sábado, 14 de maio de 2011
LEMBRANÇAS HIPERATIVAS.
Vi uma cena hoje que me levou de volta à minha doce infância.
Uma criança - que pela distância não consegui definir se era menino ou menina - se debatia e urrava no colo de uma pobre mãe desesperada. Próximas a mim duas senhoras estavam penalizadas com o choro da criança. Na mesma hora pensei na injustiça da cena; uma pobre mãe em luta com uma criança feroz e ainda por cima é criticada.
Lembrei-me de certa vez em que fui a um parque de diversões. Estamos falando da década de sessenta, um parque de diversão era uma raridade, um paraíso para um menino endiabrado. Eu entrei no carrinho de batidas e não queria sair, nem mesmo depois de parado; quando vi que não poderia continuar ali saí correndo em direção a outro brinquedo. Assim fiz algumas vezes, até que chegou a hora de ir embora. E não concordei com aquela decisão familiar. Me recusei terminantemente a sair; agarrei-me às grades de um brinquedo qualquer e fiz um escândalo digno de uma criança maltratada. Meus pais tiveram de me arrancar à força do parque, um segurava nos braços, o outro nas pernas. Eu me debatia e gritava meu protesto aos quatro cantos do universo.
Ao recordar-me dessa doce cena, recordo-me também das últimas palavras daquela música sobre as mães, aquela que cantávamos invariavelmente no dia das mães e que falava do seu avental todo sujo de ovo, terminava assim: se eu pudesse eu queria outra vez, mamãe, começar tudo, tudo de novo. Coitada da minha mãe! Eu jamais desejaria isso pra ela de novo. Essas cenas eram bastante comuns. Eu não aceitava ser contrariado, a brincadeira não podia ter fim. Sair da piscina ou do mar era uma luta, eu já estava com os lábios roxos, a pele enrugada, mas não saía. Meu pai conta um caso que eu, aos três anos, queria ficar passeando pelo corredor de um ônibus a caminho de Belo Horizonte. Claro que meus pais não deixaram, e eu fiz uma cena daquelas, chutava minha mãe, mordia... Por fim, meu pai perdeu a paciência e me deu uns catiripapos e eu, acalmei.
Imagine se quero isso para meus pais de novo. E, sinceramente, nem sei se pra mim era bom. Deveria ser um inferno interior a cada não que eu recebia, a cada contrariedade. Não me lembro, mas deveria ser uma tortura para mim não poder fazer o que eu queria.
Por isso hoje, fiquei com pena daquela mãe. Provavelmente ela não conhece a hiperatividade, nem os tratamentos possíveis. Talvez a escola nunca a tenha alertado, o governo não faz sua parte e ela e seu filho, provavelmente, carregarão esse fardo pelo resto de suas vidas.
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