quinta-feira, 26 de novembro de 2015

O TDAH E BENTO RODRIGUES





TDAH é uma mistura de milagre com desastre.
O milagre do renascimento.
O milagre da superação.
O milagre da volta por cima.
O milagre prenhe do desastre!
No silêncio do amanhã repousa pacientemente o próximo desastre.
Não tem remédio; não tem terapia; não tem tratamento.
O desastre virá!
Mas virá mesmo?
Não é possível impedi-lo?
Claro, sempre é possível. Mas é preciso percorrer um longo e árduo caminho. É preciso aprender a enxerga-lo; antevê-lo; entendê-lo.
Precisamos levantar o véu do presente imediato e vislumbrar as consequências futuras.
Talvez  não vejamos o próximo desastre com a devida gravidade, por que confiamos excessivamente de que o milagre da recuperação virá.
Mas e se um dia ele não vier?
E se o desastre atingir proporções Mariânicas? Aquele tipo de desastre que inicia arrasando uma pequena vila e vai agigantando-se até contaminar o oceano, deixar um rio à beira da morte e populações inteiras sem água e sustento! E tudo por negligência! Tudo por negar-se a enxergar o óbvio! Tudo por não se importar com os vários sinais de que a tragédia se avizinha.
O desastre de Bento Rodrigues é uma alegoria TDAH. Assim agimos. Assim negligenciamos nosso futuro confiantes na solidez de uma barragem que se esboroa a olhos vistos.
E aí o TDAH mostra toda a sua crueldade; por mais que as situações se repitam, que os sinais sejam os mesmos de desastres já vividos anteriormente somos incapazes de reconhece-los. As trincas escandalosas na estrutura da barragem não são o bastante para nos alertar do tsunami de lama que virá. E então ele vem.
E quando a barragem se rompe já não podemos fazer mais nada. Atônitos observamos a destruição de vidas que estão em nosso alcance, e as funestas consequências das tragédias tão amplamente anunciadas. Mas para nós TDAHs, o anúncio foi feito numa língua morta, obscura e indecifrável.
E aqui a tragédia verdadeira se distancia das nossas pessoais; somos vítimas e não algozes. Ainda que muitas vezes nosso comportamento possa ser parecido com o da Samarco.
E aí, tome culpa!
E tome arrependimento!
E tome humilhação!
E tome esquecimento!
E tome recuperação!
E tome milagre!
O milagre prenhe de desastre!

9 comentários:

  1. Alexandre, eu me preocupo eu pouco com a avaliação que faço de eventos passados as vezes e sinceramente não sei ao certo se me arrependo ou nao. Lógico que na grande maioria das vezes eu que estava lá mal colocado, completamente fora do contexto da situação vendo alternativas que ninguem enxergava mas com a minha total falta de empatia ("vendo alternativa que ninguém exergava" nao evoca nenhum sentido positivo ou de genialidade, nao me entenda mal é acho necessário fazer esse tipo de ressalva dada a necessidade de alguns se mostrarem mais especiais e "geniais" frente aos demais, mas acho que é o extremo inverso da situação, é o jeito e a forma de pensar e principalmente a de agir é que te isola ainda mais das outras pessoas). Sei que muito disso é por conta de nao ser um neurotipico e por isso, por esse motivo, meus valores não se assemelham aos das outras pessoas nem um pouco, mesmo porque vivi uns 30 anos assim e o TDAH era uma coisa inconsciente, achava que era algo relativo a minha personalidade e um jeito diferente de ser dos outros (acabou que virou parte da minha personalidade mesmo, do jeito de pensar e da minha (i)racionalidade, o que trabalho hoje é no sentido de agir numa terapia comportamental para reduzir um pouco dos impactos sociais e profissionais e tem me ajudado muito, mas o jeito de pensar parece ser impossível). Mas ao mesmo tempo me questiono se os valores das outras pessoas são "tesouros" mais valiosos que os meus. Em um caso específico uma situação de trabalho que poderia ser resolvida de maneira simples mas que nao dependia de mim, eu transformei num bicho de sete cabeças e hoje avalio que nao precisava chegar a tanto, era so ter largado o emprego e ter arrumado um outro. Mas nesse caso existiam muitas questoes que foram desgastando que beiravam a uma falta de humanidade sem igual e que colocava minha vida e meu bem estar a todo tempo em risco e gerava uma insatisfação coletiva, nao so do TDAH aqui. Em certo ponto eu fico feliz (e nao orgulhoso o que é bem diferente) por ter feito o que fiz, pois muitos dos que reclamava junto comigo na época ainda estão lá sob as mesmas condições, correndo um risco eminente de perder suas vidas a troco de nada, profissionais com decadas de experiencia que nao tentam uma guinada minima na vida, que no caso seria fazer o mesmo que fazem la mas em um outro lugar (com meus 29 anos eu ja passei por 14 lugares, me arrependo apenas da forma com que sai de muitos deles, e nao de ter saido, pois so assim encontrei condições relativamente dignas de trabalho e de subsistencia). O que agora tento evitar é que tanto esforço e tanta luta nesse tempo seja jogado pela janela, tenho tido sucesso ate entao, mas sempre fico com o pé atras por saber da possibilidade de insucesso por conta dessas questões.
    Um grande abraço cara! Mais um excelente texto, seu site tem me ajudado muito a esclarecer diversos pontos que nao entendia da doença. Inclusive essa experiencia de trabalho que tive a oportunidade agora so escolhi porque li aqui no seu site a expressão "mente alegorica". Foram essas duas palavras que me fizeram pensar bem na proposta que tinha recebeido ao ponto de aceitar, e jogar fora os motivos que se passavam na minha cabeça para recusar (coisas que ja tinha feito diversas vezes e nao tinham relevancia nenhuma para a minha vida).

