terça-feira, 23 de dezembro de 2025

TDAH: OS SINTOMAS SE ENTRELAÇAM








Em geral vemos os sintomas do TDAH sendo tratados de forma estanque, como se fossem individuais, cada um ao seu tempo e sua hora. Nada mais errôneo. O TDAH não é como uma salada, onde os ingredientes vêm separadamente numa mesma tigela, não, o TDAH é um patê, onde os ingredientes são homogeneizados transformando uma fusão de sabores em um novo sabor. Tornando as reações dos portadores ainda mais complexas e potencialmente mais lesivas a nós mesmos e a quem nos cerca.
Vamos imaginar uma situação corriqueira e banal: devemos pagar contas em datas determinadas, temos que comparecer à este ou aquele compromisso em data e hora marcados. E quase sempre não cumprirmos. Para minimizar essas falhas baixamos um app recomendado para TDAHs.
Num dia dez da vida no meio da manhã soa a notificação de pagar tal conta. Aquele estava sendo um dia atribulado, pressão no trabalho, atraso nas demandas da chefia. Uma rápida olhada no celular e simplesmente ignora a notificação.
Mas, como precaução, sabedores da possibilidade de ignorar a tal notificação, o TDAH programou outras duas, além de mais um lembrete de aniversário do fulano. E as notificações se sobrepõem, o aviso sonoro se repete, o telefone na mesa não para de tocar, a chefia já mandou duas mensagens cobrando a demanda atrasada... E soa o lembrete do aniversário do fulano. Uma ira cega invade a mente, aquele barulhinho insuportável, o telefone que não para, o chefe que cobra... 
"Desinstala essa merda de aplicativo" baila na mente. "Desinstala". Não precisa de outra sugestão. Em menos de um segundo o app é desinstalado. Um enorme alívio, uma sensação de liberdade e a certeza de que ao final do dia se lembrará de pagar a conta. O aniversário do fulano é bom, mas nada de tão importante. 
Um dia de liberdade... 
Dois dias de liberdade... 
A Internet foi cortada. Jesus, a conta! Não foi paga. Aquele lembrete de dois dias atrás era a data limite. O limite do corte. E cortaram. 
Uma sombra toma conta da mente, no app desinstalado tinham vários outros compromissos, muitos de trabalho. Para tudo, reinstala o aplicativo, entra de novo com sua conta e o app carrega os compromissos agendados. Várias notificações das últimas setenta e duas horas saltam diante do olhar atônito... Mais contas, ligações, e hoje, hoje, ligar para o fulano e oferecer tal contrato ou produto ou projeto. O fulano cujo aniversário foi ignorado há três dias. O fulano foi esquecido e agora é preciso entrar em contato para oferecer algo. Uma simples mensagem formal de feliz aniversário poderia ter facilitado a abordagem de três dias depois. Mas não, o lembrete foi deletado como inconveniente e o cliente ignorado. 
Milhões de desculpas e mentiras assaltam a mente. Não se trata de um amigo, mas de um cliente importante e vaidoso cuja mensagem de parabéns seria notada. E o pior, a chefia havia passado a data e a recomendação de que a mensagem fosse enviada. A desculpa, ou mentira, teria que ser verossímil para ambas as partes. E o pior, a Internet foi cortada. A desculpa, teria que ser criada e posta em prática agora, em pleno horário de trabalho interrompendo todo o fluxo de rotina da empresa para que se resolva algo que deveria ter sido feito há três dias. A semente do destempero está plantada. Um turbilhão de desculpas inundam a mente, pressionado pelo pouco tempo, pela necessidade de retomar o trabalho, pela urgência em contatar o tal cliente, uma desculpa qualquer é escolhida e posta em prática. Os resultados são previsíveis. Ainda que não seja um desastre completo, as marcas das sucessivas desculpas, dos atrasos recorrentes, dos erros sucessivos ficam gravados na imagem do funcionário TDAH. 
O somatório dos sintomas explodem simultaneamente trazendo consequências nefastas e, muitas vezes, irremediáveis. Ao esquecimento e desatenção, somaram-se a irritabilidade, impulsividade e autossabotagem, tornando o ato de notificar o pagamento de uma conta e um lembrete de aniversário em  um enorme problema de trabalho com consequências seríssimas. 
Assim são todos os nosso dias. Ou todos os nossos instantes. Precisamos estar alertas para que essa enorme onda de sintomas não se transforme num tsunami que nos arraste, arrastando junto quem nos cerca ou aquilo que nos dá segurança e ou sustento. 
Assim como o TDAH é um conjunto de sintomas, seu enfrentamento pede um conjunto de ações. Medicamentos por si só não resolvem, mas se acrescidos de uma boa terapia, um fundamental conhecimento do transtorno e um necessário mergulho em si mesmo, se torna uma ferramenta poderosa de bem viver. 

