domingo, 26 de fevereiro de 2012

ARTIFÍCIOS DO TDAH NA ADOLESCÊNCIA



Hoje encontrei uma pessoa que me contou que seu filho adolescente se recusa a tomar o remédio, inventou mil desculpas sendo a principal o risco de impotência descrito na bula da ritalina.
Nossa conversa foi se alongando e comecei e recordar minha adolescência ouvindo-a falar de seu filho.
Garoto problema na infância, chegando mesmo a ser indesejável, o jovem encontrou o caminho da popularidade e das amizades tornando-se o palhaço da turma.
Exatamente a estratégia que adotei, eu era super popular: imitava mil bichos, latia e cacarejava com perfeição e claro, durante as aulas. Tive uma professora de geografia, D. Vera, que um dia implorou pelo amor de Deus para que eu a deixasse dar aula. Não me recordo se a atendi. Imitava pessoas, artistas, fazia milhares de ruídos estranhos, imitava uma corneta com a boca, uma espécie de batucada, narrador esportivo, tudo o que me viesse à cabeça, completamente sem freios. E  a vida era assim também.
Fiquei popular, famoso e era convidado para tudo. Todos queriam minha presença e minha amizade.
O maior problema é que acabei por vestir essa roupa em tempo integral. Infernizei tanto na escola que acabei convidado a conhecer novas escolas da cidade. Comecei uma peregrinação por várias escolas, nenhuma me satisfazia; optei por uma que frequentei por uma ou duas semanas e nunca mais voltei. Perdi um ano de escola. No princípio achei uma maravilha! Não precisava estudar, acordava na hora que queria, podia fazer o que quisesse na hora em que eu quisesse.
Ledo engano. Essa vida mansa não durou sequer dois meses. Chegou o período de provas e os amigos não podiam sair por que tinham de estudar. Fiquei sozinho. O ano foi passando e a solidão aumentando, um sentimento de estar ficando para trás. Uma das coisas que mais me doeu foram as meninas; quando eu encontrava com alguma delas e comentava que parara de estudar, recebia em troca um olhar que misturava  reprovação e pena que me matava de tristeza.
Comecei a sonhar com o ano seguinte quando voltaria  a estudar e tudo seria diferente. Resolvi que iria estudar em uma das escolas mais difíceis da cidade, iria estudar, passar de ano e mudar de vida. Assim fiz, meus pais concordaram e fui estudar na Academia. Até tentei, estudei pra caramba apenas para descobrir que eu não tinha nenhuma base. Por mais que me esforçasse eu simplesmente não sabia nada. Eu boiava nas aulas mais complexas tipo Física e Matemática, os anos de palhaçada cobravam seu preço. Cheguei ao meio do ano numa situação desesperadora: mesmo que eu tirasse nota máxima naquelas duas matérias no segundo semestre não passaria de ano.
Seguindo o conselho de uma amiga de meu pai, fui estudar numa escola sabidamente fácil e tranquila de ser aprovado. Foi excelente, tirei excelentes notas, fui aprovado com louvor e retomei o estímulo para estudar. O segundo grau foi tranquilo de tirar.
Cansei de ser palhaço, sempre fui e continuo sendo uma pessoa divertida, alegre e brincalhona, mas aquele personagem que se esforçava para aparecer morreu. Morreu quando fiquei sozinho por não estudar e entendi que deveria encarar a escola de forma séria. Minha popularidade não diminuiu e meus amigos não me abandonaram. De quebra, angariei a simpatia dos professores e funcionários da escola. Sempre simpático, risonho e alegre, eu conversava bastante, mas nada que impedisse os professores de darem suas aulas.
Pois é, o palhaço tem lá sua popularidade, tem lá seus seguidores, mas corre o risco de ficar marcado e acabar ridicularizado e segregado.
Muito melhor do que ser o palhaço é integrar-se à turma sem rótulos, sem máscaras e sem comportamentos forjados para ser aceito. O tratamento possibilita essa integração, o tratamento evita que sejamos obrigados a interpretar personagens que mascarem nossas dificuldades, facilita nosso aprendizado e NÃO CAUSA IMPOTÊNCIA.
Podem acreditar.

15 comentários:

  1. Olá!

    Mais uma vez, me identifico com as suas histórias. Na minha adolescência eu também era o palhaço. Sempre brincalhão e conversador descontrolado, eu causava desespero aos professores, que não suportavam o meu jeito de ser e de agir. Perdi as contas de quantas vezes fui "convidado" a me retirar da sala de aula.

    Em uma escola estadual onde cursei a 7ª e a 8ª séries, duas professoras detestavam, principalmente, a minha insubordinação. Não sei se trata-se de uma das várias características de um TDAH, mas o fato é que sempre tive (e ainda tenho) horror a hierarquias. Por causa disso, elas eram as minhas parceiras mais frequentes. Sempre me faziam o "convite" e eu não tinha como recusar.

    Naquela época, eu costumava tirar boas notas e, com exceção de Matemática e Física (meus pavores), passava relativamente fácil nas matérias. Acho que isso deixava as duas ainda mais danadas da vida.

    Só não fui expulso porque a orientadora era minha fã. Até hoje não sei o motivo que a fazia gostar tanto de mim e, às vezes, até mesmo se indispor com as colegas para me defender. Freud explica. Talvez, nem ele.

    * Deixei um comentário em seu post "SEGUIR EM FRENTE APESAR DO TDAH" e estou ansioso por uma resposta. Seria a ansiedade desmedida mais uma característica do nosso transtorno?

