domingo, 24 de junho de 2012

HIPERINFÂNCIA




Criei o blog Hiperinfância  há cerca de um ano. Minha primeira ideia era misturar ficção e realidade, lembranças e invenções, quase romanceando minha infância.


Criei um único post e não gostei nem tive interesse em dar continuidade. Nesse fim de semana, não sei por que resolvi voltar a 'brincar' com esse blog e decidi acabar com a parte 'romanceada' e ater-me às minhas lembranças, as estórias contadas e comentadas por minha família e as minhas sensações, que mesmo após tantos anos ainda permanecem quando me lembro de fatos e aventuras daquela época.


Espero que minhas memórias de infância divirtam a quem se interessar em conhecê-las e sirvam de alento e exemplo àqueles pais que passam por experiências similares.
Aproveitem, o túnel do tempo está apenas começando...

quinta-feira, 21 de junho de 2012

O TDAH COM O RADIADOR FERVENDO








Há pouco mais de um ano escrevi um post sobre os ganhos de memória que consegui com o tratamento inclusive em relação à manutenção do meu carro.
Adoro carros, odeio cuidar deles. Mesmo que ame meu carrinho, sou um péssimo dono. Ao desleixo como motorista soma-se uma impaciência com certas situações, uma delas aquela clássica de posto de gasolina:
' quer que dê uma olhadinha na água e no óleo aí doutor?' minha resposta padrão é: precisa não, amigo, tá tranquilo. E não tenho a menor ideia se está tranquilo mesmo, apenas quero sair daquele posto.
Ontem, saí do serviço à noite, abasteci o carro e: 'tranquilo, amigo'.
Chegando bem perto da minha casa percebi a luz da temperatura acender-se. Droga, pensei, aquela válvula termostática estragou outra vez. Há pouco mais de três meses eu troquei essa tal válvula.
Como estava muito perto de casa cheguei tranquilo e, claro, deixei para tomar providências na manhã seguinte. Você lembrou? Nem eu.
Fui levar a Marina na escola e em seguida buscar a Jaque, aí o caldo entornou. Novamente, no alto do morro, o carro ferveu. Parei, desci tranquilamente e pensei: " será que é falta d'água?" E não é que tinha água no radiador? Quando fui tirar a tampinha do reservatório voltou um monte de água fervendo. Do alto do meu vastíssimo conhecimento de mecânica sentenciei: não está faltando água.
Pra encurtar a conversa, gastei pouco mais de uma hora para percorrer uns 8 quilômetros. Andava dois minutos parava quinze pra esfriar o carro.
Fui direto ao mecânico: Pedrinho, disse eu, o carro ferveu de novo!
O mecânico parou o que estava fazendo e foi  conferir a fervura, levantou o capô e começou a rir: tá faltando água, Alexandre!
Minha cara caiu, cheio de gente em volta e claro, tinha um gaiato ao lado que tinha de dar um pitaco a mais: é, além de não colocar água no radiador o moço aí não calibra os pneus também, a lá, tá vaziinho. Os quatro ou cinco homens que estavam na oficina foram lá conferir o pneu murcho; mil pitacos e brincadeiras. Mentalmente eu mandei todos para aquele lugar.
Mas não tinha água mesmo. Aquela tal água borbulhante que tinha lá dentro era um restinho, o mecânico enfiou uma mangueira no reservatório e despejou litros e litros d'água.
Que vergonha, esqueci de colocar água no radiador do carro. Tentei pensar há quanto tempo não colocava água no carro e não consegui me lembrar de haver colocado água em 2012 no carro. kkkkkkkkkkkkkk
Ah, que saco também, a gente tem de ser perfeito em tudo...
Bom marido, bom pai, bom profissional, bom pro meio ambiente; e ainda tem de por água no radiador! Ahhh tenha santa paciência! Vou criar uma ONG pra financiar pesquisas de desenvolvimento de um radiador a seco, com gel, sei lá, algo que eu não tenha de me lembrar de conferir. Odeio conferir! Ódio mortal de conferir. Ihhhhh, me lembrei agora: e o óleo do motor, eu conferi?
Ah,  o Pedrinho deve ter olhado. Ou não? Tudo bem, amanhã eu olho.

terça-feira, 19 de junho de 2012

POR QUE DESTRUÍMOS NOSSAS VIDAS?