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

TDAH E O PARADOXO DOR E SONHO

Quando a vida se acinzenta. 
Quando tudo se perdeu. 
Quando de tudo se abriu mão. 
Quando nada parece ter sentido. 
Surge o TDAH em sua plenitude. 
A realidade árida é sobreposta por feéricos sonhos que se sobrepõem e se antepõem a esquálida vida cotidiana. 
Não há momentos de tédio ou de reflexão, ao menor sinal de desocupação, uma fantasia salta diante dos olhos. 
O TDAH que destruiu a realidade oferece os lenitivos para que essa dor não pareça tão lancinante. 
Saltando de fantasia em fantasia não se sente a dor, mas não se aprende com ela. 
Seguimos dopados, anestesiados pela overdose ficcional e blindados a qualquer chance de aprendizado com a dor e a vida.
Imunes à dor, mas por isso mesmo, com o peito aberto e exposto à novas e intermináveis dores. 

sábado, 13 de dezembro de 2025

TDAH DE FORA PRA DENTRO


"É preciso sair da ilha para ver a ilha.
Não nos vemos se não saímos de nós"
(José Saramago) 

É preciso sair para mergulhar em si mesmo? Prego aqui nesse espaço, há quinze anos, que o melhor auxiliar no tratamento do TDAH é o autoconhecimento. E tentarei explicar o porquê.
Em geral, levamos a vida aos trambolhões, levamos uma vida reativa, uma vida na defensiva. Desde pequenos erramos mais que os outros, somos punidos ou advertidos mais que os outros e, com isso, nos justificamos mais que os outros, tentamos mais que os outros. E, normalmente não conseguimos. A adolescência e a vida adulta em nada diminuem essa vida de justificativas e tentativas frustradas. Só nos erguemos para repetir as quedas anteriores num redemoinho infinito de desacertos. Inconscientemente criamos estratégias para minimizar as falhas e, em vão, tentamos acompanhá-las para que funcionem.
Como poderemos envoltos nesse turbilhão nos autoconhecer?
Quando fui diagnosticado TDAH, automaticamente comecei uma revisão do meu passado. Eu já tinha cinquenta anos e tinha bastante passado para analisar. E ali comecei a perceber as divergências entre o que eu queria e sonhava e o que acabei fazendo premido pelas circunstâncias impostas pelo transtorno. A partir dessa descoberta comecei a pensar em quem seria eu sem o TDAH. 
O que eu sonhava aos dezoito anos?
O que eu queria estudar, que tipo de vida queria levar, quem eu queria me tornar?
E hoje, quem sou eu? Como me posiciono diante dos meus sentimentos?
A partir daí volto-me para o TDAH. Quais os principais sintomas? Onde enxergo nitidamente esses sintomas em minha vida? Onde fui impulsivo, onde explodi, onde procrastinei ao ponto de me prejudicar, onde fui desatento ao ponto de me causar perdas, onde, como e por que perdi os amigos... Pode parecer algo impossível para um TDAH lembrar, mas não é. As grandes falhas, os erros mais grosseiros não nos abandonam, sempre dançam em nossa mente após cada nova falha. E aqui vai um parêntese explicativo aos não TDAHs: o fato de não nos esquecermos dos grandes erros não significa que vamos reconhecer que estamos caminhando para cometê-los novamente. Erraremos de maneira muito semelhante, mas não reconhecemos antes que seja muito tarde.
Pois bem, o que chamo de autoconhecimento é uma comparação entre aquilo que eu desejava e os sintomas do TDAH.
Imaginemos uma situação profissional: detectamos processos falhos, mal feitos, negativos na empresa em que trabalhamos. Na posição que ocupamos, esse seria um diagnóstico desejável. Elaboramos um belo relatório com a situação atual e o que pode ser melhorado. E esse relatório jamais sai do  computador. Simplesmente não é enviado. Ao longo do tempo nos mantemos fazendo o básico e não cumprimos a expectativa que tinham de nosso desempenho. De repente, a demissão. Uma desculpa fajuta e tudo acabou. A solução poderia estar no relatório, na capacidade de análise e soluções, mas tudo ficou no computador.
Vamos juntos sair da ilha em que nos confinamos e enxergar toda essa ilha, seus contornos, suas praias, sua fauna e sua flora, aquilo que ela tem de bonito, mas também o que não é tão bonito assim. Sejamos imparciais, mas carinhosos com nossos erros, já temos problemas demais para atuarmos como nossos próprios carrascos. 

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

O TDAH E O TORNADO MENTAL


Um turbilhão de sensações, sentimentos, pensamentos, se confrontam, se sucedem, se atropelam, se chocam e entrechocam, se encerram e reiniciam.
A mente esgota-se , o corpo exaure-se , a vida pesa , o cansaço domina como se a hiperatividade mental adulta ainda fosse aquele frenesi físico da infância e adolescência.
O foco é abalroado por pensamentos desconexos, ideias estapafúrdias, sentimentos Inconvenientes,
sempre em horas e locais impróprios, gerando reações desproporcionais, consequências funestas, falas intempestivas, risos inexplicáveis, choros incompreensíveis.
Erguido pelo tornado mental, em outros momentos a mente bóia num torpor quase irreal, entrando 
em um estado de inércia meio hipnótico , incapaz de respostas razoáveis, de fluxos contínuos de pensamento, de concatenação de ideias.
O TDAH experiente cria artifícios exteriores para manter a aparência de normalidade. Balbucia generalidades enquanto trava um titânico duelo mental para reassumir o controle. Muitas vezes a racionalidade dança diante de nós, mas a uma distância segura para que não a agarremos. Flashes da realidade levados pelo tornado se apresentam e se escondem em velocidade feérica.
Assim como enfureceu, o tornado acalma, diminui de ritmo permitindo que a racionalidade reassuma o controle. A realidade, antes em flashes, volta a ser inteligível e a vida retoma seu rumo.
Como num tornado real, as consequências variam com a sua intensidade. O nível de estragos podem ir de modestos a devastadores com consequências irreversíveis.
O que resta é a necessidade e a capacidade infinita de reconstrução, mas como toda reconstrução o resultado é diferente do que havia. O que existiu foi arrastado, tragado, destruído, o que ressurge pode até parecer melhor, mas as marcas da tragédia não se apagam.