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    1. po, foi mal, meu comentario foi outro texto, nao era a intenção.

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  2. é bom enxergar de longe esse malfeitor (tdah)...
    nem sei se é mal feitor..
    cai tantas vezes ... e rapidinho estava como se não tivesse acontecido nada.
    enquanto o outro olhava para mim com uma cara tipo... "você não vê a proporção das coisas e nem as consequências?''
    é , mas não sou eu...
    e aí repito de novo, nem percebi que era o tdah,,,
    tbm nem percebo quando é ele que me faz achar que não aconteceu nada.
    é isso..
    mas... confiar em Deus sempre

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  3. Segunda feira tenho prova de reavaliação ou seja preciso aprender tudo de uma vez ate lá, e vou dizer pra vocês não é fácil ontem e hoje eu tentei de todas as formas estudar com ferramentas de planejamento definindo metas persistindo ao máximo, mas não consigo absorver nada do que leio e não consigo ler, as letras parecem dançar diante dos meus olhos. Enfim é absurdamente difícil vou voltar para a ritalina nem que seja apenas para estudar.

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  4. Oi, Alexandre. É até curioso, mas já há algum tempo acesso seu site, leio seus textos, embora não tenha ninguém muito próximo que tenha TDAH. É que, tempos atrás, conheci uma pessoa por quem me interessei (mas não cheguei a me relacionar), que admitiu possuir esse transtorno. Era uma pessoa jovem, inteligente e que possuía energia de sobra. O problema é que essa energia, por vezes, estourava em raiva exagerada. Ou, mesmo, agressividade sem motivo. Estranhei esse comportamento e, pesquisando, descobri do que se tratava. A pessoa levava uma vida bem desregrada, não possuía emprego e parecia um pouco estagnada. Pra mim, parecia contraditório, pois se tratava de alguém perfeitamente capaz. Pois bem, acabei me afastando, e nunca mais tive contato. Mas seus textos ainda dizem muito, e me ajudaram a compreender o porquê daquelas atitudes que tanto me magoavam. Ainda que suas palavras falem, diretamente, aos que convivem (com) e possuem o TDAH, elas acabam por tocar uma certa fragilidade de que todos padecemos. O discernimento, sensibilidade e honestidade dilacerantes em que se baseiam suas palavras sempre me fazem voltar aqui. Sei que os percalços são muitos, mas, persista, pois o conforto que você transmite é significativo. Sou jornalista, tenho as palavras como ofício e paixão, e digo que aprendi mais com seus posts, do que com as muitas páginas em que procurei por informações sobre o TDAH. Continue, vá em frente, meu caro - que tamanha lucidez e esforço jamais virão à luz em vão.

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  5. Tbm acompanho e leio sempre tudo aqui aprendi mt tbm...E vejo q n estou sozinho obg.

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  6. Boa tarde Alexandre. Ficou sabendo desta pesquisa?

    "Novel mechanism involved in attention-deficit hyperactivity disorder, study shows"

    http://www.sciencedaily.com/releases/2015/04/150416084342.htm
    http://embomolmed.embopress.org/content/7/7/904

    Ela mostra evidências de que o TDAH seria causado por uma deficiência enzimática.

    Sua escrita é brilhante. Parabéns.

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  7. Comecei a acompanhar seu blog recentemente, pois estou em processo de avaliação para um possível diagnóstico de TDAH.
    Devo dizer que me vejo em quase todas as questões que coloca nos seus textos, e às vezes é assustador se reconhecer tanto em comportamentos de outra pessoa, ainda mais um desconhecido.
    Minha mente sempre imaginativa cria uma falsa realidade que me faz sentir como se a Matrix estivesse com problemas e eu sou apenas uma cópia de outros tantos programas com os mesmos defeitos. (perdoe a minha analogia com o filme, mas foi o melhor que consegui para exemplificar com precisão esse meu sentimento).
    Vejo nos comentários outras tantas pessoas se identificando com seus relatos e isso é um pouco conflitante para mim, pois passei a vida achando que esse problema era algo exclusivo e sofria em silêncio e sozinho por possuir tantas falhas de caráter, mas mesmo solitário eu me sentia único.
    Hoje, depois de milhares de páginas lidas e muita informação adicionada ao meu programa defeituoso, eu me vejo como mais um com TDAH, e isso me fez perder a exclusividade da dor e da culpa, que a principio gerou um conflito de identidade, mas me fez aceitar que, como você, eu possa enfrentar e subjugar o transtorno, me fez entender que o preço de ser único e exclusivo é o isolamento.
    Hoje eu sei que o melhor caminho é o autoconhecimento, não só dos defeitos mas buscar potencializar as poucas qualidades e quem sabe se eu seguir esses princípios, um dia serei capaz de ir até o fim de meu sonho de infância.
    Ser um escritor.

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