Estou aqui ouvindo Michael Jackson interpretando a música Smile, composta por Charles Chaplin. Lembro que quando gravou essa música, Michael Jackson falou que era a música que ele gostaria de ter feito.
Ouvindo sua belíssima interpretação fiquei pensando nas razões que o  levaram a trilhar esse caminho de loucura que culminou em sua morte. Ninguém nunca irá saber.
Mas, e nós portadores de TDAH?
Por que repetimos os mesmos erros?
Por que caminhamos na mesma trilha?
Por que destruímos nossas vidas?
Por que agredimos a quem amamos?
Por que não nos calamos?
Por que não pensamos, apenas mais uma vez, antes de agir?
Por que não terminamos aquilo por que ansiamos há tanto tempo?
Por que gastamos mais do que ganhamos?
Por que bebemos mais do que deveríamos?
Por que corremos além do limite?
Por que ceder àquele prazer imediato que sabemos pernicioso?
Por que não paramos à beira do precipício?
Por que nos sabotamos quando estamos atingindo o clímax?
Simplesmente por que somos portadores de TDAH?
Ou nos satisfazemos com os 'ganhos' indiretos que nossa luta nos proporciona?
Ou quem sabe não temos força suficiente para enfrentar o TDAH?
Por que, mesmo sabendo que estamos procrastinando e que essa procrastinação é obra do TDAH, procrastinamos mais uma vez?
Por que, mesmo tendo conhecimento de que nossas explosões de fúria proveem do TDAH, ainda mordemos a mão que nos alimenta?
Ainda não existe cura!
Nós somos a cura!
É uma tarefa de Sísifo - na mitologia grega, Sísifo fora penalizado a empurrar uma pedra enorme morro acima e ao estar quase no topo, a pedra rolava até a base e ele tinha de recomeçar sua tarefa - mas ao contrário do mito grego, não estamos condenados por um Deus, pelo contrário, Deus nos deu o supremo dom do conhecimento e conhecer o inimigo é o primeiro passo para derrotá-lo.
Vamos lá, cada um de nós tem sua própria pedra a empurrar montanha acima, mas, aos poucos, vamos conhecendo os atalhos dessa montanha e aqueles pontos onde podemos parar para descansar e recarregar as baterias.
O importante é termos consciência da hora de parar, é reconhecer a ação de nossos sabotadores e evitar que tenhamos o fim triste e solitário daquele que um dia foi o rei do pop, o maior vendedor de discos da história da música, um ídolo de multidões, mas que na hora de parar, deu o derradeiro passo em direção ao precipício.



segunda-feira, 18 de junho de 2012

UM TURBILHÃO CHAMADO TDAH







Da mais negra e úmida tristeza à claridade ofuscante da mais genuína alegria por uma palavra.
Momentos do mais puro cinza dominados pelo torpor da indiferença podem ser invadidos pelo vermelho da pura raiva, uma profunda vontade de tomar a radical decisão suprema.
Torrentes de pensamentos provocam uma sucessão indistinguível de sentimentos, um redemoinho interior que pode ser sentido fisicamente nos batimentos do coração ou na alteração da respiração.
O radar ligado capta sons e diálogos ao redor captando também todo o potencial explosivo que entrecortadas conversas alheias podem causar. E lá vamos nós na montanha russa emocional de novo.
Uma notícia esperada como alento pode ser capaz de chocar e decepcionar pelo excesso de alento.
Um diálogo que era pra ser amistoso, quase vira um confronto por muito pouco.
Um boa música é capaz de um transporte quase interplanetário.
Um filme, uma frase, um toque, pequenas vitórias ou fracassos corriqueiros no dia a dia são amplificados de maneira irracional numa caixa de ressonância emocional chamada TDAH.
Nada é pequeno, nada é superficial. Sentimentos simples transbordam num tsunami de emoções levando de roldão todas as estratégias de sobrevivência elaboradas ao longo desses anos de convivência com o transtorno.
Uma força descomunal  é necessária para retornar ao eixo. E são necessários vários desses esforços diariamente para que as derrapadas emocionais não se transformem numa queda definitiva no precipício dos sentimentos radicais e sombrios.
Agora são 22:40, ao terminar esse texto irei dormir e terei vencido mais um dia desse turbilhão chamado TDAH.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