 

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

UM TSUNAMI DE TDAH!


Um terremoto ou um vulcão nas profundezas do oceano libera uma quantidade absurda de energia capaz de criar ondas gigantescas que viajam em alta velocidade até atingir tragicamente a costa, arrasando tudo o que encontram pela frente.

​Quem vê o tsunami se aproximando ou quem é atingido por ele jamais será a mesma pessoa. A dor devastadora de um tsunami é inesquecível. Mas o tsunami não sabe disso. Na sua mente, o terremoto ou o vulcão que o originaram são visíveis a todos os atingidos pelas ondas trágicas. Um tsunami de impropérios e agressões verbais deixa, normalmente, o objeto do tsunami completamente paralisado, indefeso, aterrorizado. Quem assiste à chegada das ondas desembestadas estarrece-se com a malignidade de suas consequências. As feições do tsunami alteram-se, a raiva domina cada músculo da face, mostrando-se no olhar quase ensandecido. A violência das ondas atinge em cheio sua vítima. Dores passadas aparentemente esquecidas, traumas não curados, conexões mentais entre fatos desconexos, paixão descontrolada desabam inclementemente sobre a "vítima" da vez. Na mente tsunâmica, uma espiral de raiva alimenta-se da frase anterior, do sentimento precedente e escala vertiginosamente. Na virulência das palavras, a visão tolda-se de um vermelho vivo e a raiva cega arrasa o que se lhe interpõe. Ainda que provocados por terremotos pretéritos, por vulcões recentes, a destruição de proporções bíblicas deixa o tsunami exposto a todo tipo de críticas e cobranças. A razão que o causou, na maioria das vezes, não justifica a catástrofe provocada pela resposta desproporcional. A onda arrasadora reflui e desaparece, seja porque a vítima já está aniquilada, seja pela intervenção externa. Abruptamente como chegou, vai-se. O saldo é tragédia, um rastro nefasto e destruidor. Mas o tsunami já se recolheu ao oceano. E a fúria desapareceu. Magicamente desapareceu. Aqui começa a segunda etapa: a culpa. Nem sempre o arrependimento, mas sempre a culpa pela magnitude do estrago.

​Não há liberdade definitiva para as explosões titânicas do TDAH. Tsunamis, terremotos, vulcões, tragédias ambulantes, o portador de TDAH é uma hecatombe prestes a ocorrer.

​Segundo o filósofo Baruch Spinoza, "quando entendemos nossas emoções, nos aproximamos da verdadeira liberdade, pois essa compreensão nos permite agir com clareza e consciência, em vez de sermos dominados por paixões e impulsos." É isso! Mergulhe em você e no TDAH. Viva seu TDAH! Pense nele diariamente, pense em quem você realmente é e onde o TDAH atua em você.

​Assim, você entenderá que calar-se é maior do que explodir, retirar-se é melhor do que destruir o outro e tornar-se o culpado. Ninguém se lembrará do que ele disse, mas do tsunami que desaguou sobre ele de maneira violenta e desproporcional. Parece simplista, mas não é; parece fácil, mas não é. Muito menos é infalível. Os medicamentos atuam parcialmente, nesse ou naquele sintoma. Às vezes, em alguns dos sintomas, mas a variação de humor costuma ser combatida com outro medicamento. E, assim, vai-se entupindo de tarjas pretas que não solucionam integralmente.

​Sinta antecipadamente o gosto amargo da fúria que se aproxima. Anteveja o toldo vermelho que se formará diante de seus olhos. Mude a trajetória do tsunami. Proteja-se!

​Não traga para sua vida mais esse ônus de ser o culpado de estragos irreparáveis.

​Já temos acusações demais a carregar.

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

O TDAH COMO UM CONJUNTO DE AUSÊNCIAS

O TDAH não existe como persona. O TDAH é um conjunto de ausências

Ausência de memória prática, ausência de controles executivos, ausência de foco, ausência de sentido de continuidade...

Seu controle exige armas que não temos: atenção, foco, persistência...

Conheça-se! Pense sobre você. O que realmente gosta, o que sente, quem é você quando ninguém está vendo, quem você gostaria de ser... Não como profissão, como pessoa.

