincidência enfrenta os mesmos problemas que eu.
Eu me descobri. Passei a prestar atenção em mim, em minhas reações, em meus comportamentos e isso aos poucos vai esculpindo uma imagem de mim mesmo que eu não conhecia. Estou aprendendo a conhecer meus limites, a reconhecer minhas virtudes e a descobrir características de personalidade que eu desconhecia.
Quando você passa a conhecer-se melhor, você passa também a enxergar o TDAH agindo, você não se reconhece naquele comportamento, aquela forma de agir ou pensar é uma forma sabotadora, é um comportamento  externo.
Num desses comentários discutíamos a possibilidade de 'domar' o TDAH sem o medicamento e minha resposta foi exatamente essa: eu me conheço o bastante para saber que não tenho disciplina suficiente para tratar-me sem a ação do medicamento. Um leitor concordou comigo; são características fortes do TDAH  a indisciplina e a inconstância, exatamente o oposto do proposto pelo comentário que originou toda a discussão, nele a leitora afirma conseguir reconhecer os comportamentos do TDAH e neutralizá-los sem o apoio medicamentoso.
Esse seria o primeiro passo para sabotar meu tratamento. Pelas minhas característica (que eu aprendi a enxergar depois de velho) eu não teria disciplina e constância para agir dessa forma, portanto nem tento.
E não é apenas no tratamento do TDAH, sejamos práticos, pra que vou me matricular numa academia de ginástica ou num curso de inglês ? Não tenho disciplina pra isso. Se eu tivesse aplicado tudo o que gastei com matrículas em academias e cursos de línguas e informática eu compraria um carro zero.
Preciso estar em outro estágio do meu tratamento e de motivação para encarar esse tipo de tarefa.
Em outro comentário a leitora diz que temos um diabinho e um anjinho nos induzindo a agir dessa ou daquela forma. De novo o auto conhecimento. Esse comportamento é meu? Esse destruidor sou eu? É isso que eu desejo para minha vida daqui pra frente?
Ceder ao anjo ou ao demônio depende muito de você saber quem é e o que quer.
Eu, sinceramente, já abandonei a fase do 'foda-se', depois eu vejo o que dá.
Já me atirei de abismos suficientes para não querer repetir esses comportamentos. Feridas sobre feridas doem mais e demoram mais tempo para cicatrizar.
Portanto, quando me dá aquela vontade louca de arrasar tudo, de romper com tudo, eu paro e penso: o que eu quero pra minha vida?
Em última análise nossa vida é isso, uma grande batalhe entre anjos e demônios, no TDAH essa luta é anabolizada, principalmente para o lado do demônio. Existe uma tendência a optarmos pelo lado destruidor, o lado que parece acabar com o problema mais rapidamente, mas que acaba apenas ferindo o monstro que fica adormecido por um tempo e quando ressurge está de forças renovadas, maior e mais forte do que antes.; ou então, somos a vítima de nosso demônio e enfiamos em nossa própria carne o tridente fumegante do mal.