TDAHs DE MÃOS DADAS




Acabei de ler um comentário que mexeu comigo; minha amiga Isa parabenizou-me pelo estágio em que me encontro em meu tratamento.
Respondi a ela que não existem estágios, estamos todos numa gigantesca caminhada e precisamos uns dos outros para continuarmos a seguir em frente. Às vezes um de nós avança um pouco mais e esse avanço deve servir de estímulo aos que se atrasaram e, se for necessário, estender a mão àquele que caiu ou desanimou no curso dessa longa trajetória. Mais adiante, quem estava na dianteira pode escorregar e cair e precisará de quem o ajude a reerguer-se e, novamente, sentir-se motivado e com força suficiente para retomar o avanço.
Esse blog é a essência do que digo, os comentários que recebo servem-me de inspiração e estímulo, não somente para escrever novos posts mas também como combustível nessa jornada infindável de combate ao TDAH.
Não se iludam, nesse um ano e meio de tratamento e de blog tive momentos de desânimo e decepção ao ponto de um dia anunciar o fim do blog. E por que o blog não acabou? Por causa do enorme apoio e força que recebi de várias pessoas que eu não conheço pessoalmente, mas que fazem parte da minha vida, e conhecem-me tão bem, pois partilhamos as mesmas dores, as mesmas derrotas e por que não, as mesmas vitórias.
O tratamento do TDAH não pode ser solitário, sozinho é muito mais difícil, precisamos uns dos outros, preciso ouvir a opinião de vocês, as estratégias de vocês, as lutas e as conquistas de cada um de meus leitores e amigos pois através de vocês eu me fortaleço e ganho ânimo para manter o blog e o tratamento.
Não sou e nem tenho a pretensão de ser mais ou melhor do que ninguém; sou apenas um portador de TDAH mais escandaloso e barulhento do que a maioria e que está tentando usar o TDAH para melhorar a minha vida e a de quem se dispuser a caminhar ao meu lado.
Ainda procrastino, ainda tenho memória falha, explosões de fúria, inconstância, mas não me entrego; luto dia e noite contra cada um desses sintomas. Se não consigo combater um deles especificamente, vou atrás de outra estratégia mais eficiente do que a que adotei até aqui.
Comentei com o Caco que minha primeira estratégia para parar de fumar foi reconhecer a minha incapacidade de largar o vício sozinho. A partir do dia em que cheguei a essa conclusão, comecei a procurar  algo, ou alguém, que me ajudasse com essa empreitada. Sei lá por quanto tempo procurei algo em que eu acreditasse, até que um dia, sem querer, encontrei um anúncio no jornal de uns médicos que faziam aplicações de raio laser para parar de fumar. Fui lá, fiz as tais aplicações e parei de fumar há treze anos.
Não posso abrir mão da ritalina e muito menos do apoio da Dra. Valéria e da Luciana, com esse suporte tenho certeza de que vou conviver melhor com o TDAH. Até que um dia possamos derrotá-lo definitivamente.
Obrigado pela inspiração e o apoio, Isa.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

UM GOLPE NO TDAH!