Conheça o TDAH! Leia e se informe e confronte com aquilo que você realmente é, aquilo que realmente sente. E você começará a enxergar onde o TDAH atua em você. Você queria ser focado, mas é dispersivo... A dispersão é o TDAH. Procure ajuda. Ajuda de quem te ama em primeiro lugar. Se essa pessoa não acredita na doença procure uma amizade, uma ajuda médica... Não enfrente solitariamente. Palavras de quem enfrentou e perdeu. Abra seu coração a alguém de confiança: me ajude a perceber que estou me dispersando.

Se não for possível, tente roteirizar seu dia, sua vida. Inunde-se de lembretes, gatilhos, estímulos que te faça retomar o rumo do seu objetivo ou de sua necessidade. Tenho um grande amigo de TDAH que tem uma secretária que é seu anjo da guarda. Cuida de tudo em sua vida. Uma ajuda externa não TDAH é de enorme valia. Se não for possível, use os grupos de TDAH, leia sobre o assunto, não deixe que ele adormeça. Alguém me disse certa vez: A FÉ DEVE SER PRATICADA!  É isso, o TDAH também. Por isso retomo o meu blog, retomo o grupo do Facebook, retomo o controle do TDAH. Perdi muito por tentar enfrentá-lo sozinho. Hoje já tenho apoio externo, mas quero poder dividir esse apoio com cada um de vocês. Apoiando e sendo apoiado. 

terça-feira, 7 de outubro de 2025

A BATALHA DO TDAH


Vivemos sozinhos.
Somente nós podemos avaliar a convulsão de  pensamentos e sentimentos que nos inundam a alma. Os impulsos que nos movem. As lutas internas que combatemos cotidianamente.
As batalhas morais entre o certo e o desejado. A vontade e a norma. O ânimo e a morte na alma. 
Enfrentamos os medos diários, aquele clássico que é descobrirem a fraude que acreditamos ser. De nos descobrirem TDAHs. De não acreditarem em nossas palavras. Pior, em nossas intenções.
Somos marcados pelo ferro em brasa da descrença. Nossos olhos flamejam inconsequência. Nosso rastro é a marca da impulsividade. Exalamos desatenção e desastre.
Nesse momento, milhões de homens e mulheres, crianças e idosos, enfrentam batalhas semelhantes. E vencem ao fim do dia. Nem todos vencem todos os dias, mas a maioria vence na maioria dos dias. E ao terminarmos o dia teremos vencido os desafios externos e os desafios internos. Temos dupla jornada. E a maioria de nós vencerá na maioria dos dias.
E vencemos os descrentes e suas críticas. 
Vencemos os que fingem acreditar enquanto nos caluniam na ausência.
Vencemos os que duvidam, os que apontam o dedo, os que demitem, os que ironizam, os que vitimizam, os que... 
Vencemos... 
E aqueles que não venceram não são dignos de pena ou comiseração. Não!
O TDAH que nos derruba é o mesmo que nos ergue na manhã seguinte prontos para as múltiplas batalhas que hão de vir. 

sexta-feira, 3 de outubro de 2025

TDAH, VIVER PARA AMAR!




                                               Praia do Acaica, Piúma - ES


Há quem acumule dinheiro,

Há quem acumule conhecimento,

Há quem acumule títulos.

Eu? Eu acumulo amor.

Não rasgo dinheiro,

Não desprezo o conhecimento,

Muito menos os títulos...

Nada disso me fascina,

Só o amor me faz vibrar a alma,

Só o amor me toca o coração,

Me sinto pleno quando amo

Mais criativo

Mais motivado

Mais feliz...

Amar transforma a vida

Amar faz a vida melhor...

Porém,

Não duvide do meu amor,

Não tripudie do meu amar,

Isto fere de morte uma almardente...

E não há salvação!

Sei que o mundo despreza tal entrega,

Sei que muitos hão de zombar de mim,

O que me importam os cartesianos?

Nada! Absolutamente nada!

Sou irrecuperável, sou vítima do TDAH:

TRANSTORNO DO AMOR HIPERATIVO!



terça-feira, 30 de setembro de 2025

A LENDA DO PRÍNCIPE COM TDAH: O MONSTRO DA INSATISFAÇÃO E O CASTELO DA SOLIDÃO





Nota do Autor (Atualizada em 2025): Escrevi esta lenda há anos, mas ela nunca foi tão atual. Ela fala sobre o "custo invisível" do TDAH não tratado: a insatisfação crônica que corrói sonhos e patrimônios. Muitos de nós crescemos ouvindo que éramos "príncipes" (cheios de talento), mas acabamos nos sentindo mendigos de nossa própria vontade. Se você já se sentiu um estranho no seu próprio castelo, esta lenda foi escrita para você.