segunda-feira, 5 de março de 2012

TDAH UM RADAR SEMPRE LIGADO





Hoje tive que cumprir uma das missões mais chatas do dia a dia, pagar contas no banco. Segunda feira dia cinco é certeza de fila. Aqui estou eu jogando paciência para matar a espera, não gosto de conversar em fila em geral os assuntos são muito chatos e sem graça. Com a paciência passo o meu tempo e espanto os 'conversados'. Mas mesmo concentrado na paciência, o radar não desliga: duas moças em um rapaz conversam animadamente umas dez pessoas adiante, riem, gesticulam e imitam andar a cavalo ou coisa parecida. Atrás de mim uma senhora bufa, resmunga e se remexe tanto que acaba por me esbarrar, imaginei que seu esbarrão fosse um motivo pra puxar conversa e só meneei a cabeça em sinal de desculpas. Até que eu a vi: uma mulher com uniforme de uma empresa saia e casaco iguais,óculos escuros na cabeça ajudando a prender o cabelo crespo amarrado em rabo de cavalo; boa aparência, mas nada demais. O que me perturbou nela foi o acessório que trazia: ela trouxe um banquinho de alumínio, dobrável, bem baixinho e nele estava sentada placidamente brincando com seu celular. Achei aquilo estranho, mas fascinante. Primeiro a cara de pau de ser a única em meio a outras dezenas de pessoas a ter aquele acessório e segundo que eu estava morrendo de inveja. Sentada num banquinho em plena fila de banco! Logo passei a dividir a paciência com aquele banquinho. Fiquei imaginando que se criasse um banco leve, dobrável, mas um pouco mais alto, seria mais legal do que aquele baixinho, que achei um pouco incômodo para movimentar acompanhando a fila. Imaginei camelôs vendendo o novo e revolucionário banco para banco. Poderia ser um sucesso! Aos poucos minha concentração começou a normalizar e percebi que perdia do celular por três a zero na paciência ; retomei-a furiosamente. Um sujeito ao meu lado deu um espirro enorme, tão grande que espalhou uns panfletos de seguro sobre o balcão. Não consegui detectar se mais alguém viu o espalhafatoso espirro, se viu ninguém se manifestou. Nesta altura está três a dois para o celular na batalha da paciência, me recupero rapidamente. Tive de suspender a paciência para rir, internamente, do mega espirro. Nesse momento o sujeito que está na minha frente gritou: e aí, entrou na água? No outro lado da fila o interlocutor apenas riu...
Nesse momento esse post começa a brotar na minha cabeça. Creio que será interessante, mesmo sob tratamento a mente não para. E na verdade eu acho isso até legal. Bem administrada a enxurrada mental pode ser útil e até divertida. Isso é que é legal de se saber TDAH, a gente fica atento e começa a perceber as manifestações do transtorno.
A fila anda, três pessoas à minha frente a moça avança impassível com seu banquinho. Todos a olham de soslaio e, creio, a invejam como eu. Perninha cruzada ela parece trocar mensagens no celular com a placidez de quem está em casa.
A duras penas a fila avança, entramos na reta final, a moça ergue-se de seu banquinho e despistadamente tenta desmontá-lo, Nota-se sua falta de intimidade com o acessório, ela puxa, aperta, empurra, e ele ali, firme, impavidamente aberto. Estou tão embevecido com a moça do banquinho de alumínio que não percebi que o alarme tocou. Alguém me alerta e vou para o lado errado...
A partir desse ponto estou escrevendo em casa, enquanto estava no caixa do banco descobri que participava de um grande momento, a estréia da Beatriz (esse é o nome da moça) e seu banquinho de alumínio. As moças dos caixas começaram a perguntar como, por que, quando, se ela não se envergonhava e coisa e tal. Um senhor na fila percebeu a dificuldade de Beatriz em fechar o banquinho e deu a dica: " puxa essa argolinha aí que o banco fecha". Pronto, banquinho fechado, guardado em uma sacola de tecido e saio do banco.
Fim de festa!
Pela primeira vez uma fila de banco foi divertida, foi até interessante, graças ao conhecimento que adquiri de mim mesmo. O que me chamou a atenção foi a multiplicidade de interesses, a variedade de estímulos que me tiraram a atenção do meu objetivo inicial que era jogar paciência no celular. Em cerca de uma hora eu joguei seis partidas de paciência ( três a três, placar final ), imaginei inteiro e criei grande parte desse post, além de observar fatos interessantes nessa fila de banco.
Conseguir observar 'de fora' o mecanismo do TDAH em funcionamento é muito legal. Criar um post em cima disso é ainda melhor.
A cada dia me convenço de que o auto conhecimento, o auto policiamento, são tão importantes quanto o tratamento. Aprender a enxergar o TDAH é fundamental. Aprender a tirar proveito dele é o maior segredo para não, apenas, sofrer seus efeitos.
Ao infinito e além!

domingo, 4 de março de 2012

O TDAH E O DOM DA RECUPERAÇÃO




Os portadores de TDAH são conhecidos pela má memória, principalmente nas coisas diárias, na vida prática.
Eu tenho essa memória péssima no dia a dia mas ela pode ser prodigiosa em outros aspectos; lembro-me de letras de músicas de trinta anos atrás, de detalhes de propagandas que via na TV preto e branca da minha infância, sou excelente fisionomista e, se eu me concentrar, sou capaz de buscar nomes inteiros de pessoas com quem convivi há décadas e nunca mais vi.
Mas existe uma outra espécie de memória que me impressiona muito.
Uma espécie de desprendimento do passado, seja ele bom ou ruim. Não o nego ou tento esquecer, ele simplesmente se acomoda em algum canto da mente e para de me incomodar. Certa feita, conversando com meu advogado ele disse usar meu exemplo a todos os que atravessam problemas financeiros graves como eu.
Segundo ele eu não me abati nem física nem psicologicamente, sigo minha vida como se nada tivesse acontecido.
Esse é o ponto! Isso é normal? Um cara de 50 anos perde tudo e continua a viver como se nada tivesse acontecido? Será essa uma característica negativa do TDAH que me salvou nesse momento difícil ?
Não vou negar que às vezes me sinto lisonjeado com pessoas que citam minha força de personalidade para superar esse momento. Será força de caráter, uma absurda flexibilidade diante da vida, desprendimento ou simples falta de responsabilidade, de noção da realidade?
Creio que já abordei esse tema em mais de um post, não é um tema que me preocupe profundamente, afinal foi um benefício na minha vida e não desejaria que fosse diferente. Mas se é uma característica do TDAH, o seguir adiante sem olhar para trás, isso nos transforma em sobreviventes de altíssima qualidade. Nos livra daquelas culpas escravizadoras, de nos auto martirizarmos por erros do passado.
Claro que não é uma questão de falta de reconhecimento de erros ou de não assumirmos as responsabilidades pelos nossos atos - isso, creio, já é quase um psicopata - mas temos um dom do renascimento, de não nos subjugarmos ao presente desfavorável. Um maravilhoso dom da reconstrução, do reerguimento, da superação.
Nada nessa vida é perfeito, muito menos no TDAH, essa característica benéfica deve ser a mesma que nos impede de aprender com os erros, de repeti-los várias vezes ao longo da vida.
Mas, não nos prendamos à parte negativa. Se tudo na vida tem mais de um lado, olhemos o mais favorável, sempre.
Até por que as pessoas negativas são muito chatas.