Acabei de descobrir que posso frear meus impulsos, mesmo quando eles são uma soma perversa de desejo, rancor e vontade de auto afirmação.
Estive no limiar de fazer uma grande besteira, e tinha todas as justificativas pra isso; um dia em que passei controlando-me para não explodir, mantive-me razoavelmente tranquilo mesmo sendo repetidamente desafiado e provocado. O dia parecia encaminhar para um final normal quando uma última palavra, aquela da despedida entrou no meu ouvido como um tijolo. Já nem era mais uma provocação era um escárnio. Não caí na provocação gratuita, sequer respondi, apenas olhei. Voltei pra minha mesa disposto a afogar o insulto numa pilha de celulares que estão esperando a hora de serem consertados. Aí entrou o TDAH em ação, o pequeno demônio que nos habita começou a manifestar-se. Primeiro de maneira tímida como é de seu costume; eu não conseguia me concentrar no trabalho. Uma insatisfação com tudo o que aconteceu durante o dia me martelava a cabeça. Larguei o trabalho e fui pra net, tambem estava ruim, a insatisfação aumentava, uma tênue vontade de vingança brotava na alma. Isso não pode ficar assim, eu pensei; isso tem de ter um troco, na mesma moeda ou maior. E assim, no melhor desempenho TDAH, levantei-me repentinamente, juntei minhas coisas e fui em busca da revanche. Ainda pensei assim:  nem em casa vou pra não dar tempo de pensar e desistir.
A essência da auto sabotagem.
Na rua comprei o que precisava para dourar minha vingança e, decididamente, toquei o carro em direção ao belo objetivo que eu traçara do fundo do meu rancor. Por sorte, de onde eu estava até lá são uns bons quinze minutos de carro. Olhando a garoa que caía no parabrisa do carro, comecei a refletir no que iria fazer.
O prazer imediato!
Com quais conseqüências? Difícil de mensurar nesse momento mas os ingredientes eram nitroglicerina pura. Tinham tudo para se encontrar e explodir com conseqüências inimagináveis.
Sem perceber fui reduzindo a velocidade do carro e pesando as atitudes: essas conseqüências vão resultar no que eu quero? Não, eu não quero essas conseqüências. O prazer que eu posso ter é maior ou igual ao desastre que ele pode causar? Não sei mensurar, mas consigo imaginar o saldo da tragédia.  Uma tragédia que, certamente, iria respingar na vida pessoal e profissional. Definitivamente não posso e não quero colocar tudo isso em risco.
Senti-me mais leve e peguei o primeiro retorno para o centro da cidade.
Decidi vir para esse local onde estou agora; a Planet Music, um misto de livraria, video locadora, loja de cds e café. Um lugar que adoro. Sentei, pedi um café expresso gigante uma porção de pão se queijo e comecei a pensar na vida. Só então percebi a dimensão do que havia acontecido. A vitória da razão,  da minha vontade, daquilo em que acredito sobre o TDAH. Consegui pensar, racionalizar e produzir o efeito que o Alexandre queria obter e não o que o transtorno me sugeria ou me dirigia a fazer.
Confesso que o café com pão de queijo ficou muito mais gostoso!Venci um round. Uma batalha. Muitas outras virão, vencerei algumas e perderei outras, mas hoje, estou comemorando essa magnífica conquista: superei meu desejo, sobrepujei aquilo que dirige minha vida desde a adolescência.
É claro que trago na boca um gosto estranho de incerteza, principalmente em relação às atitudes e caminhos das outras pessoas envolvidas. Mas não interessa, fiz o que minha razão julgou correto e não serei eu a implodir tudo, não dessa vez.
Estou encantado comigo mesmo, com essa nova pessoa que surgiu e me ajudou nesse momento .
Feliz dia dos namorados pra mim!


quinta-feira, 7 de junho de 2012

VOCÊ MATARIA?







Não sei se esse post será exatamente sobre o TDAH, nem mesmo se o publicarei, mas ao ouvir o comentário na TV deu-me uma enorme vontade de escrever sobre o assunto.
Acabei de assistir na televisão um comentário encerrando o jornal SBT Brasil sobre o caso da mulher que matou e esquartejou o marido, um executivo da Yoki. Um jurista ou sei lá qual é sua profissão comentou que qualquer um pode matar, faz parte da natureza do ser humano. Carregamos uma coerção moral que nos impede de matar; porém se essa coerção se rompe, matamos.
Você seria capaz de matar?
Eu seria capaz de matar?
Até aonde aguentamos a pressão?
Os portadores de TDAH somos extremamente suscetíveis à pressão e sujeitos a explosões inesperadas.
As suas explosões já o fizeram temer cometer um homicídio?
Em algum post anterior cheguei a comentar sobre esse assunto, eu temo minhas reações sob forte pressão e minhas explosões de fúria, por isso não tenho nem carrego nenhum tipo de arma ou nada que possa usar como. Tem gente que carrega no carro porretes, barras de ferro, sei lá, um sem número de coisas que seriam objetos de defesa. Eu não acredito que essas pessoas pensem em defender-se somente; no recôndito mais escuro de suas almas elas sabem que uma hora ou outra essas 'armas' serão ou poderão ser usadas para ataque.
Detesto qualquer tipo de violência, mas por via das dúvidas, não carrego nada, nem pretendo ter jamais qualquer tipo de arma. Um segundo, ou menos, poder ser o tempo necessário para se puxar um gatilho ou desferir um golpe qualquer num momento de desespero.
Vivemos um momento estranho no Brasil; a vida humana vale tão pouco, quase nada.


