quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

AS TAREFAS ESCOLARES DE UM TDAH









Comecei este blog com a intenção de traçar uma linha do tempo. Principalmente para mostrar que uma criança com TDA mais hiperatividades se não tratada, vai sofrer muito quando adulto.
Ocorre que as lembranças vão surgindo de maneira descoordenada e resolvi criar alguns tópicos extraordinários para contemplar estes períodos.
Este é o caso dos deveres de casa em meu tempo de estudante. Aqui cabe também a protelação. São as primeiras memórias de um hábito que virou uma tortura na minha vida adulta.

- Mãe! Tenho que entregar um trabalho de geografia amanhã!
- O quê? Amanhã ? Você sabe quantas horas são ? São cinco horas da tarde!

Assim, invariavelmente, começavam meus trabalhos escolares. Minha mãe me dava um esculacho mas sentava-se comigo e, praticamente, fazia o trabalho prá mim. Minha mãe é muito boa, criativa, escreve muitíssimo bem. O trabalho ficava excelente. Mas custava um stress gigantesco. Um corre-corre pela casa, parava tudo em função daquele trabalho.
O trabalho de geografia de que falo acima existiu mesmo. Era um trabalho sobre exportação. Em plena época da ditadura, tínhamos que elogiar o Brasil. Havia até um slogan que dizia. Brasil, exportar é o que importa. Lembro nítidamente deste trabalho. Eu escrevia, minha mãe ditava e colávamos fotos de revistas (Manchete, O Cruzeiro). Neste trabalho havia uma foto deste slogan, de uma caixa de madeira sendo erguida por um guindaste. Nela havia uma imagem da nossa bandeira  e a frase " made in Brasil ".
Fotos de pátios de portos lotados de mercadorias para exportação.
Ficou ótimo!
Mas custava muito caro em termos de desgaste e tensão.
Outro de que me lembro de maneira claríssima, é um trabalho sobre a Transamazônica. A rodovia que deveria cortar a Amazônia de um lado a outro e integrar todos o brasileiros ao crescimento e desenvolvimento do Brasil.
Outra batalha insana. Minha mãe quase me matou quando comuniquei a ela da existência do trabalho para o dia seguinte.
Com quatro filhos pequenos, três meninas (duas baixo de mim) e eu, minha mãe tinha que parar tudo para fazer meus trabalhos. Ficávamos até altas horas fazendo o trabalho e minha mãe esbravejando comigo.
Quando meu pai chegava em casa a coisa piorava. Ele era da teoria de que minha mãe não deveria ajudar. " Deixa ele fazer uma porcaria qualquer, ou não entregar o trabalho. Garanto que ele vai aprender." Mas, mãe é mãe. E nós dois íamos até tarde fazendo o trabalho que estava marcado há dias.
Certa vez, eu já estava na sétima série, comuniquei a minha mãe que havia um trabalho de História. O Antigo Egito. Depois do esculacho de praxe, sentamos e fizemos o trabalho até altas horas. Entrou na madrugada. Naquele dia minha mãe se superou. Ela sempre tinha guardadas revistas, ilustrações e reportagens sobre assuntos relevante e passíveis de precisarmos na escola. Além disso, tinhamos muitos livros de História em casa pois meu pai formou-se nesse curso.
Foi o melhor trabalho que apresentei em minha carreira estudantil. A professora ficou encantada. Fui chamado à frente para apresentá-lo para a turma. Ela gostou principalmente de uma seção que havia no final do trabalho, em que havíamos colado notícias atuais sobre as escavações e descobertas que estavam sendo feitas no Egito.
Um sucesso.
Mas custou muito suor e lágrimas.
Obrigado mãe!

6 comentários:

  1. Me identifico diretamente com todas as suas descrições de vida. Quantos anos eu levei para descobrir que tinha TDAH. Aceitar talvez seja uma das piores partes do "processo".

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  2. Sim amigo 'indecifrável' -rsrs- aceitar é um grande desafio. mas a lentidão do tratamento é, muitas vezes, torturante. Não podemos nos entregar.
    Um abraço

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  3. Tenho 16 anos e lendo seu(s) texto(s), me identifiquei muito. Sou divagante, uma escapista, e isso sempre me prejudicou muito, tanto na escola como na minha vida inteira... Esquecia-me e esqueço-me constantemente de compromissos (principalmente os escolares), perdi a prova do Enem pela 2º vez, esqueci a data de aniversário da minha melhor amiga e ela ficou chateada, esqueci data de aniversário de namoro, não lembro dos trabalhos de casa, larguei aula de violão (deixo tudo pela metade,começo animadona, logo perco o estímulo e me interesso por outra coisa)... Sinto vontade constante de chutar o balde e morrer (mas, como é da minha natureza, tenho muitos sonhos e quero realiza-los apesar de tudo). Qualquer coisa me distrai, faz minha mente desfiar para outro lugar, objeto..., algo que me interesse ou não faça sentido nenhum, e sou chamada de lesa, desinteressada, desleixada. Vivo no mundo da lua. Deixo tudo pra última hora porque, sob pressão, meus trabalhos saem melhor. Gazeio aula por não suportar o tédio que me toma dentro das salas de aula, além, é claro, do fato de que só consigo me concentrar na aula que gosto (Física), o que me faz ficar divagando durante exatamente 80% do tempo das outras aulas... Só um TDAH pode entender outro. É muito difícil ser assim. Adorei o seu blog.

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    1. Oi Tainara!
      Olha, é muito importante que você converse com seus pais e confira com eles se você realmente se encaixa nesse perfil de TDAH. No site da minha médica: www.valeriamodesto.com existe um questionário sobre os sintomas, preencha-os de preferência acompanhada de seus pais; se ainda se identificar com eles, procure um médico. O tratamento melhora demais nossas vidas.
      Um abraço
      Alexandre

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  4. Caro Alexandre,

    Tenho acompanhado seu blog há alguns dias e gostaria de lhe agradecer, pois este serviu como um grande suporte para a minha procura por ajuda. Tenho 17 anos e após passar indisciplinadamente por alguns empregos; nunca conseguir manter a organização; pensar em abandonar a faculdade no segundo ano -- depois de semanas consecutivas de faltas, atrasos constantes e procrastinação nos trabalhos (mesmo cursando matérias de meu interesse)--, finalmente marquei uma consulta com uma boa psiquiatra. Há uma semana atrás, sentia-me sozinha, desmotivada e errônea. No entanto, agora já vislumbro as possibilidades de solução para tantos problemas e devo muito à identificação pessoal com as suas postagens.

    Um abraço,
    Larissa

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    1. oi Larissa! Que legal!
      Tomara que dê tudo certo pra você!
      Se o diagnóstico for positivo encare o tratamento com seriedade, sua vida vai melhorar demais.
      Conte comigo, se eu puder ser útil em algo.
      Abraço
      Alexandre

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