    Um grande abraço!

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    1. Bom dia, Impulso.rsrs
      Desculpe-me se ando sumido mas a vida tá meio complicada. Pavor a hierarquias é sim uma característica do TDAH. Detesto também. Eu também tive minhas fãs entre as professoras e mesmo professores, mas não conseguiram impedir minha expulsão. Me meti numa encrenca danada.
      Ansiedade em excesso pode ser uma comorbidade, uma doença que pega carona no TDAH só pra nos 'facilitar a vida'.
      Um abraço
      Obrigado
      Alexandre

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  2. O problema de ter tdah é que passamos a vida mentindo pra nós mesmo sem saber que mentimos...

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    1. Tem razão, criamos estratégias pra levar a vida que não passam de ilusionismo. Uma forma de nos enganar e permitir um mínimo de convivência com o TDAH.
      Obrigado pela participação.
      Alexandre

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    2. E o pior a maioria das vezes somos mal interpretados como pessoas de pouca confiança.

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  3. Um breve comentário....rs
    Tenho acompanhado seu blog e do Fernando "ALMA FRENÉTICA" e fico maravilhado com a riquesa do vocabulário a coerência do texto. Fico me perguntando se é culpa do TDAH que não me permite assimilar o bom português ou se sou burro mesmo. Digo isso porque não consigo colocar para fora as coisas que sinto desta forma, com tanta clareza. Até formúlo de forma clara meus pensamentos mas quando vou dizer algo ou tentar escrever, pronto! Tudo fica sem sentindo ou sem continuidade e com uma porção de erros de português e olha que procuro ler bastente e costumo fazer revisões nos meus textos. Coisa que não vou fazer agora para que você veja como a coisa é séria. Se você tiver uma dica de como lidar com isso lhe seria muito grato, pois ja to começando a achar que não tem jeito mesmo.
    Um grande abraço!

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    1. Bom dia, Marcus!
      Não vi nada de grave ou sem sentido no que escreveu acima. Português é uma língua difícil pra caramba, se você entregar meu texto pra quem entenda vai encontrar um monte de erros. Nós portadores somos críticos demais com a gente mesmo, característica que se soma ao complexo de inferioridade que desenvolvemos ao longo de uma vida repleta de críticas.
      Escreva, te garanto que vai se surpreender com o retorno. Sem contar que é uma catarse.
      Obrigado e um abraço.
      Alexandre

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  4. Posso ingerir bebidas alcoolicas?? E ruim neh??
    redbull ajuda pra ficar ou prejudica? nun ehn possivel minha cabeça não tem nada ! nem parece que tenho neuronios

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    1. É ruim mesmo!
      Redbull é um suco de cafeína, mais nada.
      Álcool pra mim é igual a qualquer droga, os donos de destilaria e fábrica de bebidas em geral deveriam estar na cadeia. Não conheço nenhum benefício, a não ser pra quem vende.
      Trate-se e vai descobrir uma vida nova. Apenas a ritalina(ou outro medicamento qualquer) não resolve, precisamos de um apoio psicológico. Converse com seu médico sobre comorbidades, umas doenças associadas ao TDAH que surgem pra piorar nosso quadro.
      Obrigado e boa sorte.
      Alexandre

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  5. Voce ja ouviu falar que ritalina é a cocaína legalizada? eu ja e é isso que me impede de me tratar.

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  6. Por isso a ignorância é tão perigosa. Um monte de ignorantes espalha essa 'asneira' por aí e muita gente que precisa de um medicamento fica com receio de tomá-lo. Obviamente qualquer remédio tem seus efeitos colaterais, até aspirina tem ( meu pai só pode tomar a aspirina revestida pois ela ataca seu estômago), mas o importante é o benefício que ele pode trazer pra sua vida. Eu tenho 51 anos, sou uma pessoa relativamente bem informada, apoiei-me em profissionais seríssimas e tomo ritalina a 1 ano. E sinto-me muito bem.
    Dê uma chance a si mesmo.
    Um abraço

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  7. oi meu nome é solange, tenho um filho de 10 anos que foi diagnosticado a 1 ano com o TDAH, esta tomando a ritalina de 10 mg a 6 meses e realmente vi melhoras nele, principalmente na escola
    um abraço a todos

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    1. Que bom, Solange!
      É sempre importante depoimentos como o seu, que corroboram a melhora e o progresso de quem usa a Ritalina.
      abração e obrigado
      Alexandre

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  8. boa tarde meu nome é daniela e tenho um filho de 14 anos que foi diagnosticado com o tdah desde os 6 anos. No começo fiz o tratamento com ritalina e deu muito resultado, logo depois o médico mudou para o concerta e meu filho parecia um zumbi, enfim parei com a medicação. Como ele vinha muito mal na escola (aos 10anos) retornei ao médico e começamos novamente com a medicação, parei de novo. Agora com 14 ele esta radical demais, esta muito estourado, qualquer coisa ele reclama, briga com todo mundo, sem paciência, não se alimenta direito e esta com tic (fica balançando a perna toda hora e não consegue parar). já reprovou duas vezes no ensino fundamental. Devo voltar ao médico e dar a medicação? peço orientação não sei o q fazer...

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    1. Boa noite, Daniela!
      Olha, creio que a melhor solução é voltar ao tratamento. Tente outro médico, se isso, for possível.
      Um abraço e boa sorte
      Alexandre

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