Conta a lenda que no interior de um reino distante vivia um príncipe jovem, belo, rico e muito, muito triste. Vivia solitário em seu castelo, cercado de luxo e tristeza.
O príncipe não foi assim na sua vida inteira. Na adolescência foi um rapaz ativo, cheio de amigos e sonhos. Ele não sabia, mas no fundo de sua alma ele cultivava um monstro que mais tarde o dominaria: a insatisfação. Ao atingir a idade adulta o príncipe perdeu-se. Encantou-se e frustrou-se com vários cursos superiores; experimentou várias profissões; das mais nobres às mais plebeias; tentou as artes: o teatro, a música, a literatura. Nada. 
Após um início promissor em quase tudo que experimentava, o príncipe era invadido por uma insatisfação que o dominava completamente, paralisava sua vontade, suas ações, sua coragem. E ele abandonava mais aquela tentativa. Ganhava mais uma cicatriz, mais uma marca naquela alma já tão repleta delas.
Os sucessivos fracassos e abandonos foram criando naquele príncipe uma tristeza e um constrangimento cada vez maiores. Passou a evitar seus pares; não tinha do que se vangloriar, tornou-se ácido crítico da nobreza de seu país chamando-a de sanguessuga e parasita da sociedade. Começou a ser mal visto pela casta superior que passou a isolá-lo.  Por viver num reino onde a rigidez social era a regra, começou a isolar-se de todos. Longe dos nobres por opção e das classes baixas pelo rígido costume de seu país, o príncipe fechou-se em seu castelo vivendo para os livros e os parcos escritos que produzia. Somente quando era absolutamente necessário, comparecia às solenidades reais onde era alvo de chacotas por usar sempre as mesmas roupas desgastadas e antiquadas. Sua absoluta incompetência para gerir a fortuna que herdara era folclórica no reino e alvo de piadas e escárnio nas altas e baixas rodas sociais.
Ao atingir a meia idade o príncipe havia vendido quase todas as suas terras, títulos e obras de arte. Desfizera-se também de laços de afeto e amor e via-se na iminência de ter de vender seu castelo e acabar sozinho e abandonado numa casa modesta que outrora fora ocupada por uma das criadas de sua mãe.
Vagando pelos enormes aposentos do castelo o príncipe procurava algo que explicasse sua eterna e profunda insatisfação. Olhava para trás tentando encontrar em sua vida pregressa o momento em que foi dominado por essa doença; uma estranha doença que transformou sua vida num redemoinho infinito.
Um sofrimento difuso e silencioso tomava cada fibra de seu corpo, lhe oprimia o peito e tolhia sua iniciativa de reerguer-se.
Quem olhava de fora estranhava e ridicularizava a vida aparentemente infrutífera daquele príncipe. Riam da sua incompetência para a vida, para ganhar dinheiro, para manter seus casamentos, seus amigos e sua posição social.
Mas lá dentro, na solidão escura do castelo, o príncipe lutava para abrir as janelas enferrujadas e emperradas na desesperada esperança de que a luz do sol e o ar puro renovassem suas forças , as forças de sua alma, e iluminassem um novo caminho em sua vida; menos sujeito à ação desse terrível monstro da insatisfação. 
Ao mesmo tempo, sonhava com o dia em que os cientistas do reino descobririam a cura para essa estranha doença que praticamente incapacita pessoas inteligentes e de físico perfeito para uma vida plena, feliz e produtiva.


"Reflexão de 2025: A boa notícia é que, ao contrário da lenda, nós não precisamos mais esperar que os cientistas do reino descubram a cura. Hoje, a ciência já abriu as janelas desse castelo. O diagnóstico e o tratamento multimodal são a luz do sol que o príncipe tanto buscava. Se não trouxe a cura, trouxe um convívio mais saudável e produtivo para os portadores de TDAH. A insatisfação ainda pode nos visitar, mas ela já não tem as chaves do nosso castelo."

Para entender como reerguer o seu reino interno, procure ajuda especializada e conheça o trabalho da ABDA.

Você já sentiu que o seu 'castelo' estava desmoronando por causa da insatisfação? Deixe seu comentário e vamos reconstruir nossas histórias juntos." 

MEU AMOR É TDAH! E AGORA?






