sábado, 9 de junho de 2018

TDAH PARALISANTE








Existem momentos em que o TDAH  deseja  ficar quieto, absolutamente quieto. O mundo é uma ameaça. Corre-se o risco de sair à rua e dar de cara com alguém conhecido. E numa daquelas situações em que não há como fingir que não viu; coisa tão comum para um TDAH.
O único movimento perceptível é o polegar no controle remoto da TV. Até a respiração é controlada para não quebrar a letargia...
Nem mesmo a lembrança da data limite para quitar um boleto sem multa, rompe a inércia. O TDAH nutre a inércia.
Submergir... Submergir...
Os compromissos assumidos para aquele dia passam como flashes na mente entorpecida. É preciso sair...
O corpo está pesado... Um enorme cansaço mental domina a vontade...
Desculpas esfarrapadas a serem dadas àqueles deixados de lado povoam a mente.  Histórias intrincadas e complexas, elaboradas com riquezas de detalhes se misturam aos borrões coloridos da tela da TV.
O ruído da TV é incômodo, mas é menos pior que o estrondo dos pensamentos descontrolados quando o som é cortado.
Uma partida de futebol, um filme, um reality show, receitas fitness, polishop, basquete, boleto atrasado, o corpo escultural, a falta de dinheiro, o pão de sal ruim da padaria, Papa Francisco, um show, jornal...
As horas passam, a culpa corrói... Uma leve ameaça de erguer-se do sofá dispara uma sucessão de pensamentos desconexos e paralisantes... A cabeça transborda de ideias pretéritas e futuras; o corpo cede ao peso de tantos pensamentos e se aquieta novamente. A velocidade dos pensamentos diminui, mas não cessa.
Levemente atordoado, o pensamento se fixa na culpa por não ter cumprido os compromissos e nas desculpas ultra complexas que deverão ser dadas amanhã.
O dia avança; geladeira, micro-ondas... O almoço das sobras de ontem... De volta ao sofá...
A tarde se insinua e uma enorme ansiedade pelo fim do dia toma conta da mente paralisada: o fim do dia útil trás consigo o fim da culpa.
Mas amanhã será diferente!
Quando formar tudo mudará completamente!
Quando mudar de emprego a motivação será outra!
Anoitece...
Finda-se o mês...
Esvai-se o ano...
Mas amanhã será diferente!
Saindo deste emprego maçante tudo mudará completamente...



16 comentários:

  1. Publiquei um texto agora justamente com a palavra "submerso", rs. Como sempre, suas palavras nos descrevem.

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  2. Sou exatamente assim. Tudo é motivo pra me entregar completamente à preguiça. Já passei finais de semana inteiros de cama. E ao mesmo tempo, nem aí e me culpando por negligenciar tudo a minha volta, mesmo se está tudo prestes e desmoronar em cima de mim.
    Quando eu era criança, não era assim. Só fugia de situações em que eu fosse exposta a passar vergonha.
    Hoje em dia fujo de tudo, até do que eu sei fazer.

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    1. Já tive depressão severa, e mesmo assim, não tinha essa letargia que tenho hoje. Na depressão, apesar de não encontrar motivação pra nada, eu vivia em "choque de realidade" e não me desapegava das responsabilidades.
      Agora nem isso.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Sem palavras para descrever a exatidão deste texto....mas amanhã eu consigo encontrar!

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  5. Não aguento mais este ciclo, sexta-feira saí mais cedo do serviço sem avisar meu chefe para procurar ritalina, amanhã terei que falar o motivo. Kkkkk
    Em todos os meus empregos eu penso a mesma coisa, preciso trabalhar em algo que gosto, estou achando que não gosto de nada.

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  6. Exatamente assim. Fui diagnosticada com TDAH e amanhã começo meu tratamento com Ritalina. Terça completo meus 30 anos.
    Antes tarde do que nunca!

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  7. Eu nao gosto de apelar pra nenhuma formula magica pra resolver meus problemas de organização e sei que isso nao existe, senão esse exclente blog nem existiria. Mas depois de começar o tratamento com a ritalina (cheguei agora nos 30mg LA) percebi os beneficios que ela pode trazer na minha vida e rotina. Mas tem a porcaria do habito arraigado há decadas e esse ciclo de derrota auto imposto de deixar as coisas pra amanha, isso ela nao resolve, infelizmente.
    Comecei a leitura do livro "O poder do hábito", eu na condição de ateu tenho um certo nojo de gurus New Age (Tole, Osho, Jesus que nem é tao new age assim etc) e essas formulas magicas da auto ajuda que nao resolvem nada na minha vida, apenas na vida de quem vende essas ideias que vão de livros e tratamentos alternativos com cristais, florais até alguns extremos, como andar na brasa da fogueira e evocar exus e entidades milenares xamanicas (rs).
    Voltando ao livro, depois que comecei a le-lo, percebi que nao era mais um desses, é apenas uma tradução pra uma linguagem mais acessivel a leigos sobre neurociencias e os estudos mais recentes sobre os habitos e como eles se formam. Comecei a seguir a risca certas coisas que vi por la e melhorei significativamente meu senso de compromisso atraves de uma simples corrida diaria de uma hora na beira do rio. Aconselho a leitura, o livro é facil de ser encontrado nas livrarias e gratuitamente em links na internet.
    Mais um excelente texto alexandre, muito obrigado por compartilhar suas reflexões e experiencias.

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    1. Concordo um excelente livro mesmo, tudo bem que quando o tdah está "atacado" parece q nenhuma dica nenhum conhecimento adianta você volta a estaca zero como se não soubesse de nada. Mas os conhecimentos dele me ajudaram bastante.

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    2. Legal que eu tambem li esse livro e comecei a me exercitar tambem, mas eu costumo andar de bike, mesmo na loucura aqui de sao paulo da pra dar uma melhorada

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  8. Ah eu me encontro nesses textos... Uma tdha na pior fase...

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  9. Quem tem fator RH - ? FAVOR RESPONDER, ESTOU FAZENDO UMA ENQUETE.

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  10. Incrivel a riqueza de detalhes desse texto, descreveu exatamente a situação em que me encontro 80% das vezes. "Os compromissos assumidos para aquele dia passam como flashes na mente entorpecida. É preciso sair...
    O corpo está pesado... Um enorme cansaço mental domina a vontade..."

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  11. Fui diagnosticado há poucos meses, tenho 55 anos, e comecei a medicação mas ainda não acertei a dosagem diária. Eu próprio não me entendia e agora seguindo esta página me identifico em quase tudo. Bom saber que não sou o único nesta batalha e que existe como enfrentá-la e vencê-la. O que passou passou, os prejuízos ficaram no passado. Vamos em frente!

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