Matar é algo tão fácil, tão comum, tão corriqueiro...
Quando conhecemos certos números é que enxergamos o tamanho da tragédia brasileira; morrem em média 300 pessoas por dia no Brasil se somarmos acidentes de automóveis e assassinatos. Trezentas pessoas por dia! Fora as que ficam mutiladas, aleijadas, etc.
Dirigimos com uma agressividade e displicência fora do comum, o motorista ao nosso lado é nosso inimigo e deve ser derrotado a qualquer custo. Nunca ele poderá chegar naquele cruzamento primeiro, a prioridade jamais pode ser do outro. Somos todos assim no Brasil.
Muitas vezes, quando analisamos friamente nossas atitudes ao volante, percebemos quão perigosas, infantis e inúteis elas foram, mas continuamos a repeti-las.
A tragédia nos ronda, está ao alcance de nossas mãos, levamos vidas intensas, apaixonadas e muito próximas do limite. Muitos de nós abusam das bebidas alcoólicas e das drogas, adoramos a velocidade e a adrenalina, portanto, vamos nos manter longe das armas e por consequência das tragédias. Claro, nada garante que a tragédia não virá por nossas próprias mãos, mas pode ser menos letal, menos rápida, e quem sabe, pode nos dar uma oportunidade de pensar e arrepender antes que seja tarde demais.
Pessoas comuns, normais, que levam vidas aparentemente tranquilas e metem-se em tragédias bárbaras me impressionam muito. Depois que a arma é disparada não há como voltar atrás e aí, na tentativa de se livrar da punição e da cadeia (que deve ser uma coisa horrorosa), as pessoas multiplicam os crimes e a monstruosidade de suas ações.
Na dúvida, não tenha armas, ninguém precisa delas pra nada de útil e construtivo.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

CALEIDOSCÓPIO AMBULANTE

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro." Clarice Lispector


















O TDAH E OS GRILHÕES DO PASSADO













O diabo desta vida é que entre cem caminhos temos que escolher apenas um, e viver com a nostalgia dos outros noventa e nove. ( Fernando Sabino)


Pois é, assim é a vida dos 'normais'. Optam por algo e ficam com aquela lembrança, aquela quase saudade do caminho que não escolheram.
Nós não! Nós somos intensos, passionais, fervilhantes! As opções não escolhidas crescem ao longo do tempo, todas em belíssimos tons de rosa em um fortíssimo contraste com a aridez acinzentada do caminho que escolhemos e percorremos. Fantasmas róseos, assombrações belíssimas daquele caminho que percorreríamos se tivéssemos feito aquela escolha.
Uma espécie de campanha eleitoral pós eleição. Você votou no único corrupto, somente um era desonesto; e você escolheu exatamente o dito cujo. Os outros candidatos, do partido dos relegados, desfilam ao seu redor todas as suas virtudes e vantagens e você as contrapõe raivosamente aos defeitos que você não viu no pilantra que elegeu.
No final do ano passado, decidi mudar-me de minha cidade. Tomei todas as medidas necessárias para partir, menos partir. Fiquei, por uma série de razões, algumas racionais, outras emocionais, afetivas, e, também  por causa dele; o medo. Sempre ele. 
Não fui, mas não fiquei. Navego hoje num canal entre lá e cá. Trabalho como um mouro, dedico-me de corpo e alma ao meu trabalho, mas não posso ver uma brisa, uma água tremulante, uma areia mais branquinha que uma fisgada forte me atinge a alma. Não fui, mas gostaria de ter ido. Abdiquei da minha vontade (mais uma vez) em prol de outras coisas que me pareceram as mais corretas e sensatas.
Mas não esqueço o que não tive.
Minha coach- Luciana Fiel - fala sempre: Dá pra você fazer agora? Se não dá, esquece e toca a vida.
É o que eu faço. O fantasma é que não me abandona. Está sempre ali, furtivo, se esgueirando e esperando a chance pra atacar. E claro, quanto mais difícil estiver a vida mais ele se deixa ver, mais bonito e rosado ele se apresenta. Há dias em que eu peço a Deus para me ajudar a ter foco, a esquecer todas as tentações que eu mesmo crio, a interromper todos os caminhos paralelos que minha imaginação e meus sabotadores abrem ao meu redor.
Foco! Foco, essa é a palavra. Um dia voltarei a ter condição de retomar o projeto de sair daqui e viver num lugar que sonho há dez ou doze anos.
Agora, no presente momento, essas condições não existem e Ilhéus é apenas uma paisagem bela e como todas as paisagens, esconde seus problemas e as dificuldades que certamente surgirão quando eu lá estiver.
A vida é aqui e agora!