Recebo sempre um monte de perguntas sobre qual a melhor maneira de se conviver com um portador de TDAH. A maioria, de namoradas em busca de um mapa da mina que as leve à paz celestial ao lado de uma pessoa que amam, mas que não entendem.
Vamos ao mapa da mina: se alguém tiver me mande, eu também não tenho.
Sempre digo a mesma coisa, ou quase:
A) Evite bater de frente com um TDAH. Na maioria dos casos não conseguimos discutir num nível elevado de educação e partimos para a ignorância; e quando começamos não temos limite. Ofendemos o 'oponente' até a oitava geração.
B) Não conseguimos conviver muito tempo sob pressão. Ou seja, até tentamos atender às exigências e pressões da pessoa amada mas, de repente explodimos. Imagine um cavalo dócil que, de repente, empina, corcoveia e atira seu cavaleiro ao chão. Sem nenhuma explicação aparente, apenas cansou daquela vida.
C) Tente respeitar os momentos de introspecção e silêncio de seu TDAH; normalmente estamos 'viajando' em nós mesmos. Apenas isso. Noutras vezes, podemos estar meio cabisbaixos, tristonhos, mas isso passa, em geral sem ajuda de ninguém.
D) O que gostamos, amamos; o que não gostamos, odiamos; simples assim. Tente respeitar isso, principalmente aquilo que odiamos. Uma ótima maneira de brigar com um TDAH é tentar obriga-lo a gostar do que odeia e vice versa.
E) Goste de emoções fortes; goste de andar de montanha russa, assim será sua vida.Não conseguimos viver linearmente, precisamos e procuramos emoções fortes e variadas. Isso pode ser através de sexo, esportes radicais, brigas conjugais, músicas, ou simplesmente mudar radicalmente de vida sem avisar à ninguém. Nem a nós mesmos.
F) Temos muitos medos, muitos mesmo. Podemos temer o futuro; podemos temer mudanças; podemos temer confrontos; podemos temer riscos. Mas caminhamos celeremente em direção a todas essas situações. Incoerência? Sim, bem vindo ao mundo TDAH. No capítulo confrontos, muitos de nós opta pela fuga, e deixa a namorada a ver navios desaparecendo por longos períodos, para um dia voltar como se nada tivesse acontecido, morrendo de saudades e amor.
G) Claro, somos complexados. Sofremos de forte sentimento de inferioridade. Dias hão que somos menos do que um pano de chão; esses são os dias bons. Os ruins, bem, nos ruins somos aquele caldo negro e nojento que sai do pano. 
Cuidado, frágil. Vá com calma, parecemos fortes e inexpugnáveis mas somos frágeis como cristal Bacarat. E valemos tanto quanto.
Por tudo o que disse você pode estar pronto pra fugir de seu TDAH amado, mas lembre-se: há algo em cada um de nós que não vai deixá-la fugir simplesmente. Já está enredada numa teia fina de amor, sedução, admiração, prazer, carinho e uma boa dose de surpresa sem a qual ninguém vive bem.
Não desanime, seu TDAH é complicado, volúvel, turrão, inconstante, mas acima de tudo é arrebatador!

sábado, 23 de agosto de 2025

TDAH: DESATENÇÃO É MAIS QUE ESQUECIMENTO!





Nota do Autor (Atualizada em 2025): Descobri o TDAH aos 50 anos. Até lá, fui rotulado de "egoísta", "irresponsável" e "desatento". Este texto é um desabafo e uma lição: a desatenção não é apenas esquecer a chave; é ler um contrato e não ver a cláusula que vai te prejudicar. É um modo de vida generalista que cobra um preço caro nos detalhes. Se você recebeu seu diagnóstico tarde, saiba que a culpa não era sua, mas o tratamento agora é sua responsabilidade.


Desatenção é muito mais que esquecimento. Desatenção é olhar sem ver, escutar sem ouvir, ler sem entender...  
Escrevi um post semana passada sobre um novo sintoma que descobri sobre o TDAH. Até descobrir que foi desatenção minha, e não um novo sintoma.  
Eu tinha que entregar o celular de uma cliente e o coloquei na mala. Chegando ao destino não encontrei o celular entre as minhas coisas. Fiquei arrasado, na minha mente eu me via colocando o aparelho entre roupas macias para protegê-lo. Pensei, minha mente está criando situações. E escrevi sobre isso. Horas depois a namorada encontrou o celular dentro da mala, preso num canto. O nome disso? Desatenção!  
Certa vez, nos tempos de inflação alta, comprei um terreno; ao elaborar o contrato de compra e venda a vendedora alterou a cláusula de reajuste, eu li e não percebi. Devo ter lido pensando em outra coisa. Acabamos num desgaste danado, desisti do negócio até que ela voltasse atrás. E a alegação dela era de que eu havia lido o contrato.  
Quantas vezes ouvimos parcialmente, respondemos ao que ouvimos e o interlocutor entende a resposta ao todo que ele disse... E novo desgaste... Novas brigas... Novas discussões...  
Só me descobri TDAH aos cinquenta anos de idade, imaginem tudo o que passei por não saber o que tinha. Apenas era um sujeito absurdamente desatento, folcloricamente esquecido, irresponsavelmente impulsivo, incrivelmente egoísta, e outros desairosos adjetivos que prefiro omitir.  
Sempre digo que não se deve sair dizendo aos quatro cantos que é portador de TDAH. Principalmente no trabalho, afinal pode ser usado como arma contra a pessoa. Mas num relacionamento é fundamental a verdade. Eu falo na lata. Empolguei com a pessoa já aviso. Isso economiza bons desgastes. E ajuda a avaliar aonde estamos entrando. Se a reação da pessoa for negativa, pulo fora. TDAH não tem cura, conviver com quem não entende, ou não aceita é auto flagelação.  
Não se atentar aos detalhes é outra característica do TDAH. Pra mim faz parte, ou está intimamente ligada à desatenção. Falta paciência de ler aquilo tudo... Falta atenção para olhar em todos os desvãos... Falta ânimo para cobrar todos aqueles detalhes que ficaram para trás... Uma vida generalista, sem detalhes. A solução é se aliar a alguém oposto. Desde que este alguém goste de controlar e corrigir e aceite bem esse papel. Estando consciente de que a desatenção é fruto de um transtorno e não de negligência ou preguiça, é menos difícil de conviver.  
Estamos vivendo a época de respeito às diferenças. A mídia cobra novos comportamentos, mas venhamos e convenhamos, na maioria das vezes, é mais fácil conviver com o macro, do que com as micro diferenças do dia a dia.  
Desatenção, falta de memória, Impulsividade, fazem parte do nosso pacote de diferenças e devem ser reconhecidas e respeitadas. E devemos exigir isso. Como devemos fazer a nossa parte: o tratamento. TDAH não é muleta para continuarmos fazendo o que queremos. Não, é um transtorno tratável; e por amor e respeito a nós mesmos e aos que nos amam e convivem conosco, devemos tratá-lo.  
TDAH sem tratamento, em geral, quer salvo conduto para agir impunemente.  


sábado, 26 de julho de 2025

SAMBA DO TDAH DOÍDO: UMA PARÓDIA SOBRE A VIDA COM O TRANSTORNO







Nota do Autor (Atualizada em 2025): Encontrei esta paródia perdida nos meus arquivos e não pude deixar de compartilhar. Inspirado no mestre Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta), fiz essa letra para contar como foi crescer TDAH em Juiz de Fora, na terra do Itamar Franco, quando a gente era chamado apenas de "insolente". É uma forma leve de olhar para uma história de "muita derrota e pouca glória". Alô, sambistas de plantão: quem topa gravar esse som comigo?




    PARÓDIA DO SAMBA DO CRIOULO DOIDO DE STANISLAW PONTE PRETA

Os mais velhos certamente se lembrarão de Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo do jornalista Sérgio Porto). Uma de suas obras mais conhecidas foi o SAMBA DO CRIOULO DOIDO, uma enorme gozação com a história do Brasil. Há tempos atrás eu fiz uma paródia desse samba e, nem sei por que, não a publiquei.
Publico agora e peço a todos um favor: se algum de vocês fazem parte, ou conhecem quem faz parte, de um grupo de samba ou pagode, eu gostaria de fazer um vídeo de samba pra postar no blog. Cantado é mais legal do que lido.
Aí vai; gostei bem do resultado: em negrito está a minha versão, abaixo dela a letra original.

Foi em Juiz de Fora, na terra do Itamar
(foi em Diamantina, onde nasceu JK)
Que a ironia do destino me fez nascer TDAH
(e a princesa Leopoldina arresolveu se casar)
Era o Brasil, de JK presidente
(mas chica da silva, tinha outros pretendentes)
E um menino hiperativo era visto como insolente
(e obrigou a princesa a se casar com Tiradentes)
La, la, la,la, la, la, laia,
La, la, la,la, la, la, laia
A vida começou a complicar
(o bode que deu vou te contar)
La, la, la,la, la, la, laia,
(La,la, la, la, la, laia)

A vida começou a complicar
(o bode que deu vou te contar)
Impulsividade,
( Joaquim José)
Desatenção.
(que também é)
Hiperatividade
( da Silva Xavier)
Eu era ligado na tomada
(queria ser dono do mundo)
Prenúncio de uma vida complicada
(e se elegeu Pedro segundo)
Era pipa e pião, era briga de rua, pulava carniça,
(das estradas de minas seguiu pra são Paulo e falou com Anchieta)
Futebol na calçada, banho de enxurrada, não tinha preguiça,
 (o vigário dos índios aliou-se a d Pedro e acabou com a falseta)
Era irrequieto, sonhava acordado, andava no teto,
(da união deles dois ficou resolvida a questão)
Um TDAH não descoberto
( e foi proclamada a escravidão)
Assim eu conto a minha história
(assim se conta esta história)
Muita derrota e pouca glória
(que é pros dois a maior glória)
Não fiquei casado com ninguém
(D. Leopoldina virou trem)
E hoje não tenho nem um vintém
(D Pedro é uma estação também)
Oooooo o meu tratamento enfim chegou
(oooooo o trem tá atrasado ou já passou)


"Reflexão de 2025: Se a história do Brasil já é uma confusão, imagine a história de um TDAH não diagnosticado. 'Andar no teto' e 'sonhar acordado' eram a nossa rotina. Se você é de Juiz de Fora ou de qualquer lugar desse Brasil e tem um pandeiro na mão, entre em contato! Vamos transformar esse post em música real.

Para entender a história real (e não a paródia) do TDAH, dê um pulo no site da ABDA.

O que achou da letra? Consegue ler sem entrar no ritmo do samba?"




domingo, 16 de março de 2025

TDAH: EXISTE VIDA SEM ELE?


" Hoje, em devaneios sem propósito nem dignidade que constituem grande parte da substância espiritual da minha vida, imaginei-me liberto para sempre..."
(O LIVRO DO DESASSOSSEGO - FERNANDO PESSOA) 

Sim, finalmente liberto, no meu caso, liberto da impulsividade, da procrastinaçao, da insatisfação, da inadequação, da...
Em essência me liberto do pacote que me trouxe o TDAH ainda na maternidade. Ou antes dela... 
Começo a viajar por uma vida sem essas características: uma vida de equilíbrio, plena de satisfação e amor próprio. Uma vida planejada, pensada, com tudo a tempo e a hora. Um banho de prazer toma conta de mim. Assim seria minha vida 'normal'. A cada tropeço identifico sua causa e não a repito. Reconheço seus sinais e rapidamente os evito. Sinto um enorme orgulho de mim. 
Ali estou diante de um enorme espelho d'água que reflete a paisagem ao meu redor. Estou em um campo tão perfeito que parece um cenário. Não há moscas, não há buracos, não há ervas daninhas... Nada. Olho ao meu redor e reconheço a paisagem, cada detalhe dela está refletida naquele magnífico espelho d'água. Mas estranhamente eu não apareço na imagem. Tudo ao meu entorno está ali. Cada mínimo detalhe da natureza que me cerca é refletido no espelho d'água. Menos a minha imagem.
Como num sonho absurdo, constato sem a menor surpresa que minha imagem não está refletida ali porque eu não estou presente. Eu não estou naquele cenário.
Eu não sou sem o TDAH. Não existo sem ele. Eu sou ele. 
Li que o álcool faz parte do corpo do vinho, intrínseco a ele...
Pois é. Sou indissociável do TDAH.
Sem ele não existe eu. 
Não há como combater o TDAH. Não há como curá-lo. Não se cura da própria existência ou essência.
Minora-se. Mitiga-se. Reduz-se. Convive-se. 
Combatê-lo. Enfrentá-lo. Derrotá-lo. Jamais! 
Nasce-se com ele, morre-se com ele. 

sábado, 15 de março de 2025

NÃO SOU !






Não sou o corpo no trabalho.
Sou a mente que foge a qualquer centésimo de segundo de oportunidade que se lhe apresente. 
Não sou o corpo cotidiano.
Sou as vidas infinitas vividas nos intervalos da minha mente fugidia. 
Não sou aquele que se dirige ao trabalho. 
Sou a mente que experimenta todas as sensações possíveis da vida. 
Não sou o autômato de cada dia. 
Sou a rebelião ambulante que ferve minha mente convulsionada pelo inconformismo. 
Não sou o repetitivo que veem. 
Sou a metamorfose, da metamorfose. Todas as metamorfoses possíveis na mente inquieta que me dirige. 
Não sou a apatia que carrego. 
Aqui dentro um vulcão em constante erupção me impede definitivamente a apatia. 
Não sou aquele em constante defensiva. 
Sou o impulsivo incorformado, forjado nas vidas que tive e nas que sonhei.
Meu edifício vital é uma amálgama de vidas vividas, vidas sonhadas, vidas sentidas, vidas perdidas... 
Grilhões mentais me prendem a esse edifício que arrasto ao longo da trajetória da vida. 
Não sei se pela idade ou pelo tamanho do edifício a cada dia me parece mais difícil carregá-lo. Mas eu sou ele, e ele sou eu. Não há como desvencilhar-me dele. 

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

E AGORA, JOSÉ ? O TDAH E O DESERTO DO ISOLAMENTO




Nota do Autor (Atualizada em 2025): Peço licença ao mestre Carlos Drummond de Andrade para emprestar seus versos imortais. Este poema nasceu de um momento de desamparo, quando a gente percebe que nem a Ritalina, nem o Coaching, nem a Terapia são muletas eternas. No fim do dia, somos nós e o nosso cérebro. É um texto sobre o peso de continuar, mesmo quando tudo parece ter mofado.



E agora, José?

A ritalina acabou,
a terapia acabou,
o coaching encerrou,
E agora, José?
e agora, você?
como vai viver,
você que esquece,
você que adia,
você que se irrita,
e agora José?
está sem mulher,
está sem emprego,
está sem tratamento,
e agora José?
você não deve beber,
você não deve fumar,
se controlar você não consegue,
a motivação esfriou,
a cura não veio,
a vida nova não veio,
o novo emprego não veio,
só veio a utopia,
e tudo acabou,
e tudo fugiu,
e tudo mofou,
e agora José?

E agora José?
sua doce ilusão,
seu instante de sonho,
seu devaneio e realidade,
a conta vencida,
sua ilusão de ouro,
sua força de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?

Com o frasco na mão,
você quer mais ritalina,
não existe ritalina,
quer saltar do abismo,
o abismo acabou,
você quer sua coach,
mas coach não há mais,
José e agora?

Se você cumprisse,
se você persistisse,
se você lembrasse,
se você amasse,
se você terminasse,
se você pensasse,
se você curasse.
Mas você não cura,
não tem cura, José.

Sozinho na vida,
um tdah isolado,
sem  psicologia,
sem o coaching
para se encostar,
sem o seu remédio
que te impeça as fugas,
você continua, José!
José, pra onde?

Perdoe-me Carlos Drumond de Andrade.



"Reflexão de 2025: O 'José' do poema está sozinho, mas você não precisa estar. O TDAH não tem cura, é verdade, mas tem manejo, tem comunidade e tem compreensão. O isolamento é o maior inimigo do José; a conexão é o seu maior aliado.

Se você se sente nesse deserto, sem Ritalina ou sem norte, saiba que o caminho continua. Conheça recursos e redes de apoio na ABDA.

E agora, José? Para onde você vai quando o chão some? Vamos conversar